O navio Andrea C, um dos famosos transatlânticos da
época, era relativamente novo, estava no mar havia apenas oito anos em 1956.
Ridículamente pequeno para os padrões atuais, com 130 mts de comprimento
transportava cerca de 450 passageiros (os navios atuais tem em média três vezes
esse comprimento e carregam 6000 passageiros) .A empresa armadora Linea C era
italiana e o navio fazia escala em Gênova, no seu trajeto rumo ao Brasil e
Argentina. Embora estivéssemos na segunda classe, era uma classe confortável na
epoca.
Em Gênova ficamos algumas horas e deu para passear
nas imediações do Porto. Minha irmãzinha e eu fomos balançar na enferrujada
corrente que cercava o monumento a Cristóvão Colombo, esta se partiu, e foi
nossa primeira contribuição ao dano ao patrimônio internacional.
Houve também uma escala na Ilha da Madeira. Papai
gastou um pouco do escasso dinheiro que trazia adquirindo algumas belas colchas
bordadas a mão e lindas bonecas com carinha de porcelana, que pareciam bebês
mesmo.
A escolha do Brasil não foi acidental. Além de
haver uma estrutura de recepção aos imigrantes judeus, havia em São Paulo um
bem sucedido industrial que era parente de um parente da família de meu pai em
Odessa, e a vasta rede de apoio que se dava às vitimas da Grande Guerra o
suportaria na sua chegada, como de fato ocorreu.
Ficamos algum tempo morando em uma pensão no Bom
Retiro, na Rua dos Italianos, e demonstrando uma insuspeitada vocação
comercial, meu pai vendeu com razoável lucro as colchas e as bonecas melhorando
seus recursos. Uma das colchas ficou e sobreviveu na família por muitos anos.
Era o tempo de São Paulo da garoa e ele foi vender guarda-chuvas para uma
empresa do Bom Retiro, Guarda Chuvas Jardim. Há alguns anos fiz uma palestra no
Rotary Clube do Bom Retiro e a loja da fábrica ainda existia, 50 anos depois. Até
hoje não consigo entender como é que ele fazia para vender sua mercadoria
porque ainda não falava portugues. Falava russo, idíshe, hebraico, alemão e um
pouco de árabe, mas portugues, neca.
O Sr. Teperman, aquele distante parente do parente
de papai sugeriu que mudassemos para o interior, quem sabe para a florescente
cidade de Sorocaba, onde encontrariamos melhores condições de vida e de
trabalho. Havia um mascate judeu, baixinho, franzino, idoso, Sr. Oyzer, que
morava em um quarto de uma pensão próxima a estação da estrada de ferro, que se
dispos a vender a sua "clientela" para meu pai. Assim, depois de
visitar um por um dos clientes apresentando o novo mascate o Sr. Oyzer passou
as cadernetas de clientes para o meu pai e não sei que fim ele levou.
E assim, em Sorocaba, começa uma nova etapa na
existência do Sr. Alex Winetzki, este herói de dois mundos, que recomeçava em
um país estranho, com uma língua desconhecida, com esposa e dois filhos
pequenos, aos 41 anos de idade.