abril 07, 2024

O FATO HISTÓRICO E O ANACRONISMO NO ESTUDO DA MAÇONARIA - Luis Genaro

Na Maçonaria história e lenda confundem-se.

O limite entre o que é fato histórico e o que é lenda, nem sempre é perfeitamente delimitado para o estudioso da Maçonaria, trazendo aos menos especializados, dúvidas e equívocos que acabam perpetuando-se.

Não podemos esquecer, que na Maçonaria e nas Ordens Iniciáticas secretas (ou discretas como é a Maçonaria), todas simbólicas, o conhecimento se transmite, em grande parte, através da tradição oral. Se houver um erro de um determinado facto histórico, um excesso, ou uma deformação histórica, ela tende a se perpetuar entre os seus adeptos.

Não é difícil encontrar Maçons que defendem a ideia que o primeiro Maçon foi Adão (o homem primevo segundo a Bíblia), ou que Jesus teria sido o fundador da Maçonaria, de que a Maçonaria teria surgido durante o Império do Antigo Egito, de que Pitágoras teria sido um dos principais ícones da Maçonaria antiga, etc. Há os que afirmam que a Maçonaria está ligada directamente à Criação do Universo. Nestas afirmações, não há nenhuma fundamentação histórica, baseadas em fatos histórico científicos, perdendo-se completamente em “atos de fé” ou de deformações no conhecimento sobre as verdadeiras origens da Ordem.

Todo o “ato de fé” é traduzido num Dogma. E dogma (ou a presença dele) é a característica mais comum de uma Religião. A Maçonaria propugna não ser uma Religião (embora tenha religiosidade) e, portanto, não pode ser defensora de dogmas, sejam eles quais forem. Como temos uma Crença comum (da existência de um principio Criador que denominamos Grande Arquitecto do Universo) e devido às grandes influências da Igreja Católica e da religião Hebraica (ligado às origens da Maçonaria que se desenvolvera paralelamente ao Cristianismo, principalmente no final da Idade Média e na Idade Moderna), existem elementos comuns que podem confundir os menos estudiosos.

Mais complexo (e não menos polémico) é a história sobre a Construção do Templo de Salomão e a Lenda de Hiram, que é a coluna vertebral da Maçonaria, principalmente nos Graus Simbólicos. O que se sabe sobre a construção do Templo, é que consta na Bíblia, no 3° Livro de Reis (Primeiro Reis) Capítulos 5 a 9 . Não há registos históricos da Construção deste Templo, em nenhum dos documentos originados pelas diversas sociedades da época (como por exemplo o Antigo Egipto, o Império Chinês, Hindu, nem nos outras populações que residiam na Terra naquele período). Não foram encontrados registos arqueológicos do Templo de Salomão (que segundo a própria Bíblia teria sido destruído e reconstruído 3 vezes). Restaram apenas, ruínas do que fora o Templo de Herodes que, segundo a histografia, poderia ter sido construído no mesmo lugar onde teria existido o famoso Templo do Rei Sábio. Se o Templo de Salomão é uma dúvida razoável, a saga de Hiram é uma Lenda. Nem na Bíblia encontramos o desenrolar da estória que se conta na Maçonaria. Isto sem considerar o aprofundamento que se faz, nas instruções dos Graus chamados filosóficos. Mas este é um assunto para outro artigo.

Importante para Importante para o estudioso na Maçonaria é separar o que é fato histórico, lenda, invencionice, fenomenologia e anacronismo.

O Historiador  proposições, que torna o que é Histórico impossível de ser construído sem um elevado grau de abstracientífica, existe até uma metodologia de trabalho baseada nela. Chama-se Fenomenologia. Uma metodologia segundo a qual não existe uma verdade definitiva, todos os factos só existem quando acontecem, mas é impossível retratá-los tal como eles realmente são, pois toda e qualquer tentativa de fazê-lo será apenas mais uma interpretação e, como tal, extremamente parcial, baseada em juízos de valores e características individuais que, como o nome diz, são diferentes em cada um. Sendo assim, duas interpretações de um mesmo facto não serão iguais nem mesmo se forem dadas por duas testemunhas oculares.

Ninguém pode negar que, na sua época, Platão foi um cientista, no entanto, ele não se baseava em factos comprovados ou mesmo em documentos totalmente dignos de credibilidade. Mesmo assim, até hoje não ficou comprovado que ele tenha inventado nada, nem mesmo a História de Atlântida, afinal ele a atribuí a Sólon, o famoso político grego. O que Platão fazia então? Ele abstraía em cima de acontecimentos que presenciava ou dos quais tomava conhecimento. As suas abstracções foram tão brilhantes que ele iniciou uma corrente de pensamento tão forte que até hoje é tida como válida. Agora vejamos. Se Platão podia faz Ciência através, única e exclusivamente, da abstração, porque nós também não podemos?

Temos de ter em mente que as nossas concepções pessoais estão e sempre estarão envolvidas em tudo o que escrevermos, dissermos ou pensarmos, mas não podemos deixar que elas (que são os nossos paradigmas) nos retirem do eixo que deve ser o fundamental de cada trabalho sério e, sendo assim, científico: a busca da verdade.

A busca da verdade é ingrata, pois por mais que a busquemos, tudo o que encontraremos será a nossa própria construção do que é real.

Um erro comum para quem estuda a história é o anacronismo. O anacronismo é o acto de se atribuir coisas de um tempo a outro, de se colocar um costume, uma organização, uma arma, um pensamento… num tempo que não é o dela. Em geral o anacronismo dá-se em relação a tempos mais remotos, por exemplo, é comum se acreditar que Roma foi sempre um Império, que sempre teve um Imperador, afinal, sempre ouvimos falar de César, do Império Romano, mas isto é uma inverdade, o Império Romano só pode ser considerado como iniciado em 27 a.C., quando Octávio é considerado Augusto, ou ainda, em 14 d.C., quando depois da sua morte, Tibérius assume como o primeiro Imperador Romano, visto que Augusto é considerado pela historiografia como Príncipe, mas não como imperador.

Depois desta explicação, pode-se constatar uma coisa, Júlio César, o famoso César de Roma, aquele que enfrenta Asterix e Obelix nas suas histórias, nunca foi Imperador, ele era apenas um dos Cônsules da Roma Republicana, e sendo assim, anterior ao nascimento do Império. Considerá-lo Imperador seria um anacronismo.

Muitas conclusões de Maçons em trabalhos apresentados (inclusive em Livros e Artigos) estão baseadas em anacronismos. Em algumas ocasiões, estes anacronismos revelaram-se e incorporaram-se nos nossos Rituais, modificando o fundamento inicial dos mesmos, alterando, logicamente, o significado e interpretação original. Neste sentido, podemos citar a questão do uso do bastão, o uso da Bíblia, o acender das luzes (no R∴ E∴ A∴ A∴), o uso de sinos ou sinetas, a incorporação de uma harmonia (música) sacra e religiosa, etc.

Tudo na Maçonaria é simbólico. Mas é muito importante que possamos resgatar os conceitos originais, restabelecer a verdade histórica, retirar dos nossos estudos e rituais àquilo que represente anacronismos, como forma de ficar mais claro para os neófitos e para todos os Maçons, qual a Verdade (que é o principal objectivo da nossa busca dentro da Ordem). A tese de que todos nós temos uma interpretação sobre a Verdade (fenomenologia) não impede que tenhamos a condição de “depurar” o conhecimento para que as nevoas da ignorância se dissipem com mais facilidade.

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