junho 18, 2021

A CAVERNA, O CANDIDATO E O APRENDIZ - Luiz Marcelo Viegas

Autor: Luiz Marcelo Viegas - Fonte: Grupo Memórias e Reflexões Maçônicas

No Mito da Caverna, Platão nos faz imaginar gerações de homens, mulheres e crianças, acorrentadas pelos pés, mãos e pescoços, no interior de uma caverna, onde nasceriam, viveriam e morreriam sem nunca vislumbrar sua entrada.

O mundo dessas pessoas é um campo distorcido, formado por sombras dantescas projetadas nas paredes pela forte luz proveniente da entrada, sendo essa a única visão daqueles que lá vivem, e por sons guturais, criados por obra do eco em sua estrutura.

Até que então, um dos membros do grupo desperta da inércia generalizada que acomete seus pares, rompe os grilhões e foge para conhecer o terreno exterior.

Quando retorna percebe que não mais consegue se comunicar com os que lá permaneceram, sendo até mesmo agredido por pensarem que suas histórias sobre como é a vida do lado de fora de fato, nada mais são que mentiras descabidas.

Ele decide então se manter calado quando lá estiver, uma vez que não estão preparados intelectualmente para assimilarem sua descoberta, já que foram condicionados durante gerações a uma determinada “verdade”.

O candidato, que deseja conhecer os Augustos Mistérios da Maçonaria, também se encontra em uma caverna. Acorrentado, desconhece a verdade sobre o globo terrestre, sobre seu corpo e sobre o SEU EU.

Preso ao mundo profano as imagens que lhe chegam por sombras na parede da vida lhe enganam, e os sons distorcidos que vão até seus ouvidos ajudam na criação do engodo promovido pelo Establishment, privando-o do conhecimento do EU Verdadeiro.

Na Câmara de Reflexões, com a tênue luz que lhe é oferecida, ele começa a romper as correntes que teimam em lhe negar o advento da Verdade. Decidido a morrer e nascer para uma nova vida, após meditar sobre seus atos, redige seu testamento.

Durante a cerimônia, o ainda candidato, privado da visão é instado a se utilizar de seus outros sentidos, como preparação da jornada que está prestes a iniciar rumo à liberdade.

Já como Aprendiz, mas na escuridão do Norte, ele inicia todo o processo de conhecimento do Verdadeiro EU, começando os trabalhos de cavar masmorras ao vício e levantar templos à virtude.

Livre dos grilhões, das sombras e dos ecos, ele pode agora mergulhar na viagem do autoconhecimento, preparando seu espírito para o caminho que o levará à Verdadeira Luz.


junho 17, 2021

GOB - 199 ANOS




A Maçonaria, no Brasil, nasceu em 17 de junho de 1822, quando foi, oficialmente, fundado o Grande Oriente do Brasil. Para entendermos como isso se processou, voltemos um pouco no tempo...

Em 1815, deu-se a fundação da Loja Maçônica Comércio e Artes (ainda não havia Potência Maçônica, apenas uma Loja).

Esta Loja, fundada por Maçons comprometidos com a causa de nossa Independência, funcionou até 1818, portanto 3 anos, quando foi fechada por lei imperial que proibia o funcionamento de sociedades secretas no país. Mas restabeleceu-se, reerguendo suas colunas em 1821, com o nome de Comércio e Artes na Idade do Ouro.

Um ano depois (1822), a Loja cresceu tanto que houve o seu desdobramento em 3 Lojas distintas: Comércio e Artes, Esperança de Nichteroy, União e Tranqüilidade. Os Irmãos foram distribuídos entre as 3 Lojas por sorteio. E nesse mesmo dia elas se reuniram, se agregaram numa Federação, numa Potência Maçônica denominada Grande Oriente do Brasil. Isso aconteceu no dia 17 de junho de 1822... e esta data é considerada a data oficial de fundação do GOB.

Nestas três Lojas, conforme as Atas que chegaram até nós, só seriam iniciadas pessoas comprometidas com o ideal da Independência do Brasil... E sua ação foi tão eficaz que, nesse mesmo ano, três meses depois, ouviu-se, nas Margens do Riacho do Ipiranga, o brado de "Independência ou Morte"...

Mas isso já é outra história.


junho 16, 2021

OS TRÊS PONTINHOS



Fonte: Obreiros do Irajá, publicado no Grupo G10 - Mestre Maçom 

Três Pontos; triângulo; é símbolo com várias interpretações, aliás, conciliáveis: luz, trevas e tempo; passado, presente e futuro; sabedoria, força e beleza; nascimento, vida e morte; liberdade, igualdade e fraternidade.

Muitos não iniciados (que se convencionou chamar de profanos) ficam intrigados com as abreviaturas encontradas nos escritos da Maçonaria, as quais consistem em substituir parte das palavras nos textos por três pontos. Ao contrário do que muitos imaginam os Três Pontos dispostos em triângulo, usados pelos Maçons em seus documentos e impressos, não são um símbolo.

São um sinal gráfico adotado em abreviaturas e no final do “ne varietur”;  no primeiro caso identificam as abreviaturas de termos Maçônicos, e, no segundo, servem como forma de identificação do maçom.

Embora, no início, os três pontos fossem apenas sinais de abreviaturas, não demorou muito a se transformar em símbolo, ao qual foram dadas as mais variadas interpretações.

Não somente para os não maçons, mas também, para muitos iniciados na Sublime Ordem, os Três Pontos indiciam a ideia subjetiva de segredo, expressa através do número três, algarismo muitíssimo ligado à simbologia e hermenêutica maçônicas. Sua origem, na verdade, está nas abreviaturas, tradição antiquíssima que a Arte Real trouxe para o seu seio e que se mantém até os dias de hoje.

Não obstante, os Três Pontos foram relacionados com os inúmeros símbolos Maçônicos e que acabaram tendo interpretações esotéricas e simbólicas, culminado com o uso nas assinaturas dos Maçons.

Entretanto, essa prática de apor os três pontos na assinatura não é de uso universal, como por exemplo, a Maçonaria inglesa que não adotou. Seu uso, porém, estendeu-se, gradativamente, nos Estados Unidos. À medida que entrava em uso geral nas Potências Latinas.  Como todas as coisas ligadas à Maçonaria, não faltaram aos Três Pontos exegetas e hermeneutas para dar os mais variados significados.

De acordo com várias citações que foram feitas através dos tempos podemos observar as mais variadas colocações, onde os três pontos se tornaram ainda mais importantes dentro do conceito maçônico. Os três pontos, na posição de vértices de um triângulo equilátero, podem constituir o símbolo da divisa maçônica, que é a Liberdade, Igualdade e Fraternidade e para muitos outros simbolizam o Passado, o Presente e o Futuro.

O exemplo do triângulo, uma das mais simples figuras geométrica que tornou a sua representação gráfica uma ideia ternária à qual foram ligados, os Três pontos, igualmente, tem a sua figura assimilada á várias significados: Liberdade, Igualdade e Fraternidade; Vontade, Amor e Sabedoria; Fé Esperança e Caridade; Espírito, Alma e Corpo; Passado, Presente e Futuro;  e outros.

De acordo com indicações do Rito Escocês, os três pontos devem estar em esquadro nos ângulos, sendo um no ângulo oriente meio-dia, outro no ângulo ocidente meio-dia e o terceiro no ângulo ocidente setentrião, formando assim também o simbolismo dos três pilares da loja, Sabedoria, Força e Beleza.

Para Oswald Wirth, os três pontos representam a Tese, a Antítese e a Síntese, isto é a ideia que se defende, a oposição que lhe é feita e a harmonia das idéias opostas.

Em nossas atividades normais, isto é, fora da maçonaria, o uso de abreviaturas está bem codificado e não prejudica em nada o seu  emprego. Ao contrário: Há certas palavras e expressões, convencionalmente representadas pelas respectivas letras iniciais, ou por essas iniciais seguidas de outras letras, cujo conhecimento oferece enorme utilidade.

Abreviaturas não são novidades. Desde a Antiguidade, gregos e romanos já delas se utilizavam.  Elas chegaram a ser proibidas, como em Roma, no tempo de Justiniano I (483-565), por gerarem confusão. O mesmo ocorreu na França da Idade Média, e, em 1304, o Rei Felipe, o Belo, interditou o seu uso nas atas jurídicas. É visto, por exemplo, nos objetos celtas do Século IX a.C e muito antes nas cerâmicas egípcias, cretas e gregas. Os Três Pontos têm, pois, origem bem antiga. Costuma-se relacionar os Três Pontos, dispostos em triângulo, como uma das expressões comuns da luz interior e do espírito que presidiu à criação do mundo.

Afirma-se que a abreviatura com Três Pontos foi utilizada na maçonaria, pela primeira vez, em 12 de Agosto de 1774, quando o Grande Oriente da França comunicou o novo endereço á todas as duas Lojas jurisdicionadas.

Há, contudo, outras versões, como que o início da utilização do Triponto deu-se em 1764, na Loja Besaçon, também na França, e a de que teria surgido com o companheirismo, por representar o triângulo. E há até que declare, categoricamente, que o seu uso vem da arte hieroglífica dos egípcios.

Naturalmente, para cada versão existem os seus contestadores. Alguns autores apontam que os Templários faziam uso dos Três pontos, e, que no calabouço, onde Jacques de Molay esteve preso durante oito anos, nas paredes havia grafitos e um deles era o Triponto.

As abreviaturas, usualmente, empregadas na Maçonaria são do tipo “por suspensão”  ou “apócope” que consiste em suprimir letras ou sílabas no final da palavra que se quer abreviar.

A abreviação tripontada nem sempre é disposta na forma de um triângulo que repousa sobre sua base, pode ser encontrada sob outras formas e podemos dizer com bastante certeza que a abreviação maçônica dos três pontos nos vem da arte hieroglífica egípcia, onde era praticada.

Por regra, essas abreviaturas só deveriam ser usadas nas palavras de vocabulário Maçônico e jamais para as palavras profanas. A má aplicação das abreviaturas chega a provocar textos incompreensíveis até em rituais, o que prejudica, sobremaneira, a sua leitura e entendimento.

Não há uma regra quanto à disposição dos Três Pontos, um em relação aos outros. As disposições encontradas são das mais variadas, tanto no formato do triângulo delata (eqüilátero), como nos formatos isósceles e retângulos em diversas posições, aparecendo, até como sinal de reticências…

Quanto ao uso em si, é costume empregar abreviaturas nas palavras suprimindo-lhes alguma ou algumas das letras finais e conservando as que forem necessárias para a leitura fácil e de boa compreensão do sentido da frase.

,

A TAÇA SAGRADA - Sergio Quirino

 


Sérgio Quirino é o Grão-Mestre Eleito da GLMMG 2021/2024

Saudações, estimado Irmão! QUE A DOÇURA DO MEL SE CONVERTA EM AMARGOR

A vida é uma grande Taça Sagrada, que nos é apresentada ao primeiro choro e a esgotamos junto ao ultimo suspiro

O que ha em seu conteúdo é resultado da alquimia de pensamentos, sentimentos e ações a nos permear a todo instante. O Hedonismo, traduzido de forma radical, que compreende a doutrina moral de estar no prazer o único bem possível, pode nos conduzir polos perigosos caminhos da doçura.

Não seria natural, até mesmo digno, aspirarmos a uma "doce vida"? Naturalmente, mas pode, de fato, se transformar em uma doce ilusão.

Simbolicamente, a vida material é composta por quatro elementos Há ainda quatro ditos populares que nos alertam contra este equivoco:

"A coragem do bombeiro e forjada no fogo" "Um mar tranquilo não forma marinheiros habilidosos" "São as terras altas que fortalecem as pemas do viajante". "Não são as brisas que inflam as velas dos navios".

O cerne desta reflexão não está na doçura ou no amargor, mas na conversão de um para o outro.

Três coisas conservam nossa integridade: Silêncio - Coragem - Compromisso

Três coisas envenenam nossa dignidade: Curiosidade-Mentira-Traição

O destino não é um tempo no futuro distante, mas no imediato próximo segundo. É algo tão presente, que temos E laços de Irmandade, mas somos conduzidos pelo Irmão Terrível.

Ele apenas nos apresenta a Taça Sagrada, mas são nossas mãos que a conduzem. Quantas vezes nos deliciamos com a doçura, e quantas outras alteramos nosso semblante diante da amargura que nós mesmos ingerimos?

O envenenamento causado por ausência de reflexão sempre sera prejudicial e, muitas vezes, não temos tempo para recuar ou recuperar o perdido.

A analogia da vida como uma taça e a do viver como um solver representa e resulta na boa e na má sorte A sorte não tratada como uma força dirigida a um rumo, mas, o modo como chegamos ao destino.

OS PRAZERES DA VIDA SÃO AS DOCURAS. MAS, É FUNDAMENTAL GOZÁ-LAS VIRTUOSAMENTE E PROCURAR INCESSANTEMENTE COMPARTILHA-LAS.

ESTEJAMOS CONSCIENTES DE QUE TEMOS DE ESGOTAR O AMARGOR DO FEL DOS VICIOS QUE ABASTECE NOSSA TAÇA SAGRADA; E SOMENTE O FAREMOS SOLITARIAMENTE. Atingimos quinze anos de compartilhamento de instruções maçônicas. Nosso propósito fundamental é incentivar os irmãos ao estudo, à reflexão e tomar-se um elemento de atuação, legitimo Construtor Social.

Sinto muito, me perdoe, sou grato, te amo. Vamos em Frente!


,

junho 15, 2021

TRANSITANDO POR FALÁCIAS E SOFiSMAS - Newton Agrella




Newton Agrella é escritor, tradutor e palestrante. Um dos mais notáveis intelectuais da maçonaria no país. 

O cenário chama-se "argumento". 

As distorções desse argumento se caracterizam por dois expedientes que se entrelaçam e geram apreensão, inquietude e insegurança.

O primeiro é a FALÁCIA que se constitui numa espécie de mentira, que se sustenta sob uma lógica frágil e inconsistente de um conceito que se pretende provar. 

Via de regra, por meio da persuasão com o claro propósito de convencimento.

O segundo expediente é o SOFISMA cuja essência é uma mentira, propositalmente disfarçada e maquiada por argumentos consistentes e verdadeiros, para que possa parecer real.

Nos estudos da lógica, a FALÁCIA é um erro de raciocínio ou argumentação, mas que parece estar correto. ...

Por outro lado o SOFISMA é um engano, um argumento inválido, uma ideia equivocada ou ainda, uma crença falsa.   

Em resumo, um processo de argumentação é uma forma de convencer da verdade de modo legítimo e correto. 

No entanto, existem formas de convencimento a partir de argumentações incorretas ou ilegítimas. 

Tais formas nos convencem, mas não necessariamente da verdade e recebem o nome de Falácias ou Sofismas, dependendo das circunstâncias em que se prevalecem.

Caso fôssemos  transitar pelo universo jurídico da matéria caberia deixar no ar a seguinte interrogação:

A culpa ou o dolo seriam respectivamente atinentes à Falácia ou ao Sofisma ?



DE BACH A CARLYLE - FILOSOFIA, MÚSICA E FILOLOGIA PARA SALVAR O DIA

Antonio Pessotti é músico, doutor pela Universidade de Campinas (Unicamp), pesquisador colaborador do Laboratório de Fonética e Psicolinguística (IEL – Unicamp) e professor de Canto e História da Música na Escola de Música Maestro Ernst Mahle (EMPEM).


Nas aulas de latim, sempre surgem frases que levam a refletir para muito além das relações sobre a origem da nossa língua, “inculta e bela”. Foi o que aconteceu recentemente quando topei com a frase “Mens in corpore tantum molem regit”.

O latim não é difícil para quem se propõe a estudá-lo, ainda mais se encararmos as estruturas com o olhar da análise sintática. A frase na qual meditei tem vários pontos chave: “molem”, acusativo singular, funciona como objeto direto de “regit”, terceira pessoa do singular, presente do indicativo do verbo “regere”, de reger, dirigir, cujo sujeito é “mens”, substantivo feminino significando “mente, espírito”. “Tantum”, funciona como advérbio, modificando o verbo “regit” que pode significar: tanto, só, somente. “In corpore”, no corpo, é ablativo de “corpus, corporis”, substantivo neutro da terceira declinação.

Enfim, o espírito é que dirige todo o corpo. Parece frase pronta, mas não é com elas que aprendemos muito sobre nós mesmos há séculos, num eterno “Conhece-te a ti mesmo”? As Artes mostram isso durante séculos, principalmente quando nos deparamos com aquela expressão que mais tocou a humanidade ocidental, o Barroco. Tamanha Arte, com expressões na arquitetura, artes visuais, música, pintura, literatura, dominou o cenário artístico ocidental até o século XVII, com primeiras manifestações na Itália datando das últimas décadas do século XVI, enquanto em algumas regiões, notadamente na Alemanha e na América do Sul colonial, certas conquistas culminantes do Barroco não ocorreram até o séc. XVIII. Como sempre, não é só vacina que chega atrasada por aqui.

A obra que distingue o período barroco é estilisticamente complexa, até contraditória. O desejo de evocar estados emocionais apelando para os sentidos, muitas vezes de maneiras dramáticas, fundamenta suas manifestações, com toques de grandeza, riqueza sensual, drama, vitalidade, movimento, tensão, exuberância emocional e uma tendência a confundir as distinções entre as várias artes. Tamanho turbilhão de informações pode evocar a centralidade do ser humano em si, como a lenda grega.

Ovídio narra a lenda de Narciso ou “O Auto admirador” (em grego clássico: Νάρκισσος), na mitologia grega e com equivalente romano Valentim, era um herói do território de Téspias, Beócia, famoso por sua beleza e orgulho. Considerado filho do deus Cefiso e da ninfa Liríope, teria o adivinho Tirésias, no dia do seu nascimento, profetizado ao estilo de Pã que a criança teria vida longa desde que jamais contemplasse a própria figura. Narciso cresceu, e se transformou um jovem bonito de Beócia, que despertava amor em todos, independente do gênero. Orgulhoso e arrogante, até as ninfas se apaixonaram por ele, incluindo Eco, que o amava incondicionalmente, mesmo  menosprezada. Com isso, as moças desprezadas pediram aos deuses para vingá-las, e conjuraram o lado sombrio de Afrodite, Nêmesis, que o condenou a apaixonar-se pelo seu próprio reflexo na lagoa de Eco. Encantado pela sua própria beleza, Narciso deitou-se no banco do rio e definhou, olhando-se na água e se embelezando. Depois da sua morte, Afrodite o transformou numa flor, Narciso.

Pausânias (c. 115 – 180 AC), conhecido geógrafo e viajante grego, localiza a fonte de Narciso na cama juntos em Donacon, no território dos Téspios. O autor cita uma variante menos conhecida da história, na qual Narciso tinha uma irmã gêmea, tão idêntica que ambos se vestiam da mesma forma além de caçarem juntos. Narciso, apaixonado por ela, consumiu-se de desgosto após a morte da irmã, e fingiu que o reflexo que via na água era dela. Lá ficou até a morte, e, onde o seu corpo se encontrava, apenas restou uma flor: o narciso. O mesmo autor conta outra história sobre o uso da flor narciso, que fora criada para atrair Perséfone, filha de Deméter, para longe das suas companheiras e permitir que Hades a raptasse.

É preciso introduzir essa lenda para entrar no conceito de narcisismo, cuja derivação fornece outra palavra: narke (“entorpecido”), de onde também vem a palavra narcótico. Assim, para os gregos, Narciso simbolizava a vaidade e a insensibilidade, visto que ele era emocionalmente entorpecido às solicitações daqueles que se apaixonaram pela sua beleza. O mito não simboliza apenas um aspecto de negacionismo: o mito representa não só para os gregos o drama da individualidade, antes, a profundidade de um indivíduo que toma consciência de si mesmo, em si mesmo, e perante a si mesmo, ou seja, no lugar onde experimenta os seus dramas humanos. Seria uma porta para a auto-construção?

Bobbie Carlyle esculpiu algo que vai além da arte, quase um Barroco Pós-Moderno. A sua obra Self Made Man”, representando o homem que se esculpe e seu futuro a partir da pedra em bruto da qual ele emerge, retrata a ousadia de um Michelangelo “art nouveau” em bronze que poderiam bem ser representadas pela frase bem piracicabana: “Audax in intellectu et in labore”. Vamos considerar, essa obra traz um forte elemento psicológico por lidar com o espectro completo e a complexidade da emoção, as lutas e os triunfos da vida.

A escultura provoca reflexão, que é uma das funções da arte, fazer pensar sobre nós mesmos. Lapidar é talhar, polir, aprimorar, retirar arestas, processo que provoca dor em nós e em outros. Quantas vezes, no decurso da vida, perdemos pedaços de nós mesmos quando perdemos algo ou alguém querido, quando as coisas não saem como desejamos ou planejamos, quando não passamos nos concursos almejados, quando o(a) namorado(a) nos deixa, quando nos separamos de amigos queridos, quando mudamos de casa, quando a esperança parece acabar…

Lapidar sem dor, não existe, pois, é intrínseca ao ato de se esculpir. A escultura mostra o uso de martelo e cinzel, ferramentas que lascam o bronze, com batidas fortes e frequentes, nem muito leve e sem força, senão não há aprimoramento interno, provocando muitas vezes a frustração. Rubem Alves já dizia que chegara aonde chegou por uma sequência de erros, aprendendo muito com o que dá errado, ou não sai como o esperado, se assim desejarmos.

Há um fim para esse processo? Sim, a Morte. Mas, não é o fim de si, em si, antes, a admissão que tudo tem um fim que nos motiva a um novo início, nova normalidade a educar a criança, o adolescente, o adulto, enfim, como escreveu Caetano:

“Quando eu te encarei frente a frente não vi o meu rosto
Chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto, mau gosto
É que Narciso acha feio o que não é espelho
E à mente apavora o que ainda não é mesmo velho
Nada do que não era antes quando não somos mutantes
E foste um difícil começo
Afasto o que não conheço
E quem vende outro sonho feliz de cidade
Aprende depressa a chamar-te de realidade
Porque és o avesso do avesso do avesso do avesso”

Reforço, ouçamos Bach e o Salmo 91:


1 Você que habita ao amparo do Altíssimo,

e vive à sombra do Onipotente,

2 diga ao Senhor: “Meu refúgio, minha fortaleza,

meu Deus, eu confio em ti!”

3 Ele livrará você do laço do caçador,

e da peste destruidora.

5 Você não temerá o terror da noite,

nem a flecha que voa de dia,

6 nem a epidemia que caminha nas trevas,

nem a peste que devasta ao meio-dia.

7 Caiam mil ao seu lado

e dez mil à sua direita,

a você nada atingirá.

É isso!                                                                                                                                                                                Antonio Pessotti é músico, doutor pela Universidade de Campinas (Unicamp), pesquisador colaborador do Laboratório de Fonética e Psicolinguística (IEL – Unicamp) e professor de Canto e História da Música na Escola de Música Maestro Ernst Mahle (EMPEM).

junho 14, 2021

UMA FÁBULA DE PEDREIROS LIVRES - Laquito Leâes



Era 12h em ponto e o sol estava a pino quando mandou os obreiros ao trabalho, o irmão 2° Vig., e a grande obra banhava mais um dia de suor e labor daqueles valorosos e dedicados obreiros. 

Como de costume o canteiro estava impecável a peça terminada rapidamente se recolhia ao seu lugar e dava lugar a outro trabalho e de tão dinâmico se dava o movimento, foi fácil para alguns perceberem um jovem irmão que destoava dos demais por estar impavidamente imóvel defronte a uma pedra milimetricamente esquadrejada e de tal forma polida que como um espelho este podia avistar a todos os que estavam ao seu redor, apenas no fitar de suas quatro faces.

Envolvidos em suas atividades individuais, muitos soa irmãos se quer lhe davam atenção, porém do oriente ele estava sendo observado, extasiado com aquela construção, estático, como quem espera os louros de uma grande conquista.

Percebendo isso, muito dos mestres o ignoravam, não lhe daremos atenção, dizia um mestre a outro, para que não fique cheio de si, sussurravam. 

Mas um dos irmãos, o mais sábio por sinal, portando um livro aberto sobre um fundo radiante foi ter com este irmão companheiro.

Boa tarde meu querido irmão, mas que bela obra tens aí!

Ao que lhe respondeu o jovem companheiro:

E não o é! Poucas vi iguais, com tamanha precisão e tão perfeito esquadrejamento. Acho até que deveria ser exposta como exemplo, para todos pudessem ver que beleza é esta obra.

Sem duvida, concordou o Orador, e acrescento, uma construção tão bela precisa ser imortalizada, pois a que outra pedra restaria á honra de ser a base, no ângulo Nordeste de tão promissora construção que erigimos aqui?

Logo aquela conversa suscitaria a atenção de outros irmãos, pois afinal, não era todo dia que a sabedoria do irmão orador estava ao alcance de todos no ocidente.

Por fim acabaram-se amontoando vários irmãos para admirar aquela cena e muitos se deram conta daquele trabalho justo e perfeito, que por tanto tempo, apenas aquele companheiro olhava e observava.

Muito feliz por tanta atenção conquistada, disse aquele jovem irmão.

Perfeitas as suas palavras meu sábio irmão orador, e a propósito, visto que tão perfeita obra produzi, já é tempo de ser reconhecido meu valor meu valor nesta oficina, inclusive, desafio-os a encontrar alguém que obra tão bela quanto esta tenha esquadrejado, e como é certeza não encontrarás, exijo por tê-la feito, meu aumento de salário.

O irmão orador, sem que sequer tremesse seu semblante, assentiu com a cabeça, neste momento já observado por toda a loja que simplesmente parou, serenamente lhe respondeu.

Mais uma vez tendes razão, e todos os fitaram com surpresa, porém ele continuou, e acerto está o seu desafio, adverti-lo-ei. Entretanto, que uma obra não pode ser considerada completa e perfeita, apenas ao olharmos sua casca, pois assim como a romã é sustentada internamente por suas sementes, a retidão e a justiça somente serão sustentadas por fortes princípios internos, que não se podem ver a olho nu. Mas veremos ao nosso redor.

Com tantos irmãos olhando o que vinha acontecendo, poucos ainda estavam trabalhando, porém ao olhar no topo da coluna nordeste, lá estava um pequeno aprendiz, com uma pedra tão perfeita quanto à do companheiro, e que por tão concentrado em seu trabalho, sequer levantou a cabeça quando aquela turba foi ao seu encontro.

Ao perceber enfim o Orador a sua esquerda e o companheiro á direita o aprendiz os reverenciou e feliz por sua presença lhes recepcionou.

A que devo tanta honra meus irmãos virem observar-me no trabalho?

Ao que o companheiro sem sequer lhe responder já começara a medir a pedra do aprendiz como que a procurar alguma imperfeição, enquanto este conversava como o irmão Orador. Que bela obra tens ai irmão aprendiz, ao que lhe respondeu:

Trabalho nela há muito tempo meu irmão e sempre que me deixo pensar que está completa, procuro e encontro alguma imperfeição começando novamente o trabalho alegremente, pois não é o fim que procuro, mas um eterno recomeço. 

Sem ouvir-lhe como deveria, o companheiro diz, pois então, acho que não deves mais se preocupar com isso, pois inspecionei sua obra e, é claro que não está tão boa quanto a minha, mas está quase perfeita, acho até que deves exigir também aumento de salário, e permito-lhe até que ponha tua pedra logo acima da minha, como base no ângulo Nordeste da obra que sobre elas será levantada, mas o nome. Insisto que seja posto somente na minha, pois venci o desafio.

Fitando-lhe com feição de dúvida, olha-lhe com ternura ao irmão aprendiz.

Meu irmão companheiro, com todo o respeito não entendo, como posso eu vangloriar-me desta obra se não fui quem a construiu.

Mas como, se vejo teu avental assim como toda a tua vestimenta lavada em pó de pedra e tu mesmo disseste que há tempos vem trabalhando nesta obra? Questiona-lhe enfaticamente o companheiro.

E não é isso por fim que viemos fazer aqui? Interrompe-o educadamente o Orador, ou julgas que gastamos em vão nossas forças?

Ao ouvi-lo pacientemente, pede a palavra ao irmão aprendiz..

Entendo a dúvida do nosso irmão companheiro, porém, ainda assim, não me sinto proprietário de tal obra apenas por que trabalhei nela, e estendendo em suas mãos o maço e o cinzel disse, sinto-me por fim nesta construção como estas ferramentas, que nas mãos de Deus, dão forma ao que o GADU projetou para minha vida e para vida daqueles ao meu redor residem.

E completou como poderia eu roubar a glória do Grande Arquiteto, pois se for de sua vontade sequer levanto de minha cama pela manhã, sequer respiro o ar que a todos é facultado gratuitamente. 

Mas como o coração endurecido o companheiro pôs-se a exigir a promessa do Orador e um grande brado se fez ouvir do trono de Salomão.

Fazei cumprir o que foi prometido ao irmão companheiro – Era a voz do Venerável Mestre – porém é minha a honra de escrever o que lhe cabe em sua pedra.

Feliz que não cabia em si, o companheiro viu sua pedra ser posta no topo da coluna Nordeste e várias pedras serem colocadas sobre ela, e quanto mais pedras eram colocadas mais ele vibrava, porém, começou-se a perceber um problema. Por mais que os mestres tentassem, mais ele vibrava, porém, começou-se a perceber um problema. Por mais que os mestres tentassem, não se conseguia manter estrutura firme e a beleza daquela obra não se sustentava, até que pararam de construí-la, pois material estava sendo gasto e nada dava certo.

Indignado com o que ocorrer, o irmão companheiro acompanhado do Orador e do irmão arquiteto foram vistoriar a construção.

Só podem estar querendo me boicotar, disse o irmão companheiro, como pode uma pedra tão perfeita ser base para uma construção tão imperfeita?

Sem nada dizer, os irmãos orador e arquiteto se puseram a esperar, aguardando que algo fosse percebido pelo companheiro e em verdade, o foi.

Ao olhar com a devida atenção, o irmão companheiro percebeu que o V.’.M.’. não havia escrito seu nome na pedra, MS havia gravado uma palavra, lá estava escrito VAIDADE.

Então ele tudo entendeu, e chorando, tornou-se para o irmão aprendiz e pediu-lhe desculpas. Com os olhos também marejados o irmão Orador lhe deu um abraço e antes que ele também se desculpasse com ele, deu suas considerações.

A mais bela obra sustentada sobre a vaidade é oca e sem destino, morre em si mesma e mata tudo que se aproxima dela. Acrescentando que a vaidade é oca e sem destino, morre em si mesma e mata tudo que se aproxima dela.

Acrescento que a vaidade é o pior dos vícios, pois é inimiga da inteligência visto que o vaidoso acha que já não tem mais nada a aprender, relegado ao ostracismo e a solidão, pois por se achar tão melhor que todos, se isola no próprio ego. A vaidade já destruiu impérios, e até universos, pois quando uma loja morre por vaidades, é um conjunto de galáxias que se perde, concluiu o orador.

O V.M. ao ver que ainda não tinha conseguido se recuperar da lição que havia aprendido, se dirigiu ao companheiro em suas palavras finais.

Anima-te irmão companheiro, pois agora é à hora de aprender, tenho certeza que a partir desta lição, serás, no tempo certo, um mestre mais preparado, do que teria sido se por tudo isso não tivesses passado, e acrescentou, de toda obra de tuas mãos, dá graças ao Grande Arquiteto, pois é dele que vem o que querer e o realizar, agradecendo, sobretudo, por estares aqui e por seres maço e cinzel em suas mãos, a construir um novo mundo, que a partir de hoje tem uma pedra mais desbastada, que é você, a fazer parte desta construção.

Que horas são irmão 1° Vig. Bradou do trono de Salomão, meia noite em ponto, respondeu-lhe o irmão 1°Vig.

E mais um dia de trabalho se passou naquela oficina, com a certeza de que os trabalhos transcorreram J.’. e P.’., e mais um pequeno passo se deu para evolução do Gênero humano, pois afinal, o que viemos fazer aqui?

"Uma mente que se abre a uma nova ideia, nunca mais torna ao seu tamanho original." 

 Albert Einstein.


Laquito Leães, publicado no Grupo G2 - Companheiros Maçons 

RAÍZES GREGAS DO PORTUGUÊS - do Facebook



 Listas das principais palavras gregas que foram incorporadas na Língua Portuguesa por Leonardo Jardim Andrad

Falamos grego a todo instante inconscientemente sem saber que estamos falando tal idioma.

Por isto, para compreender melhor nossa língua nativa precisamos recorrer aos radicais gregos e observar seus significados e semelhanças.

Muitas palavras para nós desconhecidas farão maior sentido apenas quando consultadas na sua etimologia, ou seja, na sua origem. 

Vejam a lista abaixo:


ALGUMAS PALAVRAS GREGAS

Acros – alto       (acrópole, acrobacia)

Aér, aéreo – ar   (aeródromo, aeronáutica, aeromoça)

Agogós – o que conduz   (pedagogo, demagogo)

Agón – luta               (agonia, antagonista)

Agros – campo         (agrônomo, agronomia)

Ántropos – homem   (antropófago, antropologia)

Archáios – antigo     (arcaico, arqueologia)

Arché – comando, governo, principal (anarquia, monarca)

Áristos – o melhor   (aristocracia, aristocrata)

Astér, astéros – astro (asteróide, astronomia)

Autós – próprio (automóvel – que se move por si próprio, autonomia – que tem leis próprias)

Báros – peso, pressão (barômetro, barostato)

Biblíon – livro (biblioteca , bibliografia)

Bíblia – livros (Livro Sagrado)

Bíos – vida (biologia – estudo da vida, biografia – vida escrita)

Cheirós – mão (cirurgia, cirurgião)

Chrónos – tempo (cronômetro – tempo cronológico)

Chrýsos – ouro (crisóstomo, crisântemo – flor)

Dáktylos – dedo (datilografia – escrita com o dedo, datilografar – escrever com o dedo)

Déka – dez (decálogo – dez mandamentos, decâmetro)

Démos – povo (democracia – governo do povo, demografia – escrita sobre o povo)

Dérma, dérmatos – pele (dermatologia – estudo da pele, epiderme)

Dóxa – opinião, doutrina (ortodoxo, paradoxo)

Drómos – corrida (autódromo – local de corrida de carros, hipódromo)

Dýnamis – força, potência (dínamo, dinamite)

Élektron – âmbar, eletricidade (elétrico, eletrônica)

Énteron – intestino (enterite, enterologia – estudo do intestino)

Éthnos – povo, raça (étnico, etnografia – escrita das raças)

Étymos – verdadeiro (etimologia, etimológico)

Gámos –casamento (poligamia, monografia)

Gastér, gastrós – estômago (gastrite, gastrônomo

Géo – terra – (geografia – escrita da terra, geologia – estudo da terra)

Glóssa – língua (poliglota – que fala mais que uma língua, glossário)

Gonía – ângulo (goniômetro, polígono)

Grámma – letra, escrito (grafia, ortografia)

Gymnós – nu (ginástica)

Gyné ou gynaikós – mulher (ginecologia – estudo sobre a mulher)

Háimatos – sangue (hematófago, anemia)

Hélios – sol (heliocêntrico – o sol no centro)

Hépar  ou hépatos – fígado (hepático, hepatite – doença do fígado)

Héteros – outro, diferente (heterogênio, heterônimo, heterossexual  que tem atração sexual pelo sexo oposto)

Hexa – seis (hexacampeão – seis vezes campeão, hexágono – seis lados)

Hierós – sagrado (hierarquia, hierático)

Híppos – cavalo (hipódromo, hipismo)

Hodós – caminho (hodômetro, êxodo)

Hómoios – semelhante, igual (homeopatia, homeopata)

Hómos – semelhante, igual (homogêneo, homossexual – que tem atração sexual pelo mesmo sexo)

Hýdro – água         (hidratar, hidrografia)

Hýpnos – sono      (hipnose, hipnotizar)

Iatréia – tratamento médico   (pediatria, psiquiatria)

Icon – imagem   (iconoclasta, iconografia)

Ídios – próprio     (idioma, idiotismo)

Ísos – semelhante, igual   (isósceles, isotérmico)

Kakós – mau          (cacofonia, cacografia)

Kalli ou kalós – belo    (caligrafia – escrita bela)

Kardía – coração    (cardíaco – que tem doença no coração, cardiologia – que estuda o coração)

Kephalé – cabeça (cefalalgia, acéfalo)

Kínema ou kinématos cinema (cinematógrafo)

Kósmos – mundo    (cosmografia – escrita da terra, cosmopolita)

Krátos – poder, domínio, força    (aristocracia, aristocrata)

Kýon ou kynós – cão   (cínico, cinegética)

Kýstis – bexiga     (cistite, cistoscopia)

Latréia – culto, adoração   (idolatria, idólatra)

Leukós – branco   (leucócitos, leucemia)

Lógos – palavra, discurso, declaração, afirmação

Makrós – longo, grande   (macróbio, macrobiótica)

Manía – loucura, inclinação    (cleptomania, manicômio)

Mancia – adivinhação      (cartomancia)

Mégas – grande     (megalomania, megaton)

Méter ou metrós – mãe   (metrópole, metropolitano)

Métron – medida         (métrico, quilômetro)

Mikrós – pequeno     (micróbio, microscópio)

Mísos - ódio       (misógino, misógamo)

Monos – um só, sozinho     (monólogo, monoteísta)

Morphé – forma    (morfologia, metamorfose)

Nekrós – morto, cadáver      (necrotério, necropsia)

Néos – novo         (neologismo, neolatino)

Néuron – nervo      (neurologia, nevralgia)

Nómos – lei, norma, costume   (autônomo – quem tem leis próprias,  anomalia)

Nósos – doença, moléstia     (zoonose)

Odóntos – dente        (odontologia – estudo dos dentes, odontologista – médico dos dentes)

Olígos – pouco    (oligarquia)

Ónoma ou ónyma – nome   (pseudônimo, antônimo)

Ophthalmós – olho (oftalmologia – estudo dos olhos, oftalmologista – médico dos olhos)

Óps ou opôs – vista    (óptica – loja de óculos, miopia – doença dos olhos, míope – doente dos olhos)

Orthós – reto, correto   (ortografia, ortopedista)

Ous ou otós – ouvido     (otite, otorrino)

Paidós – criança   (pedagogia, pediatra – médico da criança)

Paidéia – educação, correção  (ortopedia, enciclopédia)

Pan ou pantós – tudo, todo    (panorama, (panteísmo – crença que defende que tudo é deus)

Páthos – doença, sentimento    (patologia, simpatia)

Penta ou pente – cinco   pentacampeão (cinco vezes campeão), (pentágono – cinco lados)

Phílos – amigo    (filosofia, filantropia)

Phóbos – medo, aversão     (hidrofobia – medo da água) xenofobia)

Phoné – voz, som     (telefone, cacofonia, afônico)

Photós – luz     (fotografia, fósforo)

Pnéuma ou pnéumatos – ar, sopro, respiração, vento, Espírito         (pneu, pneumática)

Pnéumon – pulmão     (pneumonia  – doença do pulmão) (pneumologia – estudo do pulmão) (pneumologista – médico do pulmão)

Polis – cidade           (polícia, política, metrópole)

Pótamos – rio        (hipopótamo)

Pséudos – mentira, falsidade     (pseudônimo)

Psyché – alma          (psicologia, psicose)

Pterón – asa              (helicóptero)

Pyrós – fogo          (pirotécnico)

Rhéo – fluir, correr         (reumatismo, diarréia)

Seismós – tremor, abalo      (sismógrafo, sísmico)

Skopéo – ver, olhar     (telescópio, microscópio)

Sóma ou sómatos – corpo  (somatologia, somático)

Sophós – sábio               (filósofo, filosofia)

Stóma ou stómatos – boca  (estomatite, estomático)

Táxis – arranjo, classificação        (sintaxe)

Téchne – arte, ofício     (tecnologia, politécnica)

Téle – longe      (televisão, telefone)

Théke – caixa           (biblioteca, discoteca)

Theós – deus   (teologia – estudo sobre Deus)  teólogo

Therapéia – tratamento   (hidroterapia – tratamento com água)

Thermós – quente      (térmico, termômetro)

Tópos – lugar         (topônimo, topografia)

Tráuma – ferimento        (traumatismo)

Týpos – tipo, marca, modelo      (tipografia)

Zóon – animal        (zoologia, zoológico)


junho 13, 2021

CATRACA LIVRE - Newton Agrella



Newton Agrella é escritor, tradutor e palestrante. Um dos maiores especialistas em Maçonaria do Brasil.


De repente nos damos conta de que ser espectador é uma excelente oportunidade para olhar a vida como relevantes passageiros da história.

É a chance de percebermos  como as coisas acontecem e de que forma podemos aprender ou desaprender seus significados.

O papel de espectador nos faculta exercer o direito das escolhas com mais esmero e a avaliar o peso e as medidas das ações, bem como de rever conceitos que trazemos arraigados dentro de nós, e que muitas vezes deixamos de fazê-los até por uma questão de acomodação.

Como é gostoso sentar-se junto à janela e observar que cada um, a seu modo,  segue seu próprio ritmo, obedece ao seu próprio ritual e impõe seu timbre pessoal de maneira única e singular.

Reconhecer que cada um tem o direito de entender e interpretar seu personagem ao sabor de seus critérios, de algum modo significa respeitar a individualidade humana.

O livre arbítrio se associa ao livre pensamento na medida em que o que se busca seja o bem estar comum.

A proclamação da Liberdade, como o atributo mais digno e notável das disposições da alma é o que nos torna perfeitos dentro do nosso universo de imperfeições.

Talvez a elaboração no plano de aprimoramento de nosso interior, através da prática das virtudes, seja a versão mais consistente que agregue o maio valor de nossa experiência como seres humanos.

Bem, vamos continuar aqui ao lado da janela, debruçados sobre o seu parapeito, assistindo a essa grande aventura, que não precisa de títulos, nomes ou legendas.

Basta perceber que é vida que segue, sem retoques ou vestígios.  

É simples assim.



DO ESTOICISMO - Heitor Rodrigues Freire

 

Heitor Rodrigues Freire é advogado, corretor de imóveis, ensaísta, Past GM da GLEMS e atual presidente da Santa Casa de Campo Grande.

Em artigo anterior, mencionei o estoicismo a voo de pássaro, en passant, por tratar naquela oportunidade de outro tema. Mas, na realidade, seu fundamento é tão abrangente e interessante que me vejo no dever de tratar do assunto com a profundidade que merece, pois temos muito a aprender com sua prática.

O estoicismo prega a ética da imperturbabilidade, a extirpação das paixões e a aceitação resignada do destino como marcas do homem sábio. É o triunfo da resignação, da aceitação da adversidade e da dor.

Como se vê, é um conceito que tem muito a ver com os momentos que estamos vivendo hoje.

O estoicismo foi fundado no século 3 A.C. por Zeno, um rico mercador da cidade de Cítio, no Chipre, uma ilha no Mediterrâneo. Após sobreviver a um naufrágio em que perdeu tudo o que tinha, Zeno foi parar em Atenas. Essa adversidade acabou causando uma profunda transformação em seu modo de ser. Uma vez na Grécia, Zeno conheceu as filosofias de Sócrates, Platão, Aristóteles e seus seguidores.

Ele se deu conta de que existia um mundo não material que era imprevisível e cujo controle não dependia diretamente de seus atos, diferente do mundo que ele vivenciava até então. Zeno abraçou as ideias daqueles filósofos, passou a viver uma vida simples e fundou sua própria escola de pensamento, o estoicismo.

Os primeiros estóicos criaram uma filosofia que oferecia uma visão unificada do mundo e do lugar que o homem ocupava nele. 

Trezentos anos depois, Epiteto, um ex-escravo grego que viveu na Roma de Nero, tornou-se um dos três maiores filósofos do estoicismo, a escola de pensamento que é considerada filosofia prática. Para ele, uma vida feliz e uma vida virtuosa são sinônimos. Felicidade e realização pessoal são consequências naturais de atitudes corretas.

No trecho a seguir, extraído de seu manual, Epiteto reflete sobre as paixões, e como lidar com elas.

"Os homens são perturbados não pelas coisas, mas pelas opiniões que eles têm delas. A morte, por exemplo, nada tem de terrível, senão tê-lo-ia parecido assim a Sócrates. Mas a opinião que reina em relação à morte, eis o que a faz parecer terrível a nossos olhos. Por conseguinte, quando estivermos embaraçados, perturbados ou penalizados, não o atribuamos a outrem, mas a nós próprios, isto é, às nossas próprias opiniões. Quem acusa os outros pelos próprios infortúnios revela uma total falta de educação; quem acusa a si mesmo mostra que a sua educação já começou; mas quem não acusa nem a si mesmo nem aos outros revela que sua educação está completa".

 “Um estóico é quem transforma medo em prudência, dor em transformação, erro em aprendizado e desejo em empreendimento.”

Para os estóicos, a vida não é em si uma coisa boa, é uma oportunidade. E o que importa é o que fazemos dela. Um sábio, um homem ou uma mulher, podem fazer algo útil com suas vidas, uma pessoa má ou tola pode fazer algo ruim com suas vidas. E o mesmo vale para qualquer coisa que os estóicos consideram estar fora do nosso controle, como, por exemplo, nossa saúde, nossa riqueza ou nossa reputação. Essas coisas são vantagens que a vida nos dá, mas não são intrinsecamente boas. Um homem mau pode usar sua riqueza e reputação para fazer coisas terríveis. Mas nas mãos de uma pessoa boa, essas coisas podem ser usadas com finalidades virtuosas.

Na vida de um estoico cada minuto tem seu preço; o tempo é precioso, não porque é curto e receamos que ele falte (todo minuto representa um ganho, que consiste em ter empregado racionalmente o tempo), mas porque não devemos desperdiçá-lo irrefletidamente.

Os mais célebres estóicos que viveram e divulgaram o estoicismo são Zeno, Epiteto, Sêneca e o imperador romano Marco Aurélio, que se tornou um grande difusor da filosofia, aplicando-a no seu governo de forma marcante e deixando seu testemunho por escrito na série de textos intitulada Meditações.

A escola estóica teve profunda influência na civilização greco-romana e, por consequência, no pensamento ocidental como um todo – e foi mais além. Ela está presente no cristianismo, no budismo e no pensamento de diversos filósofos, como o alemão Immanuel Kant, além de ter influenciado a técnica contemporânea de psicoterapia chamada Terapia Cognitivo-Comportamental.

O estoicismo se perpetuou no tempo e no espaço exatamente por seu fundamento básico e chega aos tempos atuais sendo divulgado por muitos filósofos e pensadores modernos, como Massimo Pigliucci, autor do livro Como Ser um Estóico: Usando a Filosofia Antiga para Viver uma Vida Moderna.

Nancy Sherman, filósofa americana que estuda a influência do pensamento estóico sobre a ética militar, escreveu: "Não espere que o mundo seja como você deseja, mas sim como ele realmente é. Dessa forma, você terá uma vida tranquila."

A filosofia estóica, aplicada no limite da sobrevivência, foi o que norteou um piloto da marinha americana, James Stockdale. Durante a guerra do Vietnã, ele foi abatido em pleno voo e ficou em cativeiro por sete anos na mão do inimigo. Em seu livro de memórias, ele conta que foi Epiteto que o inspirou a aguentar firme: "Ele me ensinou que o negócio é manter o controle sobre meu propósito moral. Na verdade, ele me ensinou que eu sou o meu propósito moral. Ele me ensinou que sou totalmente responsável por tudo o que faço e digo. E que sou eu quem decide e controla minha própria destruição e minha própria libertação”.

"Para quem vê conformismo nessas palavras, uma ressalva: eles não estão propondo que você seja passivo em relação à vida, mas que aceite as coisas que estão além do seu controle e que já aconteceram", diz o filósofo e psicoterapeuta escocês Donald Robertson.

Para fechar a influência moderna nestes tempos de tanto avanço tecnológico, não podemos deixar de citar o escritor e palestrante alemão de auto-ajuda Eckhart Tolle, cujo livro Aqui e Agora, vendeu milhões de exemplares em todo o mundo. Em seu livro : O Poder do Agora,  Eckhart Tolle, nos ensina como tomar consciência dos pensamentos e emoções que nos impedem de vivenciar plenamente o que está dentro de nós.

Ou como dizemos nós, no Paraguay, em bom guarani: “Ko’ápe ha ko’ânğa”, aqui e agora. A vida acontece aqui e agora. Não a desperdicemos.

,

junho 12, 2021

SINAIS LAPIDARIOS



 

Uma das formas de transmitir o ensino da Arte Construtiva era por meio de sinais lapidários, ou seja, as marcas gravadas na pedra. 

Por meio desses sinais, os antigos Maçons e construtores quiseram transmitir de forma eficaz uma série de conceitos e ideias relacionadas ao conhecimento da Cosmogonia, seus princípios e leis fundamentais, corporificados em formas geométricas.

Na realidade, todos os signos lapidários se resumem a alguns esquemas fundamentais: o círculo, a linha (eixo), a espiral, o quadrado, o triângulo e a cruz. 

A partir deles todos os outros sinais são gerados e também o design das ferramentas que foram usadas para a construção: maço, cinzel, fio de prumo, nível, quadrado, espátula, compasso, etc., e todos juntos formam um código ou linguagem simbólica que o constituem.

De Bizâncio à Irlanda, os Maçons construtores deixaram sua assinatura pessoal na pedra na forma de sinais lapidares (...). Esta assinatura constituiu, em suma, a imagem reduzida de uma planta construída no seu círculo diretor, sendo esta 'arte da geometria', uma das sete Artes Liberais, ensinada nas universidades monásticas e a partir da qual se construiu a Metafísica. 

Ao registrar seu sinal, o "Irmão" não 'justificou' apenas sua identidade, mas sua qualidade e conhecimentos.

Por outro lado, o próprio fato de gravar os signos na pedra era considerado um rito, talvez pelo próprio fato de este, o rito, nada mais ser do que o símbolo em ação, ou seja, o mesmo contorno simbólico é, por sua vez, a fixação de um gesto ritual. Precisamente, a origem desse gesto está no próprio ato do Grande Arquiteto criando o cosmos, então a construção aparece como uma verdadeira "imitação" desse mesmo ato, ou gesto inteligente, que é também a origem de toda a verdadeira arte, seja o que for, mas que terá sempre o objetivo essencial de harmonizar o nosso ser com o ritmo do mundo, fonte de toda a vida e expressão dinâmica da Unidade primordial. 

Vamos levar em consideração, neste sentido, que os antigos arquitetos e mestres construtores não usaram planos detalhados do edifício a ser construído como fazem hoje. Estes eram muito mais simples, reduzidos em muitas ocasiões aos desenhos das diferentes partes da construção. Tratava-se, em seus aspectos essenciais, da projeção para o exterior de uma imagem sutil concebida na mente e no espírito do arquiteto, e os oficiais sob seu comando estavam perfeitamente cientes das regras e técnicas do ofício necessárias para sua realização, que eles foram revelados oralmente e compreendidos por meio da prática repetida (e ritual) dessa mesma arte.

Texto publicado no grupo da Academia de Estudos Maçônicos do Baixo Vale do Paraíba. 

junho 11, 2021

O MAÇOM MOZART




Wolfgang Amadeus Mozart é talvez o maçom mais famoso. Para se ter uma ideia, se se fizer uma busca no Google utilizando a palavra chave Mozart, encontra-se nada mais nada menos do que 42 milhões de páginas referenciadas; pesquisando nestes resultados com a palavra chave maçom, obtém-se, para o conjunto Mozart maçom o número de 213.000 páginas referenciadas; se, em vez de maçom, efetuarmos, nos resultados obtidos com a pesquisa Mozart, outra pesquisa, agora com a palavra chave mason, em inglês, para este conjunto Mozart mason o número de páginas referenciadas sobe para 1.030.000!

Em resumo, não é segredo para ninguém que Mozart foi maçom e mesmo os mais distraídos podem facilmente tropeçar com essa informação na Rede. É assim evidente que uma galeria de Maçons célebres não pode deixar de conter um texto sobre o mais célebre dos célebres maçons! Eis então um breve retrato do maçom W. A. Mozart.

Mozart tinha onze anos quando, atingido pela varíola, foi tratado por um médico vienense de apelido Wolff, que era um conhecido maçom. Em agradecimento pela sua cura, Mozart compôs uma melodia que ofereceu ao Dr. Wolff, que intitulou An die Freude (À alegria). O texto musicado era claramente de inspiração maçônica e o jovem Mozart não poderia ter composto a melodia sem conhecer o seu sentido.

Um ano mais tarde, Mozart travou conhecimento com o célebre Dr. Messmer, também maçom.

Aos dezasseis anos de idade, Mozart compôs O heiliges Band (Ó Sagrada Escritura), sobre um texto de Lens existente num conjunto de textos maçônicos, reservado apenas aos maçons e a que, naturalmente, era suposto nenhum profano ter acesso...

Um ano mais tarde, um maçom importante, von Gebler, encomendou a Mozart dois coros e cinco entreatos para acompanhar um drama heróico, Thamos, rei do Egipto (prefigurando o que mais tarde virá a ser uma ópera intitulada A Flauta Mágica).

Ou seja, entre os 11 e os 17 anos o contato de Mozart com maçons e a sua forma de pensar e ver o Mundo foi frequente.

Em 1783, tinha então Mozart 27 anos de idade, o famoso Gemmingen, que conhecia o compositor, instala a sua própria Loja Maçônica em Viena e convida Mozart para se juntar a ela e aí exercer o ofício de Mestre da Harmonia. Mozart reflete. Em Novembro do ano seguinte, apresenta a sua candidatura à Loja Zur Wohlthätigkeit (Beneficência). Foi aí iniciado em 14 de Dezembro de 1784.

A 7 de Janeiro de 1785 (apenas 24 dias depois da sua iniciação!), Mozart é, na Loja Zur wahren Eintracht (Verdadeira Concórdia), passado ao grau de Companheiro. A 10 de Janeiro, termina o Quarteto de Cordas em Lá Maior (K 464), no qual o movimento Andante se refere ao ritual de Iniciação Maçônica. A 13 de Janeiro (6 dias depois da passagem a Companheiro, 30 dias depois da sua Iniciação!), Mozart é elevado ao grau de Mestre. Quatro dias mais tarde, compõe um Quarteto de cordas em Dó Maior (K 465), que se refere ao grau de Companheiro. Em Março de 1785, termina o Concerto em Dó Maior (K 467), cujo Andante faz claramente alusão ao terceiro grau, o de Mestre.

A 6 de Abril de 1785, participa na cerimônia de Iniciação do seu próprio pai, Leopold Mozart.

Mozart participa em inúmeras reuniões de Loja e compõe numerosas obras destinadas a serem tocadas em sessão. Visita as Lojas Zu den drei Adlern (Três Águias) e Zur gekrönten Hoffnung (Esperança Coroada).

Entretanto, a doença que lhe virá a ser fatal (o síndroma de Schönlein-Henoch) progride. Mozart compõe as suas três grandes obras com simbologia maçônica: A Clemência de Tito, a Flauta Mágica e o Requiem.

A morte de Mozart origina uma reunião de exéquias fúnebres de seus Irmãos. Uma oração fúnebre proferida na ocasião foi impressa. Hoje, dela resta apenas um exemplar. Eis a sua tradução:

O Grande Arquitecto do Universo acaba de retirar à nossa Cadeia Fraternal um dos elos que nos era mais caro e mais valioso. Quem não o conhecia? Quem não amou o nosso tão notável Irmão Mozart? Há poucas semanas ainda, ele encontrava-se entre nós, glorificando com a sua encantadora música a inauguração deste Templo. Quem de nós imaginaria que seria tão rapidamente arrancado do nosso seio? Quem poderia saber que três semanas depois choraríamos a sua morte? É o triste destino imposto ao homem, de deixar a vida deixando a sua obra inacabada, e tão excelente ela é. Mesmo os réis morrem deixando à posteridade as suas intenções inacabadas. Os artistas morrem depois de terem devotado as suas vidas a melhorar a sua arte para atingirem a perfeição. A admiração de todos acompanha-os ao túmulo.No entanto, se os povos choram, os seus admiradores não tardam, muito frequentemente, a esquecer-se deles. Os seus admiradores talvez, mas não nós, seus Irmãos! A morte de Mozart é para a arte uma perda irreparável. Os seus dons, reconhecidos desde a infância, tinham feito dele uma das maravilhas deste tempo. A Europa soube-o e admirou-o. Os príncipes gostaram dele e nós, nós poderíamos chamá-lo: “meu irmão”. Mas se é óbvio honrar o seu gênio, não nos devemos esquecer de comemorar a nobreza do seu coração. Foi um membro assíduo da nossa Ordem. O seu amor fraternal, a sua natureza inteira e devotada, a sua caridade, a alegria que mostrava quando beneficiava um de seus irmãos com a sua bondade e o seu talento, tais eram as suas imensas qualidades, que nós louvamos neste dia de luto. Era simultaneamente um marido, um pai, o amigo de seus amigos e o irmão de seus irmãos. Se tivesse tido fortuna, faria todos tão felizes como ele desejaria.

...

Fonte A Partir da Pedra

RITO ESCOCÊS DO BRASIL, A ORIGEM - Ailton Pinto de Trindade Branco




              O Rito Escocês do Brasil aparece pela primeira vez nos rituais dos três graus simbólicos criados em 1927 pelo Supremo Conselho do Grau 33 do Rito Escocês Antigo e Aceito da Maçonaria para a República Federativa do Brasil, presidido por Mário Behring, e transmitidos à Grande Loja do Rio de Janeiro através de tratado entre as duas Obediências. Foram colocados em execução em 1928 nas Grandes Lojas brasileiras fundadas após a separação entre Supremo Conselho e Grande Oriente do Brasil. Substituíram os rituais do REAA das Lojas Simbólicas do GOB.

              O Rito Escocês do Brasil foi uma invenção ritualística circunstancial. Não é o mesmo que Rito Escocês Antigo e Aceito, embora as Grandes Lojas brasileiras, por imposição do Supremo Conselho, empreguem indevidamente essa denominação para o seu ritual escocês. Indevidamente porque os procedimentos que constituem os primeiros rituais do REAA, a partir de 1804, na França, são diferentes do que se faz no Brasil. O REAA praticado no século 19 nos graus simbólicos das Lojas Capitulares do Grande Oriente do Brasil, portanto antes do surgimento das Grandes Lojas, é semelhante ao que consta nos primeiros rituais franceses e diferente do Rito Escocês do Brasil.

              Em 1927, as chamadas Lojas Capitulares do REAA abrangiam os graus 1 ao 18 e eram comandadas pelo Grande Oriente do Brasil. O Supremo Conselho jurisdicionava os graus 19 ao 33.    

              Na nova estrutura jurisdicional do REAA do começo dos anos 1900, decidida em convenção mundial dos Supremos Conselhos, as Lojas Capitulares desapareciam; os três primeiros graus ficavam sob responsabilidade de uma Obediência que pode ser uma Grande Loja ou Grande Oriente e os 30 graus restantes sob o comando de outra Obediência, o Supremo Conselho do Grau 33. Essa reformulação na divisão jurisdicional dos 33 graus do REAA não teve receptividade pacífica no Brasil. O Grande Oriente inicialmente aceitou, depois recuou e rejeitou o acordo. O conflito provocou desdobramentos político-administrativos, culminando com a ruptura das relações entre as Potências Maçônicas GOB e Supremo Conselho.

              O Supremo Conselho, tendo se separado do Grande Oriente do Brasil, precisou de novas Lojas Simbólicas para os três primeiros graus dos 33 do REAA. Por isso, criou as Grandes Lojas. Sobre os rituais a ser adotados, tudo levava a crer que seriam os mesmos, conhecidos do Supremo Conselho desde a época da convivência amistosa com o Grande Oriente. Bastava recomendar às Grandes Lojas por ele criadas os mesmos rituais para as suas Lojas Simbólicas.  

              Mas o Supremo Conselho não prestigiou a lógica operacional e nem a ética com os maçons do Rito. Elaborou um ritual novo que gerou um rito diferente nos três primeiros graus, constituído de procedimentos misturados do Rito Moderno, do Rito de Heredom, do Rito de York e de alguns graus superiores do próprio REAA. Deve ter tido suas razões para desprezar rituais consagrados. O Supremo Conselho como qualquer outra Potência Maçônica pode criar um rito novo. O que não deve fazer é criar um rito novo e dar a ele o nome de um rito antigo, tradicional, cujos rituais são conhecidos no mundo inteiro. O ritual criado pelo Supremo Conselho para os graus simbólicos das Grandes Lojas brasileiras é muito diferente do REAA original trazido para o Brasil pela primeira vez. Mesmo assim, premeditadamente, foi dado ao conjunto de novos cerimoniais o mesmo nome do rito Escocês Antigo e Aceito criado em 1801 nos Estados Unidos da América. O Supremo Conselho rasgou parte do seu passado ritualístico obrigando as Grandes Lojas a adotarem o nome do REAA embora seus rituais do simbolismo não contenham os procedimentos desse Rito. O Supremo Conselho nunca explicou porque agiu dessa forma. Presentemente, sabe-se que as pesquisas realizadas pela Oficina de Restauração do REAA sobre os rituais originais de 1804 e a comparação com os rituais designados pelo Supremo Conselho, desencadearam surpresa em todo o Brasil e alguns constrangimentos. Maçons tidos como conhecedores do REAA, palestrantes convictos e aplaudidos, passaram a ser questionados sobre afirmativas produzidas a respeito de procedimentos mostrados e interpretados como sendo do REAA e que agora se sabe que não são.

              Assim nasceu o Rito Escocês do Brasil, sistema ritualístico que apenas os maçons brasileiros conhecem.

              A obra da maçonaria celebra a repetição de si mesma e do seu próprio destino à luz dos sucessivos elementos que são adicionados a cada nova descoberta de acontecimentos históricos desenterrados do passado. Cada um desses fatos clareia a visão para interpretações sobre condutas da coletividade maçônica, as quais têm oscilado entre grandes feitos solidários com elevados humanitarismos e atitudes como alterar rituais apenas para alimentar disputas políticas internas. Embora recomendado nos trabalhos em Loja o respeito à inalterabilidade do desenvolvimento dos rituais em vigor, os caciques das diferentes administrações modificam os rituais de suas Obediências sem muito pudor. O exemplo na prática dos rituais brasileiros não recomenda a teoria dos princípios maçônicos.


Texto: Ailton Pinto de Trindade Branco - Presidente da Oficina de Restauração do REAA - Novembro/2014