agosto 21, 2024

REFLEXÕES SOBRE A INICIAÇÃO - Hercule Spoladore

Costumamos ler com frequência, ou mesmo ouvir em Lojas que certos Irmãos por certas condições peculiares já eram maçons antes de serem iniciados, pois já agiam como se fossem membros da Ordem. Achamos que esta afirmação é apenas uma força de expressão, pois literalmente ela não é verdadeira.

Se ser maçom é sinônimo se ser bom, íntegro, justo, crer em Deus e outros tantos epítetos, então o mundo seria uma imensa Loja, pois existe um número muito grande de homens que poderiam ser maçons, o que realmente não ocorre, portanto não é verdade.

O que realmente acontece é que existem milhões de homens que preenchem os requisitos que a Maçonaria exige, mas só serão maçons se ao serem iniciados quer no dia de sua Iniciação, ou quer com o passar do tempo quando vivenciarão realmente sua Iniciação, é que verdadeiramente se tornarão maçons, a qual é uma condição muito especial, espiritual, e também muito pessoal de cada um.

Alguns são realmente muito marcados e sensibilizados no dia marcado pela Loja do seu recebimento na Ordem. Todo simbolismo empregado, dirigido, toda a técnica iniciática, a privação da visão pela venda, por algumas horas, estimulará outros sentidos de tal maneira que quer queira ou não, o iniciando será obrigado a se colocar numa introspecção de tal ordem que sua mente se tornará receptiva recebendo os ensinamentos previamente preparados que agirão de forma inevitável em cada um, sempre de maneira pessoal, pois cada qual dadas as suas concepções metafísicas receberá estas impressões na sua consciência íntima ou seja no seu EU profundo. Haverá então uma extrapolação de energias positivas durante a experiência, onde transfundir-se-á  em dado momento a natureza do ser único e pessoal, impulsionando o iniciando a encontrar novos caminhos do espírito. Será uma maneira dele conhecer o seu mundo interior sem barreiras, de tal forma que terá uma visão mais realista e coerente do universo em que vive. O seu EU se reverterá numa massa compacta de harmonia, impulsionando-o a novas realizações. Aí o maçom perderá sua linguagem habitual, comum linear e unívoca. Não saberá explicar o que se passou consigo. A linguagem do EU profundo, ou da consciência dupla descoberta durante a Iniciação é algo vivido. Não pode ser dito. A mente criará condições insuperáveis e intransponíveis em que ele mesmo que queira, não saberá explicar a outrem o que está acontecendo. Este é o verdadeiro segredo maçônico e não aqueles que se propalam nas Lojas de toques sinais e palavras e que também os profanos acreditam como tal.

Ato contínuo, dando-se prosseguimento à cerimônia iniciática no momento majestoso de se receber a Luz, quando então o já maçom poderá enxergar com os olhos físicos, ocorrerá o que alguns autores chamam de “choque iniciático”. Aliás, a retirada da venda marca a reentrada do iniciando no mundo comum. Alguns Irmãos referem depois, sobre esta passagem, que a retirada da venda lhes foi um tanto desagradável, porque a suspensão da visão durante aquelas horas e tudo o que sentiram e ouviram foram momentos tão seus, tão íntimos, tão mágicos que ao perceberem  que estavam novamente em comunidade, deixaram de ser um para ser mais um.

Já tivemos a oportunidade de ver Irmãos viverem no dia de sua Iniciação todo o esplendor e toda a profundidade iniciática, que mesmo após a cerimônia, estavam num estado emocional parecido ao transe, tais foram as impressões sentidas e vividas.

É obvio, que estamos discorrendo sobre Iniciações sérias, tecnicamente bem feitas e bem executadas pelas Lojas que assim procedem. Todos os ensinamentos iniciáticos não devem se restringir tão somente ao dia da Iniciação. Eles deverão impregnar o maçom por toda a vida. Não poderão ser apagados ou esquecidos.

Entretanto, ao lado destes maçons que se tornam praticamente iniciados no dia de sua Iniciação, há outros que jamais serão iniciados, apesar de terem passado pelo mesmo processo. Estes acham que a sequência iniciática até poderia ser dispensada, pois é muito longa, se sentem mal com a venda nos olhos, etc. Estes vieram buscar na Maçonaria uma associação de auxilio mútuo, de esportes, vieram buscar uma sociedade de banquetes, de festas, como se ela fosse um clube social ou mesmo um clube de serviço. Usarão aventais vistosos, saberão realizar os mesmos sinais que seus Irmãos, conhecerão as palavras, usarão até orgulhosos o famoso distintivo do esquadro-compasso na lapela, poderão até serem assíduos às Sessões Todavia, aquela metamorfose espiritual que a Maçonaria tentou incutir neles mesmo que eles tentem a enganar a si próprios, mostrando-se solícitos, ou mesmo até generosos em movimentos de beneficência, ela jamais ocorrerá. Culpa de quem?  Da Maçonaria?  Difícil avaliar.

Achamos que a verdadeira Iniciação dependerá do Iniciando e de mais ninguém.

Dependerá muito mais do que este homem veio buscar na Ordem e não do que ele pensa estar procurando. As vezes querer não é sentir.

A Maçonaria apenas mostra o caminho. Ela representa um meio. O fim é o próprio Irmão. Se o Irmão não achar a Verdade em si próprio, ninguém a achará por ele.

Se o maçom for pequeno espiritualmente, nem usando avental bordado a ouro, fará dele um verdadeiro maçom.

Krishnamurti disse: “ eu sustento que a Verdade é uma terra não trilhada e que não a alcançareis por nenhum caminho, nenhuma religião, seita...”. Por analogia, o maçom é que se iniciará a si mesmo procurando a sua Verdade.

Existe um grupo de homens bastante restrito, fechado, que só se iniciará verdadeiramente na Ordem pelo Conhecimento. Ao referirmos esta palavra Conhecimento, não queremos apenas dizer a somação intelectual de dados, fatos e informações por um processo de memorização, mas sim a um enorme esforço de conscientização e espiritualidade que agem gradualmente como agente catalisador de uma metamorfose interior.

Tratam-se de homens que muito embora, não deixaram de ficar marcados profundamente pela experiência de várias horas que durou sua Iniciação, porem entendem e concordam que ela foi apenas o início de uma jornada, dado a sua sensibilidade e desejo de aprender e tendo um sentido aguçado de pesquisa, com muito esforço e com elevado senso crítico a respeito de tudo que os cerca, de tal forma que tudo após passar pelo sua censura, pelo seu julgamento será aceitado ou rejeitado.

Então, somente após aprenderem por dedução própria o que é realmente Maçonaria, começará a haver nele aquela abertura espiritual é que vão se tornando realmente Iniciados. Esta visão deve ser reciclada dia a dia. O Conhecimento real levará o Irmão a uma espiritualidade tal, sendo este o mais elevado escopo da Ordem.

Dos abismos de sua consciência, mergulhando para dentro de seu interior, bem no fundo de sua personalidade arcaica, irá surgir o verdadeiro Iniciado, o qual a cada revelação tanto mais se aproximará da perfeição.

Na acepção mais profunda e verdadeira a Iniciação é em última análise, um processo de regeneração espiritual e moral, através do conhecimento gradativo lento e seguro das normas que governam o equilíbrio interior do maçom na mesma vibração que o universo exterior.



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