A década de 1820 parecia ser a melhor época para o relacionamento especial entre a ordem fraternal da Maçonaria e a jovem nação americana. Não era só porque muitos dos proeminentes membros da geração fundadora — George Washington, Benjamin Franklin e, na realidade, 13 dos 39 signatários da Constituição— tinham sido membros. Era também porque a república em rápido crescimento e a sociedade fraternal ainda tinha muitos ideais em comum. Os valores republicanos americanos pareciam-se com valores maçônicos expressos: atitude cívica honorável, alto apreço pelo aprendizado e o progresso, e o que poderia ser chamado de uma religiosidade ampla e tolerante. Na verdade, diz Steven Bullock, um historiador do Instituto Politécnico de Worcester, e um professor líder da fraternidade maçônica na América, os maçons “ajudaram a dar à nova nação um núcleo simbólico”.
Não é por nada que o compasso, o esquadro e outros emblemas associados à Maçonaria estampados por todos os lados, mesmo em joias, mobiliário e jogos de mesa pertencentes a maçons e também a não-maçons. Nem foi insignificante que um grande número de Americanos pensasse — erroneamente, mas justificadamente — que o Grande Selo dos Estados Unidos em si contivesse símbolos maçônicos. Era tanto um tributo e uma responsabilidade da irmandade que as pessoas vissem a influência da Maçonaria, mesmo onde ela não existia.
Desde a Revolução, os maçons se tornaram os celebrantes semioficiais da cultura cívica americana. Usando seus aventais distintivos e manejando as colheres de pedreiro — os Maçons originais eram de fato, pedreiros — eles rotineiramente lançavam pedras fundamentais de importantes edifícios governamentais e igrejas, e participavam destacadamente em paradas e outras cerimônias públicas. Quando o velho Lafayette retornou aos Estados Unidos em 1824-25, membros da “ordem” (como é chamada a maçonaria) saudaram publicamente seu companheiro maçom, convidando-o com frequência para ficar na loja local. Esta viagem incrementou a adesão à Maçonaria, que cresceu de 16.000 em 1800, para cerca de 80.000 em 1822, ou quase 5 por cento da população masculina elegível da América.
Como, então o que parecia ser a melhor época para a Maçonaria, rapidamente se tornou o pior dos tempos? Parte da resposta pode ser encontrada na reação dividida do público à viagem de Lafayette, sugere o historiador Mark Tabbert, curador de coleções maçônicas e fraternais no National Heritage Museum em Lexington, Mass., em seu novo livro, American Freemasons: Three Centuries of Building Communities (Maçons Americanos: Três Séculos Construindo Comunidades). Para muitos cidadãos, estas demonstrações públicas de afeição fraternal para com um nobre estrangeiro pareciam ter um cunho tanto elitista quanto conspiratória. Muito simplesmente, escreve Tabbert, eles “levantaram a suspeita de que a ordem ser uma ordem internacional com segredos e um passado revolucionário radical”.
Não tão secreta. Não foi a primeira vez que a Maçonaria teria deparado com tal resposta. Desde seu nascimento como movimento fraternal organizado no início do século 18, em Londres até hoje, a Maçonaria tem sido objeto de ampla curiosidade e intensa suspeição ocasional. Com seus elaborados rituais secretos, seu envolvimento tanto com a sabedoria antiga quanto a ciência e a razão do Iluminismo moderno, e a relativa exclusividade de seus membros (os candidatos precisam pedir para entrar e, em seguida, são vetados ou aprovados por meio de voto), a irmandade maçônica provou ser na medida para os criadores de teorias de conspiração e autores oportunistas ansiosos para faturar “expondo” com imaginação as maneiras secretas e as ambições ainda mais secretas da ordem. Se o “grande segredo” dos Maçons, como disse uma vez Benjamin Franklin, “é que eles não têm nenhum segredo”, àqueles que sugerem o contrário — incluindo a fama do escritor Dan Brown do Código Da Vinci por sua próxima novela, A Chave de Salomão — raramente falta público receptivo.
A verdadeira história da Maçonaria é, discutivelmente, mais interessante que todos os contos tecidos ao redor dela. Mas aquela história é pelo menos em parte, a história de muitas interpretações fantasiosas da irmandade. Na verdade as realizações substanciais dos Maçons –na formação de cidadãos sólidos, forjando redes sociais, fazendo a ponte entre certas divisões sociais, apoiando causas filantrópicas – são as mais admiráveis em face de esforços passados em difamar ou mesmo destruir a organização.
Um destes esforços surgiu em um amplo movimento social e político na América, menos de dois anos após o périplo triunfante de Lafayette, embora este esforço tivesse sido amplamente desencadeado pelos intrigantes, ou algo mais criminoso, de diversos membros nova-iorquinos excessivamente zelosos. No verão de 1826, na cidade de Batávia, no norte do estado, um irresponsável insatisfeito, alegando ser maçom, William Morgan declarou sua intenção de publicar um livro revelando os segredos da sociedade maçônica de alto grau, o Arco Real, que tinha, anteriormente vetado sua proposta de entrada na ordem. Preso duas vezes por acusações fabricadas por maçons locais, o pretenso expositor foi misteriosamente raptado e expulso do país ou morto. Foram levantadas acusações contra os prováveis suspeitos, todos Maçons, mas após cerca de 20 julgamentos, escreve Bullock em seu livro Irmandade Revolucionária: A Maçonaria e a Transformação da Ordem Social Americana, 1730-1840, “ somente um punhado de condenações resultaram, todas seguidas de curtos períodos de prisão”. Para um crescente número de Americanos, já precavidos contra o poder da ordem, pareceu que os Maçons tinham se safado com o assassinato. E para muitos destes mesmos americanos, tudo o que proeminentes ministros evangélicos tinham dito contra os Maçons – que eles eram deístas ou acreditavam em religião “natural” ou cultos necromânticos – parecia ser confirmado por este ato sinalizador de comportamento desonesto.
O Partido Anti Maçônico
Os “comitês Morgan” que originalmente se propuseram a estabelecer a verdade sobre o crime logo tornaram-se a ponta de lança de um movimento em nível de estado e, em seguida, um Partido Antimaçônico nacional dedicado a eliminar os Maçons. Pennsylvania e Vermont elegeram governadores Antimaçônicos, e o ex Procurador Geral dos EUA, William Wirt candidatou-se a presidente pelo partido em 1832, vencendo a votação em Vermont e obtendo cerca de 8 por cento do voto popular nacional.
O partido logo desapareceu à medida que os partidos Democrático e novo Whig aumentaram seus esforços organizacionais para dominar a cena política Nacional. Mas além de fornecer um modelo para futuros movimentos americanos de questão única, desde o abolicionismo à temperança, até o Partido Verde atual, o movimento anti-maçônico quase eliminou a fraternidade. O Estado de New York abrigava cerca de 500 lojas locais em meados de 1820, mas somente 26 lojas reuniam representantes para comparecer às reuniões da grande loja estadual em 1837. Quase dois terços das lojas de Indiana foram fechadas no mesmo ano. Até o final da década de 1830, a Maçonaria estava começando um lento retorno, mas como escreve Bullock, “ela nunca mais recuperaria a posição exaltada que a Maçonaria já tinha justamente merecido”.
Como a Maçonaria tinha chegado a tal posição exaltada na vida pública americana, brevemente, para perdê-la antes de recuperar um manto menos importante de respeitabilidade, é uma história que começa na Escócia e Inglaterra. Descendentes de guildas medievais de pedreiros, as lojas do século 17 na Inglaterra ainda eram dominadas por maçons reais (ou “operativos”) que gradualmente acolheram em suas fileiras, geralmente como patronos, cavalheiros selecionados, desde que eles jurassem lealdade à coroa e fé em Deus. Estes membros “aceitos” eram atraídos pelo caráter sociável das fraternidades (que tipicamente se reuniam em bares e tavernas), e também por rituais particulares e sinais que tinham, anteriormente, ajudado os artesão a proteger segredos de sua arte. Os vínculos da Maçonaria com a arquitetura antiga, a geometria e outras artes e ciências racionais aumentou sua atratividade para homens que participavam de, ou acompanhavam de perto o desenvolvimento da moderna ciência experimental.
Buscadores da Sabedoria. À medida que membros aceitos vieram a dominar as diferentes lojas, muitos dos quais também eram membros da Sociedade Científica Real da Inglaterra, o foco da vida fraternal mudou para considerações filosóficas (ou “especulativas”) e a exploração de conexões entre novas leis da natureza descobertas e a sabedoria de civilizações antigas. “Eles estudavam arquitetura Grega e Romana, e o Templo do Rei Salomão”, escreve Tabbert, “buscando as chaves para desvendar as verdades perdidas de civilizações antigas.” Na verdade, as genealogias altamente mitologizadas da Maçonaria, davam, com freqüência, ao templo que Salomão construiu em Jerusalém em 967 a.C, um lugar proeminente na tradição Maçônica. As diferentes características arquiteturais do templo e a história de seu pretenso chefe construtor, Hiram Abiff, se tornaria o centro da sabedoria simbólica e rituais de iniciação da fraternidade.
Na América, a Maçonaria foi avidamente abraçada tanto pelo estabelecimento cavalheiresco quanto por membros das classes comerciais e de artesãos que aspiravam àquele estabelecimento. Na verdade, a Maçonaria encorajou movimento social e uma elite mais inclusiva através da educação, o cultivo de polidez e honra, assistência mútua, rede social de contatos e tolerância com diferenças no delicado assunto da religião. (Esperava-se que os irmãos honrassem “aquela religião em que todos os homens concordam [isto é, acreditar em um “Deus beneficente”], deixando suas opiniões particulares para si mesmos”, escreveu o escocês James Anderson, um ministro Presbiteriano que, em 1723, publicou as Constituições dos Maçons, o primeiro registro oficial da Grande Loja).
Alpinistas sociais.
Até a Revolução, homens de caráter, talento e ambição usaram a Maçonaria para subir na escada social. Antes de sua famosa viagem, Paul Revere era conhecido como proeminente prateiro e Maçom. Um amigo de Boston, um afro-americano livre e um dono de selaria chamado Prince Hall, astutamente avaliaram os benefícios da fraternidade. Em 1775, ele e 14 outros afro-americanos foram iniciados em uma loja militar Inglesa. Hall e diversos outros irmãos fundaram sua própria loja durante a Revolução. A Maçonaria Prince Hall, como foi chamada após a morte de Hall em 1807, espalhou-se para Rhode Island, Pennsylvania, e mais além, para tornar-se um poderoso crisol de liderança afro-americana, mesmo enquanto oferecia caridade e outro suporte à comunidade negra. Embora afro-americanos possam ingressar em qualquer loja, a Maçonaria Prince Hall permanece uma parte vital – e ainda separada – da tradição maçônica americana.
Após a Revolução, relutantemente rompendo os laços com as grandes lojas de Londres (Os maçons realmente acreditavam que seus laços fraternais transcenderiam a política), as lojas americanas se reorganizaram sob grandes lojas estaduais. A Maçonaria também começou a mover-se para o interior do país, promovendo conexões comerciais e outras entre cidades costeiras e a fronteira que avançava continuamente.
A Maçonaria na América é uma história de sucessivas reinvenções, diz S.Brent Morris, um estudioso de Maçonaria e editor do Scottish Rite Journal. De 1790 até 1820, maçons americanos mais jovens importaram dois novos sistemas de altos graus da Maçonaria, o Rito York, seguindo as tradições inglesas, e o Rito Escocês, seguindo práticas francesas. O Rito Escocês e o Rito York encorajaram mais instruções rituais em moralidade, embora promovessem algumas idéias fantasiosas sobre as origens da fraternidade. (Talvez a mais influente fosse a lenda de que os Maços descendiam dos Cavaleiros Templários medievais, uma ordem que caiu em desgraça com a Igreja Católica Romana antes de desaparecer substancialmente por volta de 1300). Os novos ritos secretos e elaborados atraíram membros, mas também acrescentou às suspeitas dos críticos que já consideravam os Maçons elitistas com segredos demais para serem confiáveis.
À medida que a Maçonaria reviveu após a campanha anti-maçônica, os Maçons cultivaram um estilo mais modesto. Lá se foram as festanças em tavernas e brindes que incomodavam os evangélicos. A própria ordem “assumiu uma coloração mais evangélica”, diz William Moore, um historiador da Universidade da Carolina do Norte-Wilmington e autor do inédito “Templos Maçônicos: Maçonaria, Arquitetura Ritual, e Arquétipos Masculinos”. “Os livros que os maçons produziram”, nota Moore, “pareciam manuais de catecismo de domingo com ilustrações que pareciam iluminuras de Bíblias Vitorianas”. Os maçons também começaram a direcionar esforços caritativos para comunidades maiores, e não apenas aos companheiros maçons e suas famílias. E parcialmente para acalmar a crítica das mulheres, os Maçons criaram a Ordem da Estrela do Oriente e outras filiais para que as mulheres participassem. Mesmo hoje, “a maçonaria mais ampla é somente masculina”, diz Morris, embora lojas estaduais definam suas próprias regras até certo ponto, e existam alguns grupos mistos.
Após a Guerra Civil, e à medida que a Gilded Age prosseguiu até o início da década de 1870, os maçons mais uma vez modificaram seu papel, tornando-se o modelo para mais de 300 grupos fraternais que apareceram durante os próximos 50 anos. Durante esta “era dourada” de ordens fraternais, a Maçonaria e sociedades tais como Odd Fellows e Knights of Pythias ofereceram uma proteção contra a economia dinâmica e, com freqüência, mortal e uma sociedade cada vez mais diversificada. Reforçando seus bons trabalhos, incluindo o apoio a escolas e hospitais, os Maçons até mesmo encontraram uma maneira de misturar o convívio fraternal com a filantropia, criando os Nobles of the Mystic Shrine em 1870. Aberto somente a Maçons que tivessem completado os graus do Rito Escocês ou York, esta ordem voltada para festividades celebrou a personalidade bem formada em uma época que estava começando a valorizar a personalidade em detrimento de ideais mais antigos de honra e caráter. Os Schriners aprenderam a se divertir enquanto levantavam dinheiro para hospitais e ambiciosos templos Shrine.
Boato Satânico
A despeito dos bons trabalhos da fraternidade, mitos de fatos obscuros continuaram a assombrar a Maçonaria. No final da década de 1880, um malicioso escritor francês e ex-maçom, conhecido por seu pseudônimo literário de Leo Taxil, começou a jogar com os medos dos católicos em relação à ordem. Ele alegava expor os maiores segredos da ordem, conhecidos apenas dos maçons dos mais altos graus: que a religião secreta da maçonaria era a adoração de Lúcifer. Mesmo depois que Taxil confessou ser um boato em 1897, o mito serviu como um princípio de material anti-maçônico, empurrado em livros como o New World Order de Pat Robertson.
Mas, o maior desafio da Maçonaria não foi sua susceptibilidade ao uso em fantasias de conspiração. Pois todos os maçons se integraram na sociedade mais ampla, e apesar de ter um número de membros na casa dos milhões, a Maçonaria parecia menos central para a América nos Anos Vinte, e seus “candidatos” no estilo Babbitt, criavam grupos como os Kiwanis e o Rotary, que eram mais abertamente amigáveis e tinham muito menos demanda por rituais. Ainda assim a velha ordem fraternal viu mais um crescimento. Após o final da guerra, “a fraternidade maçônica realizou os lucros de seu trabalho duro entre a Grande Depressão e a Segunda Guerra Mundial”, escreve Tabbert. “A ordem era mais aceita e apreciada que…. antes de 1929”. Entre 1945 e 1960, o número de membros cresceu de 2,8 milhões até um pico de 4 milhões.
Daquele píncaro, a ordem perdeu lentamente mais de metade de seus membros. Para um número crescente de americanos que gastam seu tempo livre em buscas particulares – incluindo assistir muita televisão – as reuniões mensais e compromissos voluntários de vida fraternal parecem excessivos. Mas, recentemente, diz Morris, a taxa de declínio estabilizou-se. O historiador Moore sugere um motivo: “Muitos homens estão entrando na aposentadoria.”
Com o envelhecimento rápido da população dos EUA, as lojas começam a se encher de pessoas que tem mais tempo livre que a maior parte dos trabalhadores americanos. E quem sabe? Estes idosos, nascidos depois da Segunda Guerra, possam mesmo descobrir como trazer os americanos mais jovens de volta para a Ordem.
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