Ir. Álvaro Enéas Ribeiro Falcão de Almeida, M.I. – L.M. Cavaleiros Templários, Belo Horizonte, 02/2007.
No rito em que trabalhamos, o Rito Emulação, não há a leitura de quaisquer trechos do Livro das Sagradas Escrituras, na abertura dos trabalhos dos três graus simbólicos.
No entanto, nas lojas maçônicas que adotam o Rito Escocês Antigo e Aceito, no grau de Aprendiz, antes de qualquer procedimento, o Livro Sagrado é aberto em Salmos, capítulo 133, versículos de um a três e, em seguida, procede-se à sua leitura.
A leitura do Salmo 133, considerado emblemático pela apologia que faz à fraternidade, tem por escopo, levar os Irmãos à reflexão sobre este tema tão caro à Ordem.
A compreensão do seu simbolismo faz-se necessária, mas um tanto trabalhosa, porque temos que fazer abstrações e nos transportar aos usos e costumes de uma época muito remota, já que foram escritas cerca de mil anos antes da era cristã.
Mesmo não sendo uma prática do Rito Emulação, considera-se que a procura pelo conhecimento maçônico deve ser constante e transcende ritos e outras convenções, motivo pelo qual aqui são apresentadas algumas notas sobre este assunto.
Cumpre esclarecer que são conhecimentos de domínio geral, não são inéditos, apenas foram ordenados e a eles foi dada uma forma mais agradável para a leitura.
Esta tradução do Salmo 133 é a que consta das Bíblias católicas atuais, havendo também uma outra, usada pelas igrejas protestantes e evangélicas, que é uma versão atualizada da Bíblia traduzida por João Ferreira de Almeida, publicada em três volumes, em 1753.
O conteúdo, no entanto, é o mesmo, havendo pequenas diferenças nas palavras empregadas.
Os três versículos foram transcritos precedidos de numeração e, em seguida, foram feitos os comentários pertinentes ao seu conteúdo.
1-´” Oh! Vêde quanto é bom, quanto é suave
morarmos todos juntos como irmãos!
2 É semelhante ao óleo precioso
o qual sobre a cabeça derramado,
pela barba de Aarão vai gotejando
até chegar à fímbria do seu manto.
3 É também como o orvalho que do Hermon
escorre sobre os montes do Sião,
pois o Senhor lhes manda a sua bênção,
lhes manda a vida para todo o sempre”
Versículo 1
Para os povos de antigos, da região que é cenário das passagens bíblicas, a palavra "irmão" apresentava significado muito especial e bastante considerado.
E talvez mais que qualquer outro, o povo judeu dava muita importância à unidade familiar, sendo este um ideal perseguido com todo empenho: o de que "os irmãos habitassem em união".
Tal costume perdura até hoje, haja vista que os os judeus, como um todo, e os grupos familiares em particular dentro das comunidades judaicas são muito fechados.
Assim como os irmãos de sangue sentiam a necessidade de unir-se em torno do templo familiar, a filosofia maçônica adotou esta experiência, para ensinar aos seus membros o cultivo do hábito de estarem sempre juntos como única família.
Desta forma, fica claro para nós que “viver em fraternidade” é um dos principais alicerces mantenedores da unidade maçônica, uma vez que, sem a união fraternal, não haverá maçonaria.
Versículo 2
O cabelo e a barba compridos eram símbolos de distinção entre os judeus e o costume de cultivar a barba era um sinal de respeitabilidade e de virilidade.
Nos dias de hoje, isto ainda se pode observar junto aos judeus ortodoxos.
Os patriarcas tinham profunda consideração pela barba, um atributo do varão que, ao ostentá-la, exibiam toda a sua dignidade.
Não era importante somente “ter” a barba, mas era imprescindível “cuidar” dela, pois não o fazendo seu portador poderia ser considerado em estado de demência ou de alienação.
Era considerado um ato de respeito o costume de beijar a barba de um amigo. E era interpretada como uma ofensa gravíssima o ato de se cortar toda ou parte da barba de alguém.
O óleo, também citado no versículo em questão, era o azeite da oliveira que, sobre todos os aspectos, possuía um valor extraordinário para aqueles povos.
Além do seu alto valor como mercadoria, era importante como elemento da dieta e para emprego medicinal. Era, além disso, um símbolo da unidade e do amor entre os irmãos, o que o tornava, também, importante em rituais.
Era empregado em várias efemérides importantes da vida: untava-se o corpo do recém-nascido; era usado na unção em cerimônias de sagração para o sacerdócio; nos enlaces matrimoniais e na unção dos corpos, preparando-os para o sepultamento.
Enfim, todas as ocasiões solenes comportavam essa prática.
Se a pessoa fosse muito respeitada e venerada, o óleo era derramado em abundância para correr livremente da cabeça aos pés, escorrendo pela barba e pelo pescoço, até atingir as vestes.
A alusão ao ato de derramá-lo sobre a cabeça do sacerdote Aarão, era a confirmação de que Deus o havia abençoado e eleito como seu representante para manter o povo em comunhão com Ele e em comunhão entre eles.
Aarão era venerado pelo seu povo, tanto que simboliza a alegria que decorre da união fraterna, porque ele conseguiu unir seu povo, como se todos pertencessem à mesma família.
Quando Aarão foi ungido, como está no livro do Gênese, o óleo consagrado foi derramado em sua cabeça, descendo pelas barbas e pelas suas vestes, significando que, de sua cabeça, de sua mente, de sua parte espiritual, espalhava-se a benção ao "corpo", que simbolizava a nação israelita.
O Salmo menciona as vestes não apenas como passagem para o óleo precioso, mas pelo fato de Aarão ser um sacerdote e, por esta razão, suas vestes serem especiais.
As Sagradas Escrituras registram que os sacerdotes que oficiavam no Tabernáculo se vestiam com hábitos muito especiais, que tinham grande importância nos ritos.
Tal como se vê hoje nas cerimônias da igreja Católica, Ortodoxa, Anglicana e muitas outras, nas quais os que oficiam os cultos religiosos portam vestimentas primorosamente ornadas, para conferir solenidade ao ato.
Não eram, pois, simples ornamentos, mas receptáculos das forças divinas. Considerados mais um dos objetos sagrados do templo; verdadeiros canais das forças espirituais invocadas.
Versículo 3
Neste versículo, o óleo é comparado ao “orvalho do Hermon”. O Monte Hermon é um monte majestoso, localizado no extremo norte de Israel, próximo ao Líbano.
Era também chamado Senir e de Siriom por outros povos. Seu topo atinge três mil metros de altitude, estando sempre coberto de neve e pode ser avistado de muitas partes da Palestina Dizem os estudiosos das Sagradas Escrituras, que a Transfiguração de Jesus se deu, provavelmente, ao pé deste monte.
E, por exibir neves permanentes em seus pontos mais altos, lhe dão o nome característico e popular de "Monte do Ancião”.
É natural que por se manter coberto de neve o ano inteiro, à noite o orvalho se desprende e os ventos que sopram do Mediterrâneo conduzem essa água a longas distâncias, distribuindo-a em terras áridas, como são as Israel, Palestina, Líbano e de outras nações vizinhas, como uma verdadeira benção, a umidade que beneficia as regiões secas.
O degelo, provocado pelo sol inclemente, derrete a neve e se torna também uma das principais fontes de abastecimento do rio Jordão, um curso d’água de grande significado para os cristãos. E Sião é o nome sagrado daquela região e é o sinônimo de Israel, hoje um Estado tão independente quanto polêmico.
Finalizando, assim como aquele orvalho originário do monte Hermon era um verdadeiro bálsamo para o solo e que fazia os campos produzirem boas colheitas, a união fraternal é também um estímulo que atrai, cultiva, multiplica e renova as bênçãos divinas. Segundo as Escrituras, vida prazerosa e bênçãos divinas eram um privilégio, restrito ao povo judeu. Mas, nos dias de hoje, é um privilégio concedido também aos que procuram viver em harmonia com os seus irmãos, afinados com os preceitos que regem as diferentes sociedades em que vivemos, sempre de acordo com os princípios emanados por Aquele que, lá do alto, nos rege ao longo da vida.