Eu andava por uma estrada vazia, coberta somente de terra, mas ladeada por generosa vegetação, donde avistava ipês amarelos e flamboyants das mais variadas tonalidades. Meu pensamento erradio mal valorizava a exuberância de enorme cachoeira, cuja abundância d’água precipitava num espetáculo de força e graça suprema.
Não obstante a esse contato sublime com a mãe natureza, um vendaval de aflições me perturbava o ânimo. Por mais que eu tivesse de tudo –amores, amigos e entes queridos- um vazio sem explicação ocupava parte do meu interior despedaçado.
Ao invés de enveredar meus pensamentos pelas regiões da gratidão e do reconhecimento, só conseguia me afogar nas águas lamacentas da insatisfação e da incompreensão. Foi quando – para meu espanto - surgiu do nada um pequeno ancião, qual um mago de baixa estatura, cuja tez enrugada denunciava-lhe a idade e a experiência de vida, e virou-se, em minha direção:
- meu filho, por que tanto choras?
Fiquei assustado, tão logo percebi que o senhor de baixa estatura não enxergava, mas que ainda assim sentiu minha presença quando de sua repentina aparição. Sem quase nada entender, respondi a ele:
- eu não estava chorando, senhor..?
- Tempo, pode me chamar de Tempo, meu querido filho. Você pode não estar com os olhos marejados, mas sinto sua alma vertida em prantos, em profunda aflição e numa extrema angústia, a qual parece não ter fim.
Assustei-me com a serenidade e precisa ponderação daquele estranho e velho sábio; todavia, não querendo dar o braço a torcer, dissimulei:
- Senhor Tempo, deve ser somente o cansaço e o calor do dia-a-dia. Não tenho motivo nenhum para chorar ou mesmo reclamar. A vida me tem sido muito benevolente. Por quais motivos uma pessoa tão privilegiada feito eu poderia chorar ou mesmo reclamar? Agradeço ao senhor, mas estou muito bem!
- Fico muito feliz, meu filho. Afinal, já escutei diversos relatos feito o seu. Pessoas cujos maiores patrimônios eram os amigos e a família; no entanto, a correria e loucura do cotidiano faziam com que elas se distanciassem de todos. Elas sempre buscavam amealhar fortuna material, deixando seus afetos para um segundo, terceiro ou quarto planos. Eis que um dia a morte, inexorável e impiedosa visitante, veio estar junto delas, não oportunizando sequer uma breve despedida. Você ainda tem tempo para rever seus conceitos, querido irmão! Reflita bem sobre isso, e não desperdice as oportunidades de viver o verdadeiro amor, em sua plenitude.
Aquelas breves palavras tocaram a fundo o imo de minha alma. Como um velho sábio, desconhecido, conseguiu ler meus pensamentos, fazendo com que um filme de minha existência passasse por minha cabeça tão eficiente e rapidamente? Foi quando os ventos irromperam daquela extasiante vegetação, trazendo um frescor jamais sentido por mim antes, e uma brisa leve e carinhosa insistiu em tocar minha face, proporcionando-me uma paz indizível ao coração.
Olhei para todos os lados, à procura daquele ser carismático e misterioso, para externar a ele meu agradecimento, mas o “generoso amigo” havia sumido, tal quais sumiram os sentimentos de amargura e dor que me inquietavam o âmago. O que acontecera comigo? Afinal, quem era aquele distinto e nobre senhor? Por que aparecera em meu caminho e por qual razão houvera sua intervenção em meu favor?
Até hoje, penso ter vivido bons instantes de epifania, mesmo sem ter feito por aquilo merecer. Num primeiro momento, não havia entendido por que aquele velho sábio havia aparecido e sumido do nada, como num piscar de olhos. Porém, com o passar dos anos, pude constatar que, em tudo nessa vida, existe o Toque Magistral de Deus. Aquele pacífico e sereno senhor mostrou-me que o Tempo surge, e passa muito rápido para todos nós. Portanto, é fundamental que saibamos valorizá-lo, com todas as forças d’alma!
O Senhor Tempo é uma das dádivas do Grande Arquiteto, capaz de cicatrizar todas as feridas, e de trazer o bálsamo necessário para as dores dos homens. Não o desperdicemos com aquilo que é efêmero e frívolo. Aproveitemos seu auxílio fraterno, para vivermos em companhia daqueles a quem amamos, e que são os verdadeiros responsáveis por nossos momentos de felicidade em sua plenitude.
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