Fiz 70 anos neste dia 28 de
setembro. Estas datas redondas são sempre um motivo de comemoração especial,
que neste caso, devido à quarentena, não tem como acontecer. Então, da janela
da sala, olhando para o mar revolto neste tempestuoso dia, me pus a rememorar alguns
episódios do que foram os meus anos. Já tive a oportunidade de escrever
longamente e publicar aqui mesmo, sobre a minha infância e juventude em
Sorocaba com os meus pais. Da incipiente aventura de jornalismo na Folha de
Sorocaba e no jornal Cruzeiro do Sul, de onde ainda guardo alguns poucos colegas
e amigos que reencontrei graças ao milagre do Facebook.
Prossigo agora com tempos de Faculdade de
Direito na Universidade Católica de Petrópolis e da Livraria Debret. Lá me
viciei em leituras e fiz a minha primeira palestra. O Dr. Mário Fonseca, médico
e intelectual, presidente da Associação Petropolitana de Cultura vaticinou que
algum dia eu me tornaria um palestrante e é claro que não acreditei, mas ele,
experiente e sábio anteviu o futuro, Deste tempo ainda mantenho contato com o Fred
Lage, meu colega na Livraria e filho da querida amiga e colega da Faculdade Dorothy
(Doty) Lage. Eu, muito jovem, vivendo sem conhecer ninguém na Cidade Imperial,
frequentava os saraus na sua mansão na Avenida Ipiranga, onde encontrava as
vezes com Leila Diniz, o Príncipe D. Pedro ou um dos Rockfeller, entre outras
celebridades. Alguém perguntou uma vez “de qual família ele é?” e ela,
generosidade em pessoa, me abraçou pelos ombros e respondeu: - ele é meu amigo.
– Jamais vou esquecer.
Guardo doces lembranças de meus
patrões na Livraria Debret, Aristides e Carolina Cerqueira Leite. Ele, um dos
primeiros homens de TV no Brasil, na extinta TV Excelsior, patrão do Boni, que
cita este fato em sua biografia e o criador do programa A Voz do Brasil.
Aristides era um homem calmo e metódico que me ensinou a ser organizado. Nos
demorados almoços no restaurante da Mirtes Paranhos na Rua Irmãos D’Angelo,
vizinho da Livraria, ele contava histórias, citava exemplos e ia moldando o meu
agitado temperamento. Sua inteligentíssima esposa Carolina, concertista de
piano, “chef”, escritora, foi uma das primeiras mulheres a dirigir sozinha na
Via Dutra do Rio a São Paulo, na época uma aventura. Na sua maravilhosa casa de
campo em Itaipava, onde morei por algum tempo, ela fazia delícias para os
frequentes convidados. Uma ocasião foi comida japonesa. Eu disse que não
gostava. Ela perguntou se eu já havia experimentado e respondi que não. Aí veio
a preciosa lição: - Michael, nunca se negue a experimentar o que você não
conhece, pode ter uma surpresa. – Experimentei e até hoje sou fã de comida
japonesa. Acompanhei linha por linha e ajudei a revisar a construção de seu
romance “Appassionata”, um dos livros mais gostosos que já li. Guardo como
relíquia o exemplar que me foi dedicado.
Não pude terminar a Faculdade. Recém
casado com a minha primeira esposa e passando grandes dificuldades financeiras
perdemos nossa primeira filha por incompatibilidade RH. Resolvi buscar um
melhor padrão de vida e procurei um emprego mais bem remunerado. Na época o
Jornal do Brasil e o Globo tinham cadernos de empregos que pesavam mais de um
quilo com milhares de oportunidades de trabalho. VI um anúncio da IBM e me
inscrevi. Passei entre mais de trezentos candidatos. Fui um dos melhores
vendedores de equipamentos para escritório, comprei um belo apartamento em Icaraí,
Niterói, um Opala novo e ganhei uma viagem para o Hawaií. O grupo de
ex-ibemistas ainda está muito ativo e mantenho contato frequente com o Eduardo
Luiz Portela, um dos três colegas que passou naquela seleção. Foi o melhor emprego que alguém pode ter na
vida, mas ambicioso, eu sonhava em voar mais alto.
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