Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu. Adoramos a perfeição, porque não a podemos ter; repugná-la-íamos se a tivéssemos. O perfeito é o desumano porque o humano é imperfeito.
Tenho pensamentos que, se pudesse revelá-los e fazê-los viver, acrescentariam nova luminosidade às estrelas, nova beleza ao mundo e maior amor ao coração dos homens. Quanto mais fundamente penso, mais profundamente me descompreendo.
O coração se pudesse pensar pararia. De sonhar ninguém se cansa, porque sonhar é esquecer, e esquecer não pesa e é um sono sem sonhos em que estamos despertos. Tudo o que dorme é criança de novo.
O Amor é um sono que chega para o pouco ser o que é. Sentir é criar. Sentir é pensar sem ideias, e por isso sentir é compreender, visto que o Universo não tem ideias. Há tanta suavidade em nada dizer e tudo entender.
É preciso ser um realista para descobrir a realidade. É preciso ser um romântico para criá-la. Quem não vê bem uma palavra, não pode ver bem uma alma. Saber interpor-se constantemente entre si próprio e as coisas é o mais alto grau de sabedoria e prudência.
Nem ausente, nem presente por demais. Simplesmente, calmamente, ser-te paz. O mais alto de nós não é mais que um conhecedor mais próximo do oco e do incerto de tudo. Tudo é orgulho e inconsciência. Tudo é querer mexer-se, fazer cousas, deixar rastro.
A vida é uma grande feira e tudo são barracas e saltimbancos. Sinto-me nascido a cada momento para a eterna novidade do Mundo. O gênio, o crime e a loucura, provêm, por igual, de uma anormalidade; representam, de diferentes maneiras, uma inadaptabilidade ao meio.
Fernando António Nogueira Pessoa, 13 de junho de 1888, Lisboa, Portugal – 30 de novembro de 1935, Lisboa, Portugal.
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