*GUARDA DO TEMPLO*
Ir∴ Eduardo José da Fonseca Costa, ARLS “União e Paz” no 166
As atribuições dos Guardas do Templo são melhor elucidadas quando se lhe especula as funções em um nível mais transcendental...
O R.I. institui o cargo de Guarda do Templo, conquanto delegue a determinação de suas funções aos manuais ritualísticos (art. 172). No entanto, o mesmo R.I. prescreve tratar-se de cargo oficial provido por eleição (art. 159, caput), em que são investidos, exclusivamente, pois, Mestres Maçons (ex vi do art. 117, § 3o, da CGLESP). Embora seja um cargo elegível, a CGLESP não lhe prevê os requisitos de elegibilidade, tratamento este só dispensado para os cargos de Venerável Mestre, 1º Vigilante, 2º Vigilante, Orador e Tesoureiro (art. 117, caput e §§). Trata-se de uma lacuna, porém, facilmente colmatável após uma análise histórica da tradição do Guarda do Templo.
Nos antigos rituais maçônicos, encontravam-se dois Guardas do Templo: um externo, que vigiava o adro; e um outro interno, que recebia daquele as indicações. De vez que os trabalhos de uma Loja devem realizar-se a portas fechadas, cabia-lhes zelar para que ninguém perturbasse a sessão. Não é por menos que os Guardas do Templo tem como jóia representativa 2 (duas) espadas cruzadas, símbolos de alerta e de proteção. Hoje, porém, restou somente o Guarda Interno do Templo, ou, simplesmente, “Guarda do Templo”, que guarda internamente a porta do Templo e dá a entrada aos Irmãos que chegam após a abertura dos trabalhos. Para JULES BOUCHER, trata-se de cargo a ser confiado ao Irmão mais experimentado da Loja, que seja um profundo conhecedor do ritual e dos seus procedimentos, razão pela qual muitas Lojas ainda outorgam essa responsabilidade ao Venerável Mestre que sai (p. 120).
Isso porque, no direito consuetudinário maçônico, sempre foram atribuídas ao Guarda externo do Templo as funções de “cobrir” e “telhar” (motivo pelo qual o Guarda Externo do Templo pode ser também chamado de “Cobridor Externo” ou “Telhador”). Segundo BOUCHER, “telhar um Irmão” significa interrogá-lo para constatar, pelas suas respostas, se ele é mesmo maçom e se seu grau corresponde ao grau para o qual trabalha a Loja; por extensão, “cobrir o Templo” tornou-se sinônimo de “sair”. Assim, caso profanos consigam entrar numa reunião maçônica e se um deles se aperceber disto, diz o Guarda do Templo: “Está chovendo” ou “Há goteira”, isto é, o Templo não está coberto.
Há divergência quanto à denominação que se deve dar ao procedimento formal para identificação e constatação da regularidade maçônica: “telhamento” ou “trolhamento”. Os Manuais da GLESP falam em “trolhamento”, posição de que compartilha RIZZARDO DA CAMINO. Segundo este autor gaúcho, “passar a Trolha sobre alguém” significa retirar sua asperezas para que, quando der ingresso no Templo, não seja diferente dos demais, pois se apresentará como Pedra Polida, e não como Pedra Bruta (p. 391-392). Aliás, este autor sequer mete as palavras telhar e telhamento em sua clássica obra Dicionário Maçônico. Todavia, não posso referendar tal posicionamento. Na maçonaria de língua inglesa, o Guarda do Templo é chamado de Tiler (de tile = telha); na de língua francesa, de Tuillier (de tuille = telha); na Itália, de Tegolatore (de tegola = telha), e assim por diante. Percebe-se, conseguintemente, que as traduções de Tiler, Tuillier e Tegolatore são as mesmas: TELHADOR, i.é., o que procede ao TELHAMENTO. Já o termo TROLHAMENTO deveria significar “passar a Trolha”, ou seja, aparar as arestas e as imperfeições da argamassa, fazer esquecer as injúrias e as injustiças; enfim, apaziguar maçons em eventual litígio. De qualquer forma, a par de todas dessas questiúnculas vernaculares, é ao Guarda do Templo que se confia preponderantemente a eficácia do 15º Landmark (“nenhum visitante, desconhecido aos irmãos de uma Loja, pode ser admitido a visitar, sem que antes de tudo seja examinado, conforme os antigos costumes”). A execução cabal deste preceito exige um Irmão, pois, que conheça todos os membros de sua Loja, todos os sinais, todas as palavras de passe, todas as palavras sagradas, todas as senhas e as peculiaridades de cada grau.
Justamente porque telha, não se recomenda ao Guarda externo que permaneça no Átrio, pois esse recinto faz parte, pela sua “imantação”, ao próprio Templo, onde não é permitida a presença de estranhos; o estranho e os visitantes retardatários devem permanecer na Sala dos Passos Perdidos que precede o Átrio. Quando o Venerável Mestre reúne os Irmãos para a procissão de adentramento ao Templo, determina a preparação espiritual, procedida pelo Mestre de Cerimônias, que faz uma invocação ao Grande Arquiteto do Universo; é no átrio que os Irmãos deixam todos os assuntos e vibrações profanas; o Átrio é um estágio de purificações e, por esses motivos, não pode receber quem não tiver sido antes purificado.
As atribuições dos Guardas do Templo são melhor elucidadas quando se lhe especula as funções em um nível mais transcendental. Segundo ZILMAR DE PAULA BARROS (p. 101-102), os 10 (dez) oficiais da Loja (= Venerável, 1º Vigilante, 2º Vigilante, Orador, Secretário, Experto, Mestre de Cerimônias, Tesoureiro, Hospitaleiro, Guarda do Templo) situam-se, perfeitamente, na árvore sephirótica: o Venerável corresponde a KETHER (A Coroa); o Secretário corresponde a BINAH (Inteligência); o Orador a CHOCHMAH (Sabedoria); o Tesoureiro a GEBURAH (Força, Rigor); o Mestre de Cerimônias equivale a TIPHERETH (Beleza); o Hospitaleiro a CHESED (Graça); o 1º Vigilante a HOD (Vitória, Firmeza); o 2º Vigilante a NETZAH (Glória, Esplendor); o Experto a IESOD (Base, Fundamento); o Guarda do Templo a MALKUTH (Reino ou Mundo Profano). Ora, MALKUTH é a Sefirah inferior constituinte da presença de Deus na matéria, cuja natureza quádrupla encerra os quatro níveis inerentes à árvore sephirótica como um todo (a raiz, o tronco, os ramos e os frutos, conforme cresce no interior existencial; ou a Vontade, a Mente, o Coração e o Corpo Divino) e sobre nós aparece como o CORPO FÍSICO, com seus elementos tradicionais: terra, água, ar e fogo (HALEVI, p. 7-8). Ora, se na estrutura de uma Loja maçônica o Guarda do Templo corresponde a MALKUTH, e se uma Loja nada mais é do que uma alegoria simbólica do Corpo Místico do Homem, então o Guarda do Templo é representante do único contato direto que a “Alma de uma Loja” tem com o Mundo Exterior.
Posição similar é a de CHARLES LEADBEATER. Para o autor inglês, a Loja Maçônica possui maquinismo que lhe permite invocar o auxílio de entidades espirituais em seus trabalhos altruístas de acumulação e distribuição de forças astrais em benefício do mundo. Cada oficial teria, além de seus deveres no plano físico, a missão de representar um dos cinco planos da natureza (os planos espiritual, intuicional, mental, astral e físico) e de servir de foco para as suas energias peculiares. O Venerável representaria o plano espiritual (correspondente no homem à vontade espiritual); o 2º Vigilante, o plano intuicional (correspondente no homem ao amor intuicional); o 1º Vigilante, o plano mental superior (correspondente no homem à inteligência superior); o 1º Diácono, o plano mental inferior (que no homem corresponde à mente inferior); o 2º Diácono, o plano astral (que no homem equivale às emoções inferiores); o Guarda Interno do Templo, o plano físico superior (equivalente no homem ao duplo etérico); o Guarda Externo do Templo, o plano físico inferior (correspondente no homem ao corpo físico denso). Daí o motivo de os fundadores da Maçonaria terem disposto as coisas de maneira que a enumeração dos oficiais e a declaração dos seus lugares e deveres servissem de invocação aos anjos pertencentes aos respectivos planos. Simbolicamente, para o corpo físico e o duplo etérico protegerem a “loja da alma” dos perigos do mundo exterior, das tentações e das influências malignas, ordena-se ao Guarda Externo (o plano físico inferior) e ao Guarda Interno (o plano físico superior) que impeçam a entrada dos profanos, representantes das paixões violentas (p. 117-121). Para LEADBEATER, portanto, este esquema demonstra que a obrigação da inteligência é discernir e julgar que pensamentos e emoções devem ser admitidos no templo do homem: o Venerável comunica-se com o Guarda Externo por meio do 1º Vigilante e do Guarda Interno, significando que o espírito não atua diretamente na matéria densa do corpo físico, senão que por intermédio da inteligência influi no duplo etérico, embora, uma vez realizada a investigação, a mente possa instruir o duplo etérico para que comunique o assunto diretamente ao espírito. Para simbolizar isto, há em algumas Lojas o costume de dizer o 1º Vigilante ao dar a ordem: “Irmão Guarda do Templo, vede quem solicita entrada e comunicai-o ao Venerável”.
Se há autores que estabelecem correspondência entre os cargos da Loja e os Sefiroths da Cabala, e se há autores que estabelecem homologias entre esses cargos e os planos da natureza, há aqueles irmãos que enxergam conexão entre o oficialato maçônico e o simbolismo planetário astrológico, conexão esta que nos permite alinhavar o perfil psicológico que deve portar o Irmão ocupante do cargo de Guarda do Templo.
Segundo BOUCHER, o Venerável corresponde a Júpiter; o 1º Vigilante, a Marte; o 2º Vigilante, a Vênus; o Orador, ao Sol; o Secretário, à Lua; o Guarda interno, a Saturno; e o Guarda externo, a Mercúrio (p. 123). O Guarda Externo, justamente por ser regido por Mercúrio, o mensageiro dos deuses, é quem anuncia ao Guarda Interno aqueles Irmãos que vêm se apresentar e que pedem a sua admissão. Trata-se de cargo astrologicamente talhado, portanto, para os nascidos sob o signo de Virgem, signo associado ao sistema nervoso, à percepção mental, ao cérebro e às atividades de comunicação física e mental. Não se é de estranhar, aliás, que os traços positivos dos Virginianos sejam as características mais pretendidas de um Guarda Externo: o raciocínio rápido, a percepção ágil, a inteligência, a versatilidade, a intelectualidade e o impulso para a aquisição e a transmissão do conhecimento. Em contrapartida, tem-se o Guarda Interno do Templo, regido por Saturno, o deus prudente que prefere os lugares sombrios, encarregado de anunciar a presença daqueles que julgou dignos de entrar. Trata-se agora de cargo astrologicamente cunhado para os nascidos sob o signo de Capricórnio, signo este associado às idéias de “limitação” e “contenção”. Também aqui não há de estranhar que os traços positivos dos Capricornianos sejam tão esperados do ocupante do cargo de Guarda Interno do Templo: prático; cauteloso; responsável; paciente; de confiança; resistente; disciplinado, estável.
J. BOUCHER ainda assevera que os Oficiais situam-se, perfeitamente, nos braços de uma estrela de seis pontos ou “Selo de Salomão”: o Venerável e os dois Vigilantes, que dirigem a Loja, formam um triângulo ascendente D; o Orador, o Secretário e os Guardas do Templo, que organizam a Loja, formam um triângulo descendente Ñ (p. 123-124). Aliás, tal ordem se verifica na circulação, com formalidades, tanto da Bolsa de Propostas e Informações quanto da Bolsa de Beneficência para o Tronco de Solidariedade, circulação esta que se faz na ordem hierárquica.
Por fim, vale a pena registrar as associações tecidas por W. KIRK MACNULTY (maçom inglês adepto duma corrente psicologista) entre sete cargos de oficiais e as Sete Artes Liberais: o Guarda Externo do Templo corresponderia à Gramática; o Guardo Interno do Templo corresponderia à Lógica; o 1º Diácono, à Retórica; o 2º Diácono, à Aritmética; o 1º Vigilante, à Geometria; o 2º Vigilante, à Música; e o Venerável Mestre, à Astronomia (p. 23-23). Assim, se a Gramática é a arte que estabelece as regras estritas para estruturar as idéias de modo que possam ser comunicadas e registradas no mundo físico, o Guarda Externo representa a parte da psique que está em contato estreito com o corpo físico, através do sistema nervoso central; portanto, ele é um “guardião” no sentido em que protege a psique da saturação de estímulos do mundo físico. Em contrapartida, se a Lógica é a arte que ensina as normas para a análise racional, o Guarda Interno representa o que a psicologia moderna denomina “ego”, isto é, o poder executivo partidário da atividade psicológica quotidiana que se distingue pela sua capacidade para formar imagens mentais; portanto, ele é um “guardião” no sentido de que vela pelas pessoas que permitem à sua psique relacionar-se com o mundo.
Como se pode [ver], seja qual for a associação que feita com os cargos de Guardas Interno e Externo, em qualquer uma delas as conclusões são exatamente as mesmas.
Rogo ao G∴A∴D∴ U∴ que a todos ilumine e guarde. Fraternalmente.
Bibliografia:
BARROS, Zilmar de Paula. A Maçonaria e o Livro Sagrado. Rio de Janeiro: Mandarino, s/d. BOUCHER, Jules. A Simbólica Maçônica. São Paulo: Pensamento, s/d. CASTELLANI, José. Maçonaria e Astrologia. 2a ed. São Paulo: Landmark, 2001. COLTURATO, Adalberto et alii. Telhamento. In A Gazeta Maçônica. Ano XXXVII – no 250. mar- abr/2004. p. 5. DA CAMINO, Rizzardo. Dicionário Maçônico. São Paulo: Madras, 2001. DA CAMINO, Rizzardo. Simbolismo do Primeiro Grau: Aprendiz. 2a ed. Rio de Janeiro: Aurora, s/d. FIGUEIREDO, Joaquim Gervásio. Dicionário de Maçonaria. 4a ed. São Paulo: Pensamento, s/d. HALEVI, Z’Ev Ben Shimon. A Cabala. Edições Del Prado. LEIRIÃO FILHO, Sinésio et alii. O Telhamento no Rito Adonhiramita. In A Gazeta Maçônica. Ano XXXVII – no 250. mar-abr/2004. p. 8. LEADBEATER, Charles W. A Vida Oculta na Maçonaria. São Paulo: ensamento, 1956. MACNULTY, W. KIRK. Maçonaria. Edições Del Prado. PARKER, Julia.
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