fevereiro 05, 2025

AS "MÚSICAS" DE HOJE EM DIA


Dizem que Mozart, aos quatro anos, já tocava clavicórdio (não, isto não é inflamação na clavícula) com uma desenvoltura que faria qualquer adulto sentir-se um débil mental musical. Aparentemente, enquanto outras crianças dessa idade mal dominavam a arte de amarrar sapatos, ele já improvisava frases musicais que deixariam compositores profissionais mordendo o teclado. Aos seis anos, era um pequeno prodígio que lia partituras como quem lê rótulos de cereal no café da manhã — e, se você acha isso extraordinário, provavelmente nunca tentou ensinar uma criança a diferenciar "dó" de "sol".  

Por outro lado, Beethoven, 14 anos mais novo, era o típico adolescente que olhava para Mozart com uma mistura de admiração e inveja mal disfarçada. O jovem Ludwig não apenas interpretava as óperas do mestre em Bonn, como viajou a Viena para tentar aprender uns truques diretamente com ele — talvez esperando que, além de composições, Mozart lhe ensinasse como não enlouquecer ao lidar com nobres mal-humorados.  

Esses dois gênios moldaram a música universal, estabelecendo um padrão tão alto que, sinceramente, nos deixou com a impressão de que estamos em um declínio permanente. Hoje, trocaram as catedrais e os quartetos de cordas pelos pancadões e seus DJs com uma aptidão especial para apertar botões enquanto a plateia finge que aquilo é transcendental.  

E antes que você me acuse de purista — não sou. Amo blues, rock, jazz, country e até folk, aquele gênero que soa como se uma fogueira estivesse obrigatoriamente no fundo. Sou fã do ecletismo musical e acredito que a música deve ser democrática. Porém, meu problema não é com os ritmos em si, mas com o que considero o equivalente sonoro de fast food de esquina: um consumo massivo e desprovido de nutrientes culturais.  

O "funk", por exemplo. Não, não falo do funk de James Brown, aquele gênio que conseguia transformar até um tornozelo torcido em uma coreografia épica. Refiro-me ao nosso funk local, um exercício quase científico de como empobrecer a música e a linguagem ao mesmo tempo. Suas letras, uma ode à falta de decoro, parecem ter sido compostas por um mico-leão-dourado em sua fase rebelde, com rimas tão previsíveis que até um chimpanzé munido de uma caneta e um dicionário de gírias conseguiria fazer melhor. É pornografia rala disfarçada de cultura, um espetáculo de vulgaridade que sequer tem a decência de ser criativo.  

E aí estão as canções de "sofrência" e os "proibidões", que talvez tenham como objetivo principal ensinar às crianças que, sim, o vocabulário brasileiro ainda pode ser mutilado de formas inimagináveis. E por falar em crianças, já se perguntou o que elas estão ouvindo? Melhor: já tentou ouvir o mesmo sem sentir a necessidade de uma taça (ou garrafa) de vinho?  

A cultura de massa, com sua capacidade de nivelar por baixo, tem feito um trabalho assustador. A música — essa arte que expande a imaginação, emociona e desenvolve intelectos — foi sequestrada e, em troca, recebemos playlists que soam como trilhas sonoras de uma geração que perdeu a habilidade de se maravilhar.  

Talvez seja só um devaneio de alguém que pendurou a guitarra e ainda não teve coragem de aceitar que virou aquele tiozinho nostálgico que resmunga sobre “essas músicas de hoje em dia”. Mas, o fato é que, toda vez que penso em Viena, com seus quartetos de cordas ressoando em catedrais, ou nos campos do Mississipi, onde as guitarras choravam como se estivessem pagando promessas, não consigo evitar um certo suspiro. É como lembrar de um grande amor perdido: você sabe que o tempo passou, mas lá no fundo ainda quer aquele último tango. 

No fim das contas, talvez a única saída seja usar fones de ouvido como escudos e rezar para que, em algum momento, a próxima geração tropece acidentalmente em algo que não envolva batidas ensurdecedoras ou rimas dignas de um gerador automático de clichês.  

Quem sabe, com um pouco de sorte — e um milagre digno de intervenção divina —, não surge um novo Mozart por aí. Ou, na pior das hipóteses, alguém que ao menos consiga compor uma música sem rimar "amor" com "dor" como se fosse um mandamento sagrado do pop descartável.


A Toca do Lobo 🐺 (do Facebook)

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