dezembro 20, 2023

A PRIMEIRA CRUZADA 1196 - parte 3



Entre vários príncipes ilustres, o nome de Godofredo de Bouillon (1058 – 1100) foi escolhido para comandar o exército. Descendente de Carlos Magno, pelo lado materno. Irmão do conde de Boulogne, e senhor de Bouillon em Ardennes. Um homem que já tinha mostrado sua força e coragem até contra a própria igreja, quando foi o primeiro a escalar os muros de Roma combatendo contra o Papa Hidelbrando (S. Gregório VII), quando servia ao rei alemão Henrique IV. E foi Godofredo que antes, matara Rodolfo com sua lança, o rei rebelde, que a igreja apoiara. (1080). Movido por um profundo arrependimento, Godofredo queria agora ser mártir pela libertação do Santo Sepulcro. Os chefes da Igreja viram neste guerreiro, um aliado poderoso e fiel. Dizem: “A prudência e a moderação temperavam seu valor. Sua piedade era sincera e cega.” Seus irmãos, Eustáquio, o mais velho, e Balduíno, o mais moço, o acompanhavam.

Quando a noticia da formação oficial da 1ª cruzada se espalhou o povo começou seus preparativos. Camponeses, mulheres e crianças partiram em marcha e os velhos aproveitavam a oportunidade de verem o santo sepulcro sob a proteção de um formidável exército. Diziam eles aos guerreiros: “Vós sois valentes e fortes, combatereis; nós sofreremos como o Cristo e faremos a conquista do céu”. Como consequência, a mais imediata das cruzadas, as terras e os castelos, as ferramentas de trabalho no campo e o gado, baixaram extraordinariamente de preço pelo excesso de ofertas. Em compensação, as armas e os cavalos subiram a preços fantásticos. Em vista da dificuldade que teriam para se manter uma formação numerosa, os príncipes acertaram de se encontrar nos arredores de Constantinopla. Até ai cada um mantinha como melhor pudesse a sua gente. Godofredo atravessou a Alemanha, que ele conhecia bem, quase em linha reta.

O Fabuloso Exército Contava Com Os Príncipes:

1. Godofredo de Bouillon, Duque de Lorena que reuniu 80.000 homens de infantaria e 10.000 cavaleiros. Seu ataque resultou na conquista de Jerusalém. Foi proclamado rei de Jerusalém, mas preferiu ser denominado como o “Protetor do Santo Sepulcro”, após a queda da cidade em 1099. Era visto como um grande cavaleiro e muito devotado ao Cristianismo. Fundou uma ordem chamada Prioré de Zion – Priorado do Sião.

2. Boemundo da Sicília – Príncipe de Trento, governador do sul da Itália, que trouxe 20.000 infantes e 10.000 cavaleiros.

3. Roberto – Duque de Flandres

4. Hugo, Duque de Vermandois, irmão mais moço do Rei de França.

5. Roberto II, Duque da Normandia, filho de Guilherme, o conquistador, vendeu o reino e o ducado à seu irmão e partiu para a cruzada.

6. Estevão, Conde de Chartres

7. Estevão, Conde de Blois, casado com Ade-la, Filha de Guilherme, o conquistador. Esse desertou na Primeira Cruzada.

8. Raimundo de Saint Gilles, Conde de Toulouse

9. Raimundo, Duque de Marbona.

10.Raimundo, Marques de Provença

Na fronteira com a Hungria, os húngaros lembraram muito bem o que Pedro, o Eremita e seu povo fizeram e tentaram impedir a passagem de Godofredo. Ele bem que podia ter atravessado a força, porque seu exército era muito mais forte. Mas, sua virtude fez com que pedisse desculpas pelos excessos cometidos pelos seus irmãos. Pediu humildemente a passagem livre e mantimentos, ao preço corrente de mercado. Enquanto Godofredo e seu irmão iam entregar-se ao rei Carlos da Hungria como garantia. Godofredo conteve a ferocidade de seus cruzados em território húngaro, sob pena de morte. Atravessada a Bulgária, Godofredo foi pela Dalmácia e a Sclavonia.

Todavia, os cruzados enfrentaram o mesmo problema da Hungria em Constantinopla. Os papéis se inverteram e os cruzados eram agora, mais temíveis que os turcos. Alexis Comneno quis também lhe impedir a passagem. A presença de Boemundo de Tentro, que ele muito bem conhecia, o fez mudar de idéia. O mesmo aconteceu com Hugo, Duque de Vermondois que ficou prisioneiro de Alexis, como garantia de que seus soldados se comportassem na cidade. Mas Roberto da França, que aprendeu a lidar com situações difíceis com seu pai, Guilherme, o conquistador, obrigou-o a libertar o Duque. Boemundo indignado com as atitudes do imperador queria que Godofredo depusesse Aleixo Comneno. Godofredo não somente resistiu a fazer-lhe a vontade, como conseguiu que os cruzados prestassem homenagem ao imperador bizantino. Além de tudo, fez-lhe uma promessa de devolver-lhe todas as terras que perdera aos turcos. 

Depois dessa intrincada missão diplomática, a travessia marítima foi feita sem problemas. E na primavera de 1097, os cruzados entraram na Ásia. Formavam um exército de 100.000 cavaleiros de elmo e cota (armadura/malha metálica com que se cobria o corpo), seguidos de 400.000 infantes, sem contar padres, monges, mulheres e crianças. A travessia do deserto foi mais difícil… “…Os homens mais robustos deitavam-se na areia, cavavam a superfície ardente para encontrar mais abaixo o solo fresco e nele colar à boca ressequida. Os próprios animais não resistiram… Podia-se rir ou chorar, como se quiser, vendo que por falta de bestas de carga, carregavam as bagagens sobre carneiros, cabras, porcos e cães. Viu-se mais de um cavaleiro montar um boi a guisa de cavalo de batalha.” Tomaram Nicéia e ganharam uma batalha desesperada na Frígia (Batalha de Ascalon, ganha dos Muçulmanos).

 Quando os cruzados chegaram a Antioquia, e preparavam para sitiar a cidade, apenas dois dias depois, foram surpreendidos pelo exército de Kerboga, sultão de Mossul. Desesperados e com fome esgotaram rapidamente seus mantimentos e se viram obrigados a abaterem seus cavalos e outros animais, inclusive ratos e cães, e dizem, até a comer a carne dos turcos, que para eles eram apenas animais. Estavam destinados ao fracasso, quando Raimundo, o Conde de Toulouse recebeu um pobre padre provençal chamado Pedro Bartolomeu, que lhe disse que o apóstolo André lhe tinha aparecido em sonhos e lhe dissera que uma relíquia capaz de trazer a vitória aos cruzados – a lança que traspassara o flanco de Jesus crucificado – estava enterrada no solo de uma das igrejas da cidade de Petrus Raimundo seguiu o homem até a igreja que indicava e mandou escavar o solo. Doze homens escavaram o dia todo, enquanto milhares de cruzados esperavam no lado de fora. Perto do Crepúsculo, o próprio Pedro desceu à escavação e voltou trazendo na mão a lança sagrada. Uma enorme ovação saudou sua reaparição. 

Quando os cruzados avançaram, precedidos da lança sagrada, mostraram-se irresistíveis. Comandava-os Boemundo. Graças ao seu incomparável talento militar e à fé fanática dos seus homens, as numerosas forças de Kerboga foram postas em debandada. No campo turco abandonado, encontraram víveres e bebidas em abundância, o que lhes garantiria a estadia prolongada ao sítio de Antioquia. Depois de oito meses de luta, tomaram a cidade que resistira desesperadamente. A vitória de Antioquia (1098) foi em todos os tempos celebrada como a mais admirável ação de todas as cruzadas, mas custou aos cruzados a fina flor de suas tropas. A devastação pela guerra, pela fome, pela peste, e as deserções, acabaram reduzindo o exército primitivo a 40.000 homens, apenas. Em junho de 1099, os cruzados chegaram em Jerusalém, em lágrimas beijavam o solo. Em uma primeira investida, as grossas muralhas e as torres da cidade, contiveram as tropas de Godofredo. Sendo obrigado a empregar um cerco. Os soldados sofriam com o calor e pegavam a água do rio Jordão. Neste meio tempo foram construídas máquinas de arremesso e torres móveis. Mas os sitiantes contavam com menos lanças que os sitiados. O cerco durou 30 dias. No dia 13 de julho, com as máquinas prontas, os cruzados tentaram mais uma investida. 

Depois de dois dias de batalha furiosa, no dia 15 de julho de 1099, uma sexta-feira santa, os cruzados tomaram Jerusalém. “…Alguns jovens acenderam flechas e lançaram-nas abrasadas sobre os colchões que guarneciam os redutos que os Sarracenos tinham construído a frente da torre de madeira que os cruzados haviam erguido. Esses colchões estavam cheios de algodão. O fogo pôs em fuga os que defendiam essa obra fortificada. Então o duque e os que com ele se achavam reconstruíram imediatamente a sebe que recobria a parte anterior da torre de madeira, desde o cimo até o meio, e, tendo feito uma espécie de ponte, lançaram-se intrepidamente para penetrar em Jerusalém. Todos os outros subiram atrás deles. Como os nossos se achavam de posse da muralha e das torres, viram-se coisas admiráveis. Entre os Sarracenos, uns tinham a cabeça cortada, o que era para eles a sorte mais suave. Outros, atravessados por flechas, viam-se forçados a saltar do alto das torres. Outros ainda, após prolongados sofrimentos, eram entregues as chamas e consumidos por elas. Viam-se nas ruas e nas praças montes de cabeças, de mãos, de pés. Infantes e cavaleiros abriam caminho através dos cadáveres. Mas tudo isso era pouco.

No templo e no pórtico de Salomão, nadava-se no sangue, até o joelho, dos cavaleiros e até as rédeas do cavalo. Justo e admirável o julgamento de Deus, que desejou recebesse aquele lugar o sangue dos que blasfemaram contra Ele, conspurcando por tanto tempo esse território”.  Godofredo e seus cavaleiros entraram no Santo Sepulcro com a cabeça descoberta, pés descalços, vestidos de estamenha (tecido grosseiro de lã) e banhados em lágrimas. Os judeus foram queimados vivos em suas sinagogas. Todos os prisioneiros foram mortos incluindo, mulheres e crianças. E as ruas de Jerusalém tiveram que ser lavadas para limpar o sangue. O saque foi colocado em monte comum, benefício dos sobreviventes e recompensa. Os cruzados agora senhores de Jerusalém, escolheram para seu rei o homem que os conduziu bravamente. Mas Godofredo, declarou que não lhe seria possível aceitar a coroa de rei, onde Cristo a tivera de espinhos, aceitou o título de barão e defensor do Santo Sepulcro e assumiu a soberania de um novo reino “O Reino Latino de Jerusalém”. Seguindo o modelo do ocidente, o novo reino foi dividido em feudos. Godofredo codificou leis e costumes feudais que deviam servir de legislação para o reino de Jerusalém com o nome de Assizas, pelo qual é conhecido. 

O patriarca da igreja grega fugiu imediatamente e as paróquias do novo reino aceitaram a liturgia latina e a supremacia do papa. O califa do Egito considerando perigosa a estadia dos cristãos em Jerusalém marchou contra Godofredo, mas foi vencido. Godofredo de Bouillon morreu aos 42 anos, em 1100, de uma moléstia desconhecida. Tendo governado apenas um ano, e nem esse mesmo completo, deixou seu irmão Balduíno que o sucedeu. Houve quem atribuísse a sua morte a um veneno que lhe teria sido ministrado por um emir. A Primeira Cruzada custou à vida de 500 mil cristãos. Foucher de Chartes escrevia, após a tomada da Terra Santa.”Nós nos tornamos orientais. O habitante de Reims ou de Chartres transformou-se em Sírio ou em habitantes de Antioquia. Já esquecemos os nossos lugares de nascimento. Um possui já neste país casas e servidores como se os tivesse herdado; outro casou-se, não com uma compatriota, mas com uma síria, uma Armênia ou mesmo uma sarracena convertida… Servimo-nos, alternadamente, das diversas línguas do país, e a confiança aproxima as raças mais afastadas. Realizam-se as palavras da Escritura:

– O leão e o boi comerão na mesma manjedoura.”

,Memo, excelsocon.org/old/literaturas/sintese_historica/historia_geral/as_cruzadas. Extraído da “Gesta Francorum” adaptado e traduzido por Cato.

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