Alguns fatos divertidos da minha efêmera experiência de jornalista em Sorocaba merecem ser relembrados. O título é porque quase todos envolveram gente poderosa ou rica.
Em novembro de 1968 fui cobrir a inauguração do
primeiro trecho da Rodovia Castelo Branco que naquela época tinha o nome de
Rodovia do Oeste. Ia de São Paulo para lugar nenhum, um ponto qualquer chamado
Torre de Pedra a meio caminho de Avaré e São Manuel, mas era uma boa
alternativa para ir a São Paulo, que até então era acessada pela Rodovia Raposa
Tavares em viagem que levava cerca de duas horas e meia nos excelentes ônibus
da Viação Cometa. A Castelo tinha de ser acessada pela Éden, mesmo assim a
viagem encurtava em uma hora. Lembro-me dos protestos dos sorocabanos porque o
traçado inicial da estrada deveria passar bem próximo a cidade, e acabou
passando por Itu. A visão do longo prazo do estadista acabou se revelando
providencial pois duzentos mil veículos passando por dia em Sorocaba seriam uma
tragédia viária e a Castelinho proporcionou o desenvolvimento de um grande
parque industrial.
Está montado o palanque debaixo de um calor
infernal. As autoridades suando em bicas em seus caros ternos e aquele enxame de
“assessores” e convidados revoando em volta, mas o evento não começava, Como o
governador Abreu Sodré já estava presente ninguém entendia a razão do atraso.
Aí chega um Cadillac rabo de peixe, enorme, estaciona do lado oposto do
palanque e desce um senhor troncudo. O senhor tira a camisa, o motorista abre o
porta malas e tira uma camisa novinha, um paletó, e o passageiro se troca em
frente a todos, na beira da estrada. Era Sebastião Ferraz de Camargo Penteado,
o autor da obra, dono da Camargo Correa (o Correa já havia falecido há muito
tempo), um dos homens mais ricos e poderosos do país.
Bem está na hora de começar. Discursos daqui,
discursos dali, o mestre de cerimônias fazendo as apresentações até que chega a
fala do governador, mais ou menos assim – “essa estrada que ora entregamos ao
povo paulista é uma das obras mais importantes de nosso governo, blá, blá,
blá”. Não sei dizer se quebrou o protocolo ou não, mas Camargo pega o microfone
e com voz poderosa pontifica: - “esta estrada, construída pelo governador
Ademar de Barros e inaugurada por V. Excia.” O choque foi tão grande que a
cobertura do palanque onde se realizada a solenidade voou com o vento e a
cerimônia acabou ali. Mas a Castelo continua firme e forte mais de cinquenta
anos depois.
Laudo Natel se auto intitulava “o governador
caipira” e uma das marcas de seu governo era despachar por um dia ou mais nas
cidades do interior. Esteve algumas vezes em Sorocaba. Antes de ser governador
foi diretor do Bradesco e presidente do S. Paulo FC, aliás, um dos responsáveis
pela construção do Estádio do Morumbi. De fato, era um homem bastante cordato e
simples. Morava próximo à casa de minha irmã no Pacaembu e eu o encontrei em
uma ou duas ocasiões há alguns anos comprando pão numa padaria na Avenida
Sumaré.
Mas numa destas visitas fui designado para
acompanhá-lo e com a inconsequência da juventude colei no governador enquanto
ele descia da redação do Cruzeiro, com toda uma “entourage” a segui-lo, para a
Praça Cel. Fernando Prestes, nem me lembro por quê. Natel parou no Bar
Passarinho para um café. Eu ao lado do governador. Ele disse baixinho: - dá
para você pagar o café? - Claro, mas o senhor é dono de um banco, argumentei. –
Por isso mesmo, ele riu. – Já imaginou se eu andasse com dinheiro.
Ainda Natel. Em outra ocasião o industrial Carlos
Alberto Moura Pereira da Silva ofereceu um almoço na Chácara Sônia Maria, onde
hoje é o Carrefour. Era uma propriedade espetacular, talvez a melhor de
Sorocaba. Um número enorme de convidados sentava-se às longas mesas de madeira
aguardando o início da ágape. As travessas começaram a ser servidas, mas o
prato principal, para surpresa e angústia de todos, era frango assado, dezenas
de travessas de frango assado e ninguém sabia bem o que fazer. Sentindo no ar o
drama o “governador caipira” atacou uma coxa de frango com as mãos e em questão
de segundos todos os pedaços de frango evaporaram, enquanto os convivas se
lambuzavam deliciados.