(…) A linguagem telegráfica e ultrassimplificada, que hoje p r e d o m i n a , é capaz de transmitir mensagens imediatas e sentimentos primitivos, assim como faz a “ l i n g u a g e m ” d e muitas espécies animais. Está associada a textos curtos e músicas pobres, repetitivas.
A linguagem humana é muito mais do que isso. Ela fala de história, atualiza o passado, indica o futuro, refere-se ao que não existe, transmite conceitos, narra sentimentos e descreve objetos complexos.
Em vez de escolas e famílias adaptarem-se ao empobrecimento vocabular e sintá tico, elas devem contribuir para enriquecer crianças e jovens. Quem não domina uma linguagem rica não pode conhecer Shakespeare , Guimarães Rosa, a Ilíada e tantos outros monumentos da nossa humanidade.
Afastados desse universo simbólico sofisticado, também não conseguem apreciar Villa-Lobos, a Pietà ou uma bela solução arquitetônica.
A ideia de rebaixar a escola em nome da inclusão só reproduz a exclusão.
Cesar Benjamim
O desaparecimento progressivo dos tempos (subjuntivo, passado simples, imperfeito, formas compostas do futuro, particípio passado...) dá origem a um pensamento no presente, limitado ao instante, incapaz de projeções no tempo.
A generalização da familiaridade, o desaparecimento das maiúsculas e da pontuação são todos golpes fatais à sutileza da expressão. Eliminar a palavra "saudade" não é apenas abrir mão da estética de uma palavra, mas também promover a ideia de que entre uma menina e uma mulher não existe nada.
Menos palavras e menos verbos conjugados significam menos capacidade de expressar emoções e menos oportunidade de pensar bem. Estudos têm demonstrado que parte da violência nas esferas pública e privada decorre diretamente da incapacidade de traduzir as emoções em palavras.
Sem palavras para construir um raciocínio, o pensamento complexo caro a Edgar Morin é dificultado, tornado impossível. Quanto mais pobre a linguagem, menos pensamento existe.
A história é rica em exemplos e há muitos escritos de Georges Orwell em 1984 a Ray Bradbury em Fahrenheit 451 que relataram como ditaduras de todas as convicções dificultaram o pensamento, reduzindo e distorcendo o número e o significado das palavras. Não há pensamento crítico sem pensamento. E não há pensamento sem palavras. Como construir um pensamento hipotético - dedutivo sem dominar o condicional? Como imaginar o futuro sem conjugação com o futuro?
Como apreender uma temporalidade, uma sucessão de elementos no tempo, passado ou futuro, bem como a sua duração relativa, sem uma linguagem que faça a diferença entre o que poderia ter sido, o que foi, o que é, o que pode acontecer, e o que será depois que o que pode acontecer tenha acontecido?
Se hoje se ouvisse um grito de guerra, seria o grito dirigido a pais e professores: façam com que seus filhos, seus alunos, falem, leiam e escrevam. Ensinar e praticar o idioma em suas mais variadas formas, mesmo que pareça complicado, principalmente se for complicado.
Porque nesse esforço está a liberdade. Quem explica o tempo todo que é preciso simplificar a grafia, purgar a linguagem de seus " defeitos", abolir gêneros, tempos, nuances, tudo o que cria complexidade são os COVEIROS DA MENTE HUMANA.
Não há liberdades sem exigências. Não há beleza sem pensar na beleza.
Christophe Clavé
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