junho 20, 2024

VISITAÇÃO - Aldo Vecchine




Certa vez o visitante foi interpelado, pelo cobridor, após a simpática acolhida: _ O que você e os seus fazem do meio-dia à meia-noite?

Desacostumado, ou talvez acanhado, o querelado reservou-se ao silêncio. Sepulcral!

Então o Irmão Cobridor, buscando outra alternativa, contou-lhe que ali, naquela Oficina, trabalhavam na pedra-de-toque, para a construção ficar justa e perfeita.

Ainda outra vez quis saber: de onde vindes?

Daí a resposta foi satisfatória, e detalhada. Então puderam trocar reverências, uma vez que a comunicação era entre iguais, Melhor ainda: que se reconheciam.

A história é fictícia, mas poderia ter acontecido alhures. É bom estarmos vigilantes.

Não é recorrente, mas ao visitar, se lhe pedirem a P.S.? Quem sabe se podeis entrar ritualisticamente? Pode parecer uma desconfiança e desrespeito. Mas tem que ser procedimental. E daí?

É obvio que nas visitações objetivam acolher bem, recepcionar, felicitar-se. Porém todo o cuidado e zelo deve ser premeditado. Toda a ritualística será cumprida.

Ao bom maçom compete a vigilância. Dos seus princípios e os da Ordem. Lembrando-se repetidamente, que a visitação está prevista nos Landmarks, assim como, nos Rituais está composto o trolhamento.

Estudai!

Segundo consta no Ritual do Simbolismo (REAA), a expressão do meio-dia à meia-noite é atribuída a Zoroastro (ou Zaratustra). O sábio persa que aos trinta anos afastou-se de sua pátria e do largo da sua pátria, e dirigiu-se às montanhas. Lá permaneceu por dez anos. Então voltou para disseminar a sua sabedoria.

Ainda muito cedo, naquele dia, esperou pelo sol nascente e lhe disse:

_"Abençoa a taça que quer transbordar, para que dela jorrem as douradas águas, levando a todos os lábios o reflexo da tua glória". -Assim falou Zaratustra-.

Estamos sorvendo da obra de Nietzsche, Editora Martin Claret, que trouxe à tona a sabedoria de Zoroastro, o persa, que sentencia: "O que é de grande valor no homem é ele ser uma ponte e não um fim; o que se pode amar no homem é ele ser a passagem e um ocaso".

Façamos uma analogia com as joias moveis: seus revestidos passam. São homens de passagem. As joias permanecem à espera dos sucessores, que traçarão novo girassol, pela magnetização dos obreiros e dos ensinamentos.

Destarte, falemos do sol poente. Do ocaso que nos chega, diariamente, de muitas formas.

Quantas coisas, ousamos ponderar, têm a sua data de validade? Também nós nascemos com data de finitude. O ocaso, para nós, deve ser aceito e compreendido. Há de ser um ato, profundamente, reflexivo e amoroso.

“Amar e desaparecer: são coisas que andam a par desde a eternidade. Querer amar é também estar pronto a morrer”. Assim falou Zaratustra.

Mas antes de o fim se apresentar, voltemos à taça. Ela é transbordante. A da boa e a da má sorte. É sapiente reconhecer as doçuras e os amargores na vida. É edificante sorver um gole de cada vez. Para tanto, seja um sommelier, diariamente. Use o buquê e o dosador!

Mesmo sabendo que não teremos o controle absoluto sobre tudo. E isso é bem razoável! Seja, pois um bom maçom, seja como Zoroastro. Repetidas vezes exercite seu cabedal, acrescentando a nele, novos elementos.

Talvez aí dosemos a parte ideal de doce, bem como do agridoce e até do profundo amargor.

A caverna...

E as diferentes percepções dos visitantes. Tudo muito particular; e bastante individualizado também. Inconfessável, mas é reveladora essa visitação, pois cada sepultamento traz consigo as possibilidades de reencontro com o que estivera perdido, e mais, renovará o ser, inteiramente.

Zaratustra escolheu nas montanhas, uma caverna. As Ordens Iniciáticas, no ocidente, a masmorra. Talvez com a mesma significação.  E o adverbio utilizado ali, não é de dúvida, mas de possibilidade.

Retirar-se às montanhas ou trancar-se na masmorra tem a possibilidade de revelação e reencontro: sempre pela disseminação do que foi aprendido.

A grande mediadora nesse processo é, indubitavelmente, a vontade. Como manifestação da consciência, seguida de sapiência e amor/ação.

Pois assim falou Zaratustra: "Na terra nada cresce mais satisfatório do que uma elevada e firme vontade. Uma elevada e firme vontade é a planta mais bela na terra. Semelhante árvore anima uma paisagem inteira".

E nas paredes daquele compartimento estão completando todo o cenário, mensagens de ânimo e restauração. Enigmas ou advertências que promovem a imaginação, que a faz decolar em busca de um novo amanhecer.

Acolhimento

Extremamente necessário para a construção do pertencimento... E o obreiro que não trabalhar nessa edificação, não cativar o seu lugar entre todos, corre o risco de autoisolamento.

Coloquemos em análise que as desistências sejam causadas, entre outras coisas, pela barreira edificada no lugar do pertencimento.

E mesmo tendo suplantado as provas, vencido o confronto com as diferentes nuances, superado o desconhecido e distinguido virtude/vício, se não completar a fase das fundações, seu edifício poderá ruir.

Ensejamos e conspiramos para que toda a semente se transforme em belas árvores que animarão todas as paisagens e passagens (ou portas) que sempre se abrirão, a quem bater/percorrer. Que os pedidos sejam revestidos de acolhimento para alcançarem êxito. E todas as buscas que iniciam como sorte de principiante, sejam enfeitadas de coragem e sapiência para o verdadeiro encontro.

Assim, encontraremos os Irmãos em todas as visitações. Resgataremos o que estava oculto, em cada imersão. Lançaremos as sementes como os semeadores fizeram desde sempre, colaborando com a renovação, com outras paisagens, com novos brotos.

Para tanto o trabalho, do meio-dia à meia-noite, dedicado ao aperfeiçoamento dos costumes, por uma sã moral, mais a incorruptibilidade do corpo e indestrutibilidade da alma, mantenha acesa as luzes adornando, sobre o altar, o ponto central, onde vigora o poder.

Se assim o for, a chave de acesso ou a senha de abertura emanará do conhecimento, enriquecido de sabedoria e vontade que, coroando a pessoa do presidente, determina ao Oficiante a composição ordeira dos três elementos.

Reunidos e instalados sob um céu azulado, os trabalhadores manterão a união e a ordem universal. Celebrarão a paz sob um fundo musical. E quando o sol alcançar o nadir, assinalando seu ocaso, que anunciem a chegada do ágape fraternal.

Então poderão regozijar a amizade e a fraternidade, compartilhando o alimento do corpo, uma vez que a alma e o espírito foram nutridos pelos melhores eflúvios advindos da magnetização e das trocas entre os polos.

Alimentados e satisfeitos a dispersão acontece em meio a esperança e o aguardo pelo eterno retorno, às atividades, à construção e ao labor incessante. Sapientes e contentes, todos retornarão aos seus postos, com exceção dos que desistiram, principalmente, pelo não pertencimento ou quem sabe, por conta do ocaso. Oxalá!




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