abril 12, 2022

MAÇONARIA : UMA HISTÓRIA SEM MISTÉRIO




Organizações de ofício, as precursoras

Desde que o homem deixou as cavernas e as suas vivendas de nômade, sedentarizando-se e formando uma sociedade estratificada, surgiram os profissionais dedicados à arte da construção, os quais foram se aperfeiçoando, não só na ereção de casas de residência, mas, também, na de templos, de obras públicas e obras de arte. Embora tivessem, esses profissionais, desde os seus primeiros tempos, mantido, entre si, certa camaradagem e um sentimento de agregação, não havia, na realidade, uma organização que os reunisse, que regulasse a sua atividade e que lhes desse um maior sentido de responsabilidade profissional.

Foi no Império Romano do Ocidente, da Roma conquistadora, que, em função da própria atividade bélica, surgiu, no século VI a.C., a primeira associação organizada de construtores, os Collegia Fabrorum. Como a conquista das vastas regiões da Europa, da Ásia e do norte da África, levava à destruição, os collegiati acompanhavam as legiões romanas, para reconstruir o que fosse sendo destruído pela guerra. Dotada de forte caráter religioso, essa organização dava, ao trabalho, o cunho sagrado de um culto às divindades. De início politeísta, tornou-se, com a expansão do cristianismo, monoteista, entrando, porém, em decadência, após a queda do Império Romano do Ocidente, ocorrida em 476 d.C., embora persistissem pequenos grupos da associação no Império Romano do Oriente, cujo centro era Constantinopla.

Na Idade Média é que iria florescer, através do grande poder da época, a Igreja, a hoje chamada Maçonaria Operativa, ou Maçonaria de Ofício, para a preservação da Arte Real entre os mestres construtores da Europa. Assim, a partir do século VI, as Associações Monásticas, formadas, principalmente, por clérigos, dominavam o segredo da arte de construir, que ficou restrita aos conventos, já que, naquela época de barbárie, quando a Europa estava em ruínas, graças às sucessivas invasões dos bárbaros, e quando as guerras, os roubos e os saques eram freqüentes e até encarados como fatos normais, os artistas e arquitetos encontraram refúgio seguro nos conventos. Posteriormente, pela necessidade de expansão, os frades construtores começaram a preparar e a adestrar leigos, proporcionando, a partir do século X, a organização das Confrarias Leigas, que, embora formadas por leigos, recebiam forte influência do clero, do qual haviam aprendido a arte de construir e o cunho religioso dado ao trabalho. 

É dessa época aquela que é considerada a primeira reunião organizada de operários construtores: a Convenção de York, ocorrida em 926 e convocada por Edwin, filho do rei Athelstan, para reparar os prejuízos que as associações haviam tido com as sucessivas guerras e invasões. Nela foi apresentada, para apreciação e aprovação, um estatuto, que, dali em diante, deveria servir como lei suprema da confraria e que é, geralmente, chamado de Carta de York. 

Quase na mesma época, surgiriam associações simplesmente religiosas, que, a partir do século XII, formaram corpos profissionais: as Guildas. A elas se deve o primeiro documento em que é mencionada a palavra “Loja”, para designar uma corporação e o seu local de trabalho. As Guildas e sua contemporânea, a organização dos Ofícios Francos, foram as principais precursoras da moderna Maçonaria. O seu nome “Gild, de origem teutônica, deriva do título dado, na antiga região da Escandinávia, a um ágape religioso, durante o qual, numa cerimônia especial, eram despejados três copos de chifre (chavelhos), conforme o uso da época, cheios de cerveja, sendo um em homenagem aos deuses, outro, pelos antigos heróis, e o último em homenagem aos parentes e em memória dos amigos mortos; ao final da cerimônia, todos os participantes juravam defender uns aos outros, como irmãos, socorrendo-se mutuamente nos momentos difíceis. As Guildas caracterizavam-se por três finalidades principais: auxílio mútuo, reuniões em banquetes e atuação por reformas políticas e sociais. Introduzidas na Inglaterra, por reis saxões, elas foram modificadas por influência do cristianismo, mas, mesmo assim, não eram bem aceitas pela Igreja, que não via com bons olhos a prática do banquete, por suas origens pagãs, e a pretensão de reformas políticas e sociais, que pudessem, eventualmente, contribuir para diminuir os seus privilégios e os privilégios das corporações sob a sua proteção. Assim, para evitar a hostilidade da Igreja, cada guilda era organizada sob a égide de um monarca, ou sob o nome de um santo protetor.

No século XII, associada às guildas, surgia uma organização de operários alemães, os Steinmetzen, ou seja, canteiros, que, sob a direção de Erwin de Steinbach, alcançariam notoriedade, quando este conseguiu a aprovação de seus planos para a construção da catedral de Estrasburgo e deu um aperfeiçoado sentido de organização aos seus obreiros. Canteiro é o operário que trabalha em cantaria, que esquadreja e trabalha na escultura da pedra bruta; cantaria (palavra derivada de canto) designa a pedra lavrada para as construções. 

Surgem os ofícios francos, ou franco-maçonaria

No século XII, também, iria florescer a associação considerada a mais importante desse período operativo: os Ofícios Francos (ou Franco-Maçonaria), formados por artesãos privilegiados, com liberdade de locomoção e isentos das obrigações e impostos reais, feudais e eclesiásticos. Tratava-se, portanto, de uma organização de construtores categorizados, diferentes dos operários servos, que ficavam presos a uma mesma região, a um mesmo feudo, à disposição de seus amos. Na Idade Média, a palavra franco designava não só o que era livre, em oposição ao que era servil, mas, também, todos os indivíduos e todos os bens que escapavam às servidões e aos direitos senhoriais; esses artesãos privilegiados eram, então, os pedreiros-livres, franc-maçons, para os franceses, ou free-masons, para os ingleses. Tais obreiros, evidentemente, tinham esses privilégios concedidos pela Igreja, que era o maior poder político da época, com grande ascendência sobre os governantes. 

A palavra francesa “maçon”, correspondente a pedreiro, converteu-se em “maison” (casa) e, também, embora só relativamente, em “masse” (maça, clava). Essa maça, ou clava, habilitava o porteiro a afastar os indesejáveis intrusos e curiosos. O pesquisador alemão Lessing, um dos clássicos da literatura alemã, atribui a palavra inglesa “masonry” (maçonaria) a uma transmissão incorreta. Originalmente, a idéia teria sido dada pelo velho termo inglês “mase” (missa, reunião à mesa). Uma tal sociedade de mesa, ou reunião de comensais, de acordo com a alegoria da Távola Redonda, do rei Arthur, poderia, segundo Lessing, ainda ser encontrada em Londres, no século XVII. Ela se reunia nas proximidades da famosa catedral de São Paulo e, quando sir Christopher Wren, o construtor da catedral, tornou-se membro desse círculo, julgou-se que se tratava de uma cabana dos construtores, que estabelecia uma ligação de mestres construtores e obreiros; daí, então, ou seja, dessa suposição errada, é que teria se originado o termo “masonry”, para designar a sociedade dos construtores. 

Uma explicação para o termo inglês “freemason” (pedreiro livre) está ligada ao termo “freestone”, que é a pedra de cantaria, ou seja, a pedra própria para ser esquadrejada, para que nela sejam feitos cantos, que a transformem numa pedra cúbica, a ser usada nas construções. As expressões “freestone mason” e “freestone masonry”, daí surgidas, acabaram sendo simplificadas para “freemason” (o obreiro) e “freemasonry” (a atividade). Esta é uma hipótese mais plausível do que a de Lessing, que só considerou o caso particular da Inglaterra, quando se sabe que não foi só aí que existiu uma íntima ligação com o trabalho dos artífices da construção. 

Nessa fase primitiva, porém, antes de, propriamente, se ter iniciado a formação de Lojas, quase que não se pode falar em Maçonaria no sentido que ela adquiriu na fase moderna, pois, sobretudo, naquele tempo não podia ser considerada como uma sociedade secreta. O segredo não era, a princípio, mais do que o processo pelo qual um dos membros da irmandade reconhecia o outro. Diga-se a bem da verdade, que, na época atual, a Maçonaria já não pode mais ser considerada secreta, mas apenas discreta. Os segredos mais guardados e que persistem são, obviamente, apenas os meios de reconhecimento, reservados só aos iniciados, já que, de posse deles, um não iniciado poderia ter acesso aos templos maçônicos e às sessões das Lojas. 

É criado o importante estilo gótico

Na metade do século XII, surgia o estilo arquitetônico gótico, ou germânico, primeiro no norte da França, espalhando-se, depois, pela Inglaterra, Alemanha e outras regiões do norte da Europa e tendo o seu apogeu na Alemanha, durante 300 anos. Tão importante foi o estilo gótico para as confrarias de construtores, que as suas regras básicas eram ensinadas nas oficinas dos canteiros, ou talhadores de pedra; tão importante que a sua decadência, no século XVI, decretou o declínio das corporações. 

No século XIII, em 1220, era fundada, na Inglaterra, durante o reinado de Henrique III, uma corporação dos pedreiros de Londres, que tomou o título de The Hole Craft and Fellowship of Masons (Santa Arte e Associação dos Pedreiros) e que, segundo alguns autores, seria o germe da moderna Maçonaria. Pouco depois, em 1275, ocorria a Convenção de Estrasburgo, convocada pelo mestre dos canteiros e da catedral de Estrasburgo, Erwin de Steinbach, para terminar as obras do templo. A construção da catedral, iniciada em 1015, estava praticamente terminada, quando foi resolvido ampliar o projeto original e, para isso, foi chamado Erwin A essa convenção acorreram os mais famosos arquitetos da Inglaterra, da Alemanha e da Itália, que criaram uma Loja, para as assembléias e discussão sobre o andamento dos trabalhos, elegendo Erwin como Mestre de Cátedra (Meister von sthul). 

Esclareça-se que, na época, os obreiros criavam uma Loja, fundamentalmente, para tratar de determinada construção, como é o caso dessa catedral. Tais Lojas serviam para tratar dos assuntos ligados apenas à construção prevista, já que, para outras reuniões, inclusive com obreiros de outras corporações, eram utilizados os recintos de tabernas e hospedarias, principalmente em solo inglês. A palavra Loja, por sinal, foi mencionada pela primeira vez em 1292, em documento de uma guilda . Loja, do germânico leubja (pronúncia: lóibja), através do francês lodge, designava o lar, a casa, o abrigo, o pátio, o alpendre e, também, a entrada de edifício, ou galeria usada para exposições artísticas e venda de produtos artesanais. As guildas de mercadores assim designavam seus locais de depósito e venda de produtos manufaturados, enquanto que as guildas artesanais adotaram o termo para designar o seu local de trabalho, ou seja, as oficinas dos artífices. 

Próximo desse tempo, ou seja, no século XIV, começava, também, a atuação do Compagnonnage (Companheirismo), criado pelos cavaleiros templários . Os membros dessa organização construíram, no Oriente Médio, formidáveis cidadelas, adquirindo certo número de métodos de trabalho herdados da Antigüidade e constituindo, durante as Cruzadas, verdadeiras oficinas itinerantes, para a construção de obras de defesa militar, pontes e santuários. Retornando à Europa, eles tiveram a oportunidade de exercer o seu ofício, construindo catedrais, igrejas, obras públicas e monumentos civis. A Ordem da Milícia do Templo, ou Ordem dos Templários, foi uma ordem religiosa e militar, criada em 1118, com estatutos feitos pelo abade de Clairvaux (São Bernardo). Adquirindo prestígio e riqueza, a ordem excitaria a cobiça do rei francês Filipe IV, cognominado “o Belo”, que, com a conivência do papa Clemente V, conseguiu a sua extinção, em 1312, seguida da execução, na fogueira, de seu Grão-Mestre, Jacques de Molay, em 1314. Antes da extinção, necessitando, em suas distantes comendadorias do Oriente, de trabalhadores cristãos, os templários organizaram o Compagnonnage, dando-lhe um estatuto chamado Santo Dever, de acordo com sua própria filosofia. 

No século XVI, a decadência das corporações de ofício

Já na primeira metade do século XVI, as corporações, diante das perseguições que sofriam --- principalmente por parte do clero --- e diante da evolução social européia, começavam a entrar em declínio. Em 1535, realizava-se, em Colônia, uma convenção, que fora convocada para refutar as calúnias dirigidas pelo clero contra os franco-maçons. Embora ela não tenha tido o brilho e a freqüência de outras convenções, consta, embora tal afirmativa seja contestada, por carecer de comprovação, que, na ocasião, teria sido redigido um manifesto, onde era estabelecido o princípio de altos graus, que seriam introduzidos por razões políticas. 

Em 1539, o rei da França, Francisco I, revogava os privilégios concedidos aos franco-maçons, abolindo as guildas e demais fraternidades e regulamentando as corporações de artesãos. Em contrapartida, em 1548, era concedido, aos operários construtores, de maneira geral, o livre exercício de sua profissão, em toda a Inglaterra; um ano depois, todavia, por exigência de Londres, era cassada a autorização concedida, o que fazia com que os franco-maçons ficassem na condição de operários ordinários, como tais sendo tratados legalmente. Em 1558, ao assumir o trono da Inglaterra, a rainha Isabel renovava uma ordenação de 1425, que proibia qualquer assembléia ilegal, sob pena dela ser considerada uma rebelião. Três anos depois, em dezembro de 1561, tendo, os franco-maçons ingleses, anunciado a realização de uma convenção em York, durante a festividade de São João Evangelista, Isabel ordenou a dissolução da assembléia, decretando a prisão de todos os presentes a ela; a ordem só não foi confirmada, porque lord Thomas Sackville, adepto da arte da construção, estando presente, demoveu a rainha de seu intento, fazendo com que, em 1562, ela revogasse a ordenação de 1425. 

Em 1563, a Convenção de Basiléia, feita por iniciativa da confraria de Estrasburgo, organizava um código para os franco-maçons alemães, o qual serviria de regra à corporação dos canteiros, até que surgissem os primeiros sindicatos de operários, no século XIX. Mas era patente o declínio das confrarias, no século XVI. A Renascença relegara o estilo gótico e a estrutura ogival das abóbadas --- próprias da arte dos franco-maçons medievais --- ao abandono, revivendo as características da arte greco-romana. Assim, embora ela tivesse atingido a todos os campos do conhecimento e a todas as corporações profissionais, foi a dos franco-maçons a mais afetada. No final do século, Ínigo Jones introduzia, na Inglaterra, o estilo renascentista, sepultando o estilo gótico e apressando a decadência das corporações de franco-maçons ingleses. Estas, perdendo o seu objetivo inicial e transformando-se em sociedade de auxílio mútuo, resolveram, então, permitir a entrada de homens não ligados à arte de construir, não profissionais, que eram, então, chamados de maçons aceitos. 

Iniciava-se a transformação na Maçonaria atual 

As corporações, evidentemente, começaram por admitir pessoas em pequeno número e selecionadas entre os homens conhecidos pelos seus dotes culturais, pelo seu talento e pela sua condição aristocrática, que poderiam dar projeção a elas, submetendo-se, todavia, aos seus regulamentos. Era a tentativa de sustar o declínio. 

O primeiro caso conhecido de aceitação é o de John Boswell, lord de Aushinleck --- ou, segundo J.G. Findel, sir Thomas Rosswell, esquire de Aushinleck --- que, a 8 de junho de 1600 foi recebido como maçom aceito --- não profissional --- na Saint Mary’s Chapell Lodge (Loja da Capela de Santa Maria), em Edimburgo, na Escócia. Esta Loja fora criada em 1228, para a construção da Capela de Santa Maria, destinando-se, como já foi visto, às assembléias dos obreiros e discussões sobre o andamento das obras. 

Depois disso, o processo de aceitação, iniciado na Escócia, iria se espalhar e se acelerar, fazendo com que, ao final do século, o número de aceitos já ultrapassasse, largamente, o de franco-maçons operativos. Os mais famosos nomes de “aceitos”, na primeira metade do século XVII, foram: William Wilson, aceito em 1622; Robert Murray, tenente-general do exército escocês, recebido, em 1641, na Loja da Capela de Santa Maria e tornando-se, posteriormente, Mestre Geral de todas as Lojas do Exército; o coronel Henry Mainwairing, recebido, em 1646, numa Loja de Warrington, no Lancashire; e o antiquário e alquimista Elias Ashmole, recebido na mesma Loja e no mesmo dia (16 de outubro) que o coronel Henry. 

Em 1666, os franco-maçons iriam recuperar parte do antigo prestígio, diante do grande incêndio, que, a 2 de setembro daquele ano, aconteceu em Londres, destruindo cerca de quarenta mil casas e oitenta e seis igrejas. Nessa ocasião, os maçons acorreram para participar do esforço de reconstrução, sob a direção do renomado mestre arquiteto Cristopher Wren, que, em 1688, viu aprovado o seu plano para reconstrução da cidade, sendo nomeado arquiteto do rei e da cidade de Londres. A obra principal de Wren foi a reconstrução da igreja de S. Paulo, em cujo adro se desenvolveria e se estabeleceria, em 1691, uma Loja de fundamental importância para a História da Maçonaria moderna: a Loja São Paulo (em alusão à igreja), ou Loja da taberna “O Ganso e a Grelha”, em alusão ao local em que, como faziam outras Lojas, realizava suas reuniões de caráter informal e administrativo, como se verá adiante. A reconstrução de Londres só iria terminar em 1710. 

E nascia a primeira Grande Loja

Como, na época, não existiam templos maçônicos --- o primeiro só seria inaugurado em 1776 --- os maçons reuniam-se em tabernas, ou nos adros das igrejas. As tabernas, cervejarias e hospedarias desse tempo, principalmente na Inglaterra, tinham uma função social muito grande, como local de reunião e de troca de idéias de intelectuais, artífices, obreiros do mesmo ofício, etc. . A Loja da Cervejaria “The Goose and Gridiron” (O Ganso e a Grelha), ou Loja São Paulo, inicialmente formada só pelos maçons de ofício que participaram da reconstrução de Londres, resolvia, em 1703, diante do número cada vez maior de maçons aceitos, em todas as Lojas, admitir, a partir dali, homens de todas as classes, sem qualquer restrição, promovendo, então, uma reforma estrutural, que iria dar o arcabouço da moderna Maçonaria. A admissão, em 1709, do reverendo Jean Théophile Désaguliers , nessa Loja, em cerimônia realizada no adro da igreja de São Paulo, iria apressar o processo de transformação, já que Désagulliers iria se tornar seu lider e paladino. 

A 7 de fevereiro de 1717, Désagulliers conseguia reunir quatro Lojas metropolitanas, para traçar planos referentes à alteração da estrutura maçônica. Nessa ocasião, foi convocada uma reunião geral dessas quatro Lojas existentes em Londres, para o dia 24 de junho daquele ano. Essa reunião foi realizada na taberna “The Apple Tree” (A Macieira), e as Lojas presentes foram, além da “O Ganso e a Grelha”: a da Cervejaria “The Crown” (A Coroa), a da Taberna “Rummer and Grappes” (O Copázio e as Uvas) e a da Taberna “The Apple Tree” (A Macieira). 

E, no dia 24 de junho de 1717, como fora marcado, as quatro Lojas reuniam-se e criavam The Premier Grand Lodge (a Primeira Grande Loja), em Londres, implantando o sistema obediencial, com Lojas subordinadas a um poder central, sob a direção de um Grão-Mestre, já que, antes disso, as Lojas eram livres de qualquer subordinação externa, concretizando a idéia do “maçom livre na Loja livre”. Isso era, portanto, um fato novo e uma grande alteração --- uma verdadeira revolução --- na estrutura maçônica tradicional, o que faz com que esse acontecimento seja tomado como o divisor de águas, o marco histórico entre a antiga e a moderna Maçonaria, ou seja, entre a operativa, ou de ofício, e a dos aceitos, ou especulativa, sua forma moderna.

abril 11, 2022

PALESTRA NA ARLS CHEQUER NASSIF EM SBC



A convite do notável poeta e intelectual maçônico Adilson Zotovici, coube-me a honra de realizar palestra presencial na noite de ontem, dia 10/4, na ARLS Chequer Nassif 169 da GLESP em São Bernardo do Campo.

Foi um sessão magnífica e o resultado do evento foi a doação pela Loja de expressiva quantidade de rações para os animais que perderam seus tutores na tragédia de Petrópolis.

Porém o trabalho de arrecadação de rações continua e no dia de hoje e amanhã visitaremos outras Lojas. Agradeço de maneira especial ao grande poeta Adilson Zotovici e ao VM Antônio Carlos pela gentil recepção.

Zotovici, um lorde de atenção e gentileza, dedicou-me um soneto que reproduzo a seguir, com orgulho.

        VISITANTE ILUSTRE

Como há muito já dito,
Sobre a felicidade
Que um momento bendito
Evento que deixa saudade

Aqui, neste lugar restrito,
A homens de fraternidade
Soneto singelo recito 
Que atrelo à veracidade

Gratidão sempre...repito!
Ao irmão celebridade
De conhecimento inaudito

Seu convívio diz a verdade
Livre pedreiro erudito
Que faz feliz toda irmandade


 

ROYAL SOCIETY E O GANSO E A GRELHA– PRIMÓRDIOS DA MAÇONARIA HISTÓRICA*







Para compreendermos a Maçonaria precisamos contemplar suas raízes históricas e princípios fundadores. Talvez, o primeiro passo seja diferenciarmos as abordagens fantasiosas e acríticas das fontes históricas verídicas. Nesta nobre revista eu dissertei sobre duas origens lendárias da Maçonaria: Os Segredos do Templo de Salomão – Primórdios da Maçonaria Lendária e Os Segredos da Capela Rosslyn – Os Cavaleiros Templários e Maçonaria. Trata-se de duas versões lendárias, ou seja, sem qualquer prova documental que as sustente enquanto verdade.

Talvez o melhor conhecimento histórico possa ser adquirido quando nos voltarmos para os primeiros membros da Ordem. Como sabemos a maçonaria tem origem em corporações de ofício medievais, compostas por trabalhadores especializados na arte da construção. Devido à natureza itinerante de sua atividade, eles não se prendiam a nenhum feudo, tendo o privilégio da livre circulação. Com isso, surge a expressão “pedreiros-livres”.

Só a partir do século XVI, a Maçonaria passa a admitir membros de outras classes de trabalhadores. E é nesta fronteira entre a Maçonaria operativa e especulativa que temos as primeiras provas documentais da Ordem. A primeira atividade da Maçonaria especulativa de que temos notícia aconteceu na Inglaterra em meados do século XVII. Encontramos registros da iniciação de dois maçons especulativos: Sir Robert Moray e Elias Ashmole em 1641 e 1646 respectivamente.

A aproximação intelectual Ashmole e Moray com o Iluminismo nos proporciona informações interessantes sobre a natureza primordial da Maçonaria. Ambos foram fundadores da Royal Society de Londres, instituição fundada em 28 de novembro de 1660 por um grupo de doze estudiosos que incluía, além dos maçons aqui citados, o arquiteto Christopher Wren, o cientista Robert Boyle e John Wilkins, inventor do sistema métrico. Também estão ali os estudos do também maçom Benjamin Franklin sobre tempestades elétricas que datam de 1752 além das notas de Edward Stone, de 1763, sobre o uso da casca de salgueiro para tratar febre, que documentam o começo do descobrimento do ácido acetil salicílico e a produção da aspirina, hoje um dos medicamentos mais usados em todo o mundo.

Como podemos perceber a Maçonaria operativa sofria um processo de transformação lento e gradual atraindo para seu seio não só mestres do ofício da construção, mas também nobres, cientistas e profissionais liberais. A relação íntima da mais antiga academia científica do mundo e a Maçonaria enobrece nossa origem.

Se neste período os documentos ainda não nos permitem traçar muitas considerações o ano de 1717 abre o campo das certezas.  

Foi neste ano durante as festas de São João Batista que quatro lojas maçônicas encontram-se na Taverna Goose and Gridiron (O Ganso e a Grelha), na praça da Igreja de São Paulo, em Londres, e formam a primeira Grande Loja. Infelizmente, o edifício que abrigava a taverna foi demolido no final do século XIX, embora seu emblema tenha sobrevivido .

Foi neste ano que surgiu a primeira organização maçônica pública e formalmente reconhecida: A Grande Loja de Londres. Em 1723, seis anos depois, o ministro presbiteriano escocês Dr. James Anderson, publicou as Constituições da Maçonaria. É neste documento que estão dois baluartes da Maçonaria: a proibição de temas políticos e sectário-religiosos no interior das lojas e a exigência dos membros possuírem a crença num Ser Supremo.

Em pouco mais de trinta anos a Ordem Maçónica estava presente em quase todos os países da Europa Ocidental e nas principais colonias americanas e asiáticas. Podemos afirmar sem sombra de dúvidas que já no princípio do século XIX a Maçonaria tornou-se uma instituição global participando ativamente de acontecimentos políticos, intelectuais e sociais.

Com este artigo espero ter evidenciado que nossa origem histórica é tão fascinante quanto nossa suposta e improvável origem lendária. Apesar de não existir qualquer documento que ligue nossa gênese ao Templo de Salomão ou aos Templários temos nas corporações de ofício medievais e sua incorporação de intelectuais ligados a Royal Society um nobre nascimento.

Fonte: Arte Real Trabalhos Maçônicos.

FRONTEIRAS NATURAIS - Newton Agrella



Newton Agrella é tradutor, escritor e palestrante, um dos mais notáveis intelectuais maçónicos do país.


Ser sucinto é muito bom.

Ser sucinto com conteúdo é melhor ainda. 

Ser sucinto com conteúdo e dispor da noção clara do que se pretende transmitir então, é o melhor dos cenários.

Apesar disso, o segredo dessa breve ponderação, reside em abster-se de fazer comentários "complementares", pretensamente chamados pelos que o fazem, de "imprescindíveis".  

Aí sim, é o verdadeiro atingimento do nirvana.

Registrando que o termo "nirvana" em língua Sânscrita, refere-se a um estado sublime de libertação espiritual que o ser humano busca alcançar.  

Algumas correntes filosóficas indianas entendem que o Nirvana se traduz como que por  "extinção" no sentido de “término do sofrimento”.

Tratando-se assim de um eterno estado de graça.

Há ainda uma outra corrente que conceitua o Nirvana como um processo de superação do karma.

Sendo que o Karma, por sua vez, nas filosofias orientais, está intimamente relacionado ao princípio de causa e efeito que liga os seres ao Samsara, isto é;  ao ciclo de vida, morte e renascimento. 

Não é por acaso que somos munidos de dois ouvidos e de uma só boca...


abril 10, 2022

O TÚMULO DE JOSÉ BONIFÁCIO




O Túmulo de José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838) no Panteão dos Andradas na Cidade de Santos, São Paulo. 

O túmulo para o Patriarca da Independência do Brasil, José Bonifácio de Andrada e Silva, foi encomendado a escultor Rodolfo Bernardelli em 1886 pelo Conselheiro João Alfredo Correia de Oliveira.

O dinheiro foi obtido com verbas do Governo Provincial, complementadas por subscrições públicas, com a colaboração do imperador D. Pedro II, do Conde d`Eu e da Princesa Isabel.

A escultura foi executada na Itália por volta de 1888 e enviada ao Brasil. Instalada após a queda do regime monárquico, em dezembro de 1889, a escultura foi disposta em uma área rebaixada no claustro da Igreja do Convento do Carmo, para onde foi trasladada a sepultura de José Bonifácio.

O monumento representa o corpo de José Bonifácio embalsamado com seu Traje de Grão Mestre da Maçonaria, organização que protagonizou a sua articulação política no Processo de Fundação do Império do Brasil.

Bernardelli teve como base a mascara mortuária do político traz no rosto a deformação causada pelos efeitos da doença e da morte. 

Trata-se de uma imagem exacerbadamente realista e para realizá-la o artista utilizou a mascara mortuária de José Bonifácio existente no Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro

Um dos fundadores da Maçonaria do Brasil, foi o primeiro Grão-Mestre do Grande Oriente do Brasil Chamado de Pitágoras dentro da Maçonaria, e da sociedade secreta "Apostolado da Nobre Ordem dos Cavaleiros de Santa Cruz", Bonifácio proclamou Dom Pedro I (Pedro Guatimozim) a Grão Mestre da Maçonaria as vésperas da Independência do Brasil 

Com a vitória dos partidários de José Bonifácio, os membros do Apostolado (Nobre Ordem dos Cavaleiros de Santa Cruz) passaram a dominar a Assembléia Constituinte, instalada em 3 de maio de 1823. Porém logo depois, devido a conflitos com a criação da Constituição, José Bonifácio e seus seguidores foram presos e desterrados para a França por Dom Pedro I

Anos depois José Bonifácio reconciliou-se com o imperador, voltando ao Brasil em 1829, passou a receber pensão anual do governo, para indenizá-lo dos salários que perdera durante a Independência. Bonifácio foi tutor do Jovem Dom Pedro II entre 1831 a 1833.

No Panteão também estão enterrados os seus irmãos Antônio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva, Patrício Manuel e Martim Francisco Ribeiro de Andrada.

A CONCILIAÇÃO E A CONSCIÊNCIA - Sidnei Godinho



Hoje temos muitas facilidades de comunicação, mas infelizmente nos afastamos das pessoas por orgulho, achando que temos sempre a razão e não podemos “ dar o braço a torcer” 

Mas isso pode ser resolvido com um bom diálogo, permitindo a sinceridade através do ‘olho no olho’.

Muitos mal entendidos e achismos pessoais poderiam ser resolvidos se o diálogo prevalecesse, independentemente da situação. 

Nesse caminho, como já mencionado, é necessário despir-se de julgamentos e de restrições.

Assim está escrito em Mateus 5:25 

...“ Concilia-te depressa com o teu adversário, enquanto estás no caminho com ele…” 

É uma reflexão oportuna, sobretudo em uma época em que as pessoas têm se colocado, via de regra, como juízes da conduta e da vida alheia.

Acrescento o fato de ainda não termos conseguido entender algo que é tão básico em se tratando de convivência: a *projeção*.

A projeção é um dos tantos mecanismos de defesa do ego que tem como característica tentar *poupar* o indivíduo de sentimentos e situações íntimas com as quais não sabe ou não consegue lidar.

Ou seja, o que agora não damos conta de aceitar em nós próprios projetamos nos outros.

* Quantos são polidos, educados e calmos, na superfície, e julgam aqueles que são gritões, que elevam a voz, que gesticulam e são fortes na expressão?


Será que, em verdade, não gostariam de ser assim, espontâneos e explosivos, mas se sentem tolhidos pelas convenções sociais ou mesmo por não terem a expressividade natural que o outro apresenta???... 

Projetar nos outros o que não damos conta em nós (porque é feio, inadequado ou pecaminoso) acontece a torto e a direito, e o resultado sempre será a discórdia e a falsa argumentação da verdade. 

As pessoas que nos cercam nos oferecem a maravilhosa oportunidade de olharmos para o nosso lado sombrio que está devidamente escondido sob as capas da polidez, da bondade, da candura, do sorriso doce e da imaginária sensação do correto. 

Todos nós temos luz (semente divina, somos filhos de *DEUS*) e sombra, a ser aceita, acolhida, polida, trabalhada e transformada.

Que, ao invés de julgar, saibamos ser gratos aos outros que nos rodeiam, pois nos dão a chance de nos conhecermos um tanto mais e de então cavarmos masmorras aos nossos próprios vícios.

Que possamos valer a pena a  nossa passagem por esse mundo através da dádiva da vida que o Pai Celestial nos concedeu!

Bom dia meus irmãos.



abril 09, 2022

O QUE FAZER? - Heitor Rodrigues Freire



Heitor Rodrigues Freire é corretor de imóveis e advogado, Past GM da GLEMS e atual presidente da Santa Casa de Campo Grande.

O ser humano está sempre em construção: ele não nasce pronto e acabado. Vai se desenvolvendo à medida em que vai aplicando o conhecimento, confirmando-o para sua continuidade. Conforme é educado, se aperfeiçoa e evolui, crescendo mental e espiritualmente. Dessa forma elimina dos seus atos o ego, o interesse, a arrogância, a dominação, a pressa, a preguiça. Daí a importância da célebre frase no frontispício do Templo de Apolo, na ilha de Delfos: “Conhece-te a ti mesmo”, inscrita há mais de dois mil anos. 

E reside aí a grandeza da sabedoria de Deus, que torna o ser humano coautor da Sua obra, permitindo que cada um possa contribuir com sua própria inteligência, com seu discernimento, possibilitando a todos o trabalho de sua construção interior, que é infinita.

Quando nascemos, não recebemos um manual para nos ensinar o procedimento para nossa caminhada e evolução. Assim, cabe a cada um descobrir seus talentos, colocá-los em prática e colher o resultado de seus atos. Nisso está a beleza da vida: a descoberta de nós, por nós mesmos e o aperfeiçoamento no processo de evolução da humanidade.

Essa descoberta, quando consciente, evitaria que se instalasse qualquer conflito, discussão, condenação ou cobrança entre uma pessoa e outra, porque isso iria, necessariamente, gerar atrito e resistência, concorrendo para a desarmonia no concerto geral das coisas.

As situações que vivemos desde sempre – porque sempre houve disputa – só se resolverão quando todos se perdoarem mutuamente e se harmonizarem de forma consciente, verdadeira e sincera, quando todos compreenderem que devem mudar. Chegará o momento em que isso ocorrerá. 

Enquanto isso e a partir do instante que cada um entender e praticar o amor verdadeiro, compreender que o outro é seu irmão e que a discórdia é um fator de separação, decidir mudar o comportamento e contribuir para o bem-estar geral, haverá, então, uma reconciliação global.

Cabe a cada um de nós colaborar para que esse estado ideal se realize, e assim mudar nossos atos, pensamentos, cuidar das nossas palavras, vigiar nossa maneira de ser. Vigiar não no sentido policialesco, mas sim no de observar o sentido da ação consciente. Ou seja, não vigiar o outro, mas a si mesmo. Cada palavra, pensamento e ação realizados devem ser coerentes para construirmos nossa própria evolução.

O nosso subconsciente não é seletivo. O que manifestamos se transforma numa ordem que ele procura converter em realidade. Ele simplesmente obedece. Mas como nossas ações em grande parte são contraditórias, cria-se um estado de confusão, provocando situações que, muitas vezes, são motivo de reclamação por parte de todos.

É preciso também aprender a orar. Não como a repetição automática de uma fórmula sem sentimento, mas com o verdadeiro sentido e a consciência daquilo que se está fazendo.

Nós estamos encarnados para concorrer, cada um, para a construção da sua própria evolução. E por meio da evolução alcançar a libertação.

E isso só ocorre ao longo de um processo, cujo início se deu no momento da criação do homem. No princípio, desde sempre. Após ser dada a partida, o processo segue o seu curso e será concluído com a iluminação de cada um.

A partir do momento que se alcança o entendimento do que significa a encarnação, com a decisão de palmilhar o caminho conscientemente, abre-se a porta da evolução verdadeira, que nos proporcionará a oportunidade de contribuir com inteligência e vontade para o nosso auto aprimoramento.  É o descortinar de um novo tempo. É a continuidade do moto-perpétuo, de um movimento sincero, simples e constante. Permanente.

Se não houver mudança na mente e na atitude, nada mudará.

Encerro com um breve comentário sobre quatro verbos que aprendi a conjugar e praticar: saber, querer, ousar e calar. 

Saber é o caminho da libertação da ignorância. 

Querer é uma afirmação perene da vida.

Ousar é amar, remando contra a corrente da indolência da humanidade.

Calar é o mais difícil, pois exige o controle de si mesmo.

No meu entendimento, é o que cabe a cada um de nós fazer. 


COISAS DO PORTUGUÊS - Francicarlos Diniz



Francicarlos Diniz é jornalista e escritor, pós-graduado em Comunicação pela USP)

A palavra "coisa" é um bombril do idioma. Tem mil e uma utilidades.  É aquele tipo de termo muleta ao qual a gente recorre sempre que nos faltam palavras para exprimir uma ideia.

"Coisas" do português.

Gramaticalmente, "coisa" pode ser substantivo, adjetivo, advérbio. Também pode ser verbo: o Houaiss registra a forma "coisificar". E no Nordeste há "coisar": Ô, seu "coisinha", você já "coisou" aquela coisa que eu mandei você "coisar"?

Na Paraíba e em Pernambuco, "coisa" também é cigarro de maconha.

Em Olinda, o bloco carnavalesco Segura a Coisa tem um baseado como símbolo em seu estandarte. Alceu Valença canta: Segura a "coisa" com muito cuidado / Que eu chego já."

Já em Minas Gerais , todas as coisas são chamadas de trem (menos o trem, que lá é chamado de "coisa"). A mãe está com a filha na estação, o trem se aproxima e ela diz: "Minha filha, pega os trens que lá vem a "coisa"!.

E no Rio de Janeiro? Olha que "coisa" mais linda, mais cheia de graça...

A garota de Ipanema era coisa de fechar o trânsito! Mas se ela voltar, se ela voltar, que "coisa" linda, que "coisa" louca.  Coisas de Jobim e de Vinicius, que sabiam das coisas.

Coisa não tem sexo: pode ser masculino ou feminino.

Coisa-ruim é o capeta. Coisa boa é a Juliana Paes. Nunca vi coisa assim!

Coisa também não tem tamanho.

Na boca dos exagerados, "coisa nenhuma" vira um monte de coisas...

Mas a "coisa" tem história mesmo é na MPB.  No II Festival da Música Popular Brasileira, em 1966, a coisa estava na letradas duas vencedoras: Disparada, de Geraldo Vandré: Prepare seu coração pras "coisas" que eu vou contar..., e A Banda, de Chico Buarque: pra ver a banda passar, cantando "coisas" de amor... Naquele ano do festival, no entanto, a coisa tava preta  (ou melhor, verde-oliva). E a turma da Jovem Guarda não tava nem aí com as coisas: “coisa" linda, "coisa" que eu adoro!

Para Maria Bethânia, o diminutivo de coisa é uma questão de quantidade afinal, são tantas "coisinhas" miúdas.  E esse papo já tá qualquer "coisa". Já qualquer "coisa" doida dentro mexe...

Essa coisa doida é um trecho da música "Qualquer Coisa", de Caetano, que também canta: alguma "coisa" está fora da ordem! e o famoso hino a São Paulo: "alguma coisa acontece no meu coração"!

Por essas e por outras, é preciso colocar cada coisa no devido lugar.

Uma coisa de cada vez, é claro, afinal, uma coisa é uma coisa; outra coisa é outra coisa.  E tal e coisa, e coisa e tal.

Um cara cheio de coisas é o indivíduo chato, pleno de não-me-toques.

Já uma cara cheio das coisas, vive dando risada. Gente fina é outra coisa.

Para o pobre, a coisa está sempre feia: o salário-mínimo não dá pra coisa nenhuma.

A coisa pública não funciona no Brasil. Político, quando está na oposição, é uma coisa, mas, quando assume o poder, a coisa muda de figura.

Quando elege seu candidato de confiança, o eleitor pensa: Agora a "coisa" vai... Coisa nenhuma! A coisa fica na mesma. Uma coisa é falar; outra é fazer. Coisa feia! O eleitor já está cheio dessas coisas!

Se as pessoas foram feitas para serem amadas, e as coisas, para serem usadas, por que então nós amamos tanto as coisas e usamos tanto as pessoas? Bote uma coisa na cabeça: as melhores coisas da vida não são coisas. Há coisas que o dinheiro não compra: paz, saúde, alegria e outras cositas más.

Mas, deixemos de "coisa", cuidemos da vida, senão chega a morte, ou "coisa" parecida... Por isso, faça a coisa certa e não esqueça o grande mandamento:

"AMARÁS A DEUS SOBRE TODAS AS "COISAS".

 

Entendeu o espírito da coisa?

abril 08, 2022

O QUE SE FAZ EM LOJA - Rui Bandeira


Talvez a pergunta que mais vezes não maçons fazem a maçons seja: “afinal o que é que os maçons fazem nas reuniões?”. Subjacente a esta pergunta está, muitas vezes, o pressuposto de que os maçons certamente levam a cabo secretas, mirabolantes e tortuosas atividades. Como todos os pressupostos infundamentados, que assim mais não são do que preconceitos, este não se aproxima, sequer minimamente, da realidade, que é muito mais simples e prosaica.

Há duas partes das reuniões de uma Loja Maçónica que são sempre fixas e iguais: a abertura e o encerramento, que se processam executando os respectivos rituais. São sempre as mesmas palavras, gestos e atos, que se repetem, reunião a reunião.

Com o ritual de abertura, efetua-se a transição entre a vida exterior, os afazeres pessoais e profissionais de cada um, e o labor de um grupo restrito, focado e fraternal. Assim se processa a concentração de todos e de cada um no trabalho que se vai realizar. Assim se cria a atmosfera de concentração, confiança e harmonia que deve envolver os trabalhos que se vão efetuar na reunião.

Com o ritual de encerramento, efetua-se a transição entre os trabalhos realizados e o prosseguimento da vida em sociedade. Assim se efetua o processo de retorno à vida do dia a dia. Assim se relembra que se vai sair de um círculo restrito, onde impera a confiança e a harmonia, rumo ao cadinho social onde todos nos inserimos, com todos os seus desafios, conflitos e necessidade de se estar com as defesas em guarda.

Entre os dois rituais, de abertura e encerramento, processa-se a verdadeira reunião, que pode, basicamente, ter como objecto trabalho ritual (iniciação de profano, passagem ou elevação de maçons a graus mais adiantados), trabalho de formação (apresentação e discussão de pranchas), trabalho administrativo (organização interna da Loja, arquivos, quotas, etc.) ou trabalho organizativo (de projetos ou atividades em curso ou a levar a cabo).

O trabalho ritual efetua-se executando, em palavras, gestos e atos, o ritual da cerimónia que se realiza. Cada um dos Oficiais de Loja tem uma função determinada, que executa. Quem não tem intervenção na execução do ritual, seja em que qualidade for, assiste.

O trabalho de formação consiste na apresentação e discussão dos variados trabalhos que os maçons efetuam. Em regra, textos, mas podendo ser trabalhos de outra natureza: música, pintura ou escultura, construção de artefatos, trabalhos fotográficos ou audiovisuais, enfim, tudo o que um maçom se tenha sentido com capacidade para criar e que possa contribuir para o seu aperfeiçoamento e o de seus Irmãos. Com este tipo de trabalho, busca-se atingir o objetivo primeiro dos maçons: melhorar, aperfeiçoar-se, crescer intelectual, moral e espiritualmente.

O trabalho administrativo é o mal necessário, a execução das tarefas que bem gostaríamos de não precisar fazer, mas que têm que ser feitas: determinar e debater todos os aspectos organizativos da Loja; tomar conhecimento da correspondência e providenciar quanto a ela; tomar conhecimento de comunicações de outras Lojas e da Grande Loja e determinar as providências a tomar; providenciar quanto ao arquivo, ao quadro de obreiros, à vida financeira e económica da Loja. Embora haja Oficiais cuja função é assegurar a execução diária das tarefas desta natureza (o Secretário, o Tesoureiro, o Arquivista), vai havendo necessidade de algumas decisões serem tomadas pela Loja ou de a Loja ser informada das decisões tomadas pelos Oficiais e dos procedimentos e escolhas por estes efetuados.

Finalmente, o trabalho organizativo é aquele cujos resultados podem ser apreendidos exteriormente à Loja. Por vezes, apenas nas famílias e amigos dos obreiros da loja, por vezes em círculos mais amplos ou na sociedade em geral. Ao longo do ano, as Lojas organizam diversos eventos, desde reuniões, passeios ou visitas, a organização de colóquios, conferências ou debates, desde efetivação de campanhas de recolha de fundos para solidariedade a campanhas de efetivação direta de atos de solidariedade.

No caso da Loja Mestre Affonso Domingues, esta tem efetuado, com regularidade, ações de doação de sangue, por vezes isoladamente, por vezes em colaboração com um grupo de escoteiros, organiza anualmente um leilão para recolha de fundos, procede à entrega de bens, adquiridos com os fundos obtidos, que a associação ou associações de solidariedade em cada momento apoiadas(s) indiquem como sendo os que maior utilidade no momento lhe(s) trazem, efetua contatos e visitas a outras Lojas e organiza a recepção a outras Lojas (particularmente em relação às duas Lojas com que está geminada, a Fraternidade Atlântica, da GLNF, e a Rigor, da GLLP/GLRP, organiza e efetua viagens e visitas a monumentos, museus e outros locais de interesse histórico, monumental, artístico ou cultural (nos últimos anos, e a título de exemplo, o Mosteiro da Batalha, o Convento de Cristo, a Zona Histórica de Santarém, Castelo Rodrigo, a Sinagoga de Lisboa), entre outras atividades e iniciativas, muitas vezes com início no voluntarismo de algum Irmão, que os demais acompanham, auxiliam ou em que colaboram.

Como se vê, o que se faz em Loja é muito mais prosaico do que concebe a imaginação, por vezes demasiado fértil, de quem está de fora. No fundo, em Loja faz-se o que se faz em qualquer outra agremiação: trata-se da organização interna, da prossecução dos objetivos próprios e cuida-se dos eventos que se leva a cabo.

O principal objetivo da Maçonaria é o aperfeiçoamento individual dos seus membros, fazer de homens bons homens melhores e, pelo reflexo desses aperfeiçoamentos individuais, contribuir para a melhoria da Sociedade. Cada reunião é mais um passo nessa caminhada, uma gota de suor nesse esforço, um tijolo nessa construção.

Muito simples e normal, talvez. Talvez dessa simplicidade e normalidade decorra a dúvida de que efetivamente seja SÓ assim. Percebo e compreendo o cepticismo que, afinal, radica num tácito elogio à Maçonaria. Esse cepticismo decorre da perplexidade: “Mas afinal se é só isso que se faz nas reuniões de Loja, o que torna a Maçonaria tão especial, qual o cimento que liga os seus membros, o que os faz retirar tempo às suas famílias, aos seus negócios, aos seus afazeres e ócios, para irem fazer só isso?”

A resposta não está tanto no que se faz , mas em COMO se faz e PORQUE se faz. Mas essas são já matérias para os próximos dois textos…


PAREM JÁ ESSA GUERRA ! - Adilson Zotovici




Adilson Zotovici é poeta e intelectual maçónico, membro da ARLS Chequer Nassif-169 de S. Bernardo do Campo


Oh quão triste, lamentável,

Os irmãos em desunião 

Face a guerra, deplorável,

Toda terra em comoção 


Que nada tem de precioso 

Nem de Davi ou de Arão 

Um cenário doloroso

Que em si ...destruição ! 


Duma cabeça que investe 

Por uma pífia razão 

Na insídia  que  se reveste 

De tamanha indignação 


Pela razão, pelo amor  

Parem a descida, a  regressão 

Ofendendo  a gente e ao Senhor

Antes da temida  aniquilação 


Vez que nessa ação urdida 

Esqueceram-se da Benção

Para sempre, toda vida, 

Como nos Montes de Sião ! 



abril 07, 2022

A LOJA E O MOVIMENTO DO SOL - Pedro Juk




Em 04.06.2014 o Respeitável Irmão Flávio Augusto Batistela, Coordenador Regional de Comunicação e Imprensa – 8ª Macrorregião – Grande Secretaria de Comunicação e Imprensa do GOSP – GOB, membro da Loja Solidariedade e Firmeza, 3.052, REAA, Oriente de Ouro Verde, Estado de São Paulo solicita esclarecimento sobre o que segue:

Gostaria que o Irmão explicasse o movimento do Sol, comparando com nosso Templo maçônico, a questão das Luzes da Loja não estarem na ausência de Luz (mas entendo que o 1º Vigilante está no Norte, total ausência de Luz). Gostaria de uma explicação melhor nesse sentido. Li um artigo sobre isso, e minha cabeça ficou cheia de dúvidas. Mais uma vez, obrigado.

Apreciação: 

Esse assunto é bastante complexo em se tratando como um todo na Maçonaria, isso devido à doutrina específica de um Rito. Assim, as ponderações que seguem estão relacionadas ao Rito Escocês Antigo e Aceito no seu simbolismo.

No Rito em questão a Loja (Templo) é um canteiro de obras simbólico cujo espaço representa um segmento sobre a linha imaginária do Equador terrestre. 

O retângulo da Sala da Loja é assim então orientado: seu comprimento de Leste para o Oeste, ou vice-versa e a sua largura de Norte ao Sul ou vice-versa. O nascente é o Leste, ou Oriente e o poente é Oeste ou Ocidente. 

A linha imaginária, em se tratando do Templo, divide o Ocidente em dois espaços que se denominam Coluna do Norte (esquerda de quem entra) e Coluna do Sul (direita de quem entra). O topo das duas respectivas Colunas é representado pelas paredes Norte e Sul entre a grade do Oriente e a parede ocidental (meridião), ou vice-versa (setentrião). 

Como o Canteiro (Loja) representa um segmento do planeta Terra, é dessa superfície que o Homem observa o movimento aparente do Sol em seus dois movimentos distintos – o diário e o anual. Obviamente, que o movimento é “aparente”, já que quem se desloca no espaço é verdadeiramente a Terra em relação ao Sol.

O movimento diário do Sol, ou sua marcha simbólica está representado em Loja no Ocidente pela circulação no sentido dos ponteiros do relógio toda a vez em que um Obreiro precise se deslocar de uma para outra Coluna (cruzando a linha imaginária). 

Ainda no que tange o movimento diário está à referência ao nascente, ou romper da aurora (Venerável), a passagem do Sol no meridiano (meio-dia – Segundo Vigilante) e o ocaso ou crepúsculo em direção à noite (meia-noite – Primeiro Vigilante).

Esse movimento diário na Loja simula, dentre outros, o dia de trabalho do Maçom. Como a Maçonaria é uma Obra de Luz, ela segue simbolicamente a marcha diária do Sol – giro dextrocêntrico (ombro direito para o centro em torno do Painel da Loja).

A aclamação H.'. na abertura da Loja nos Graus de Aprendiz e Companheiro representa a saudação ao Sol no seu romper diário. No encerramento é a saudação ao seu ocaso na certeza de que quanto mais escura é a madrugada (meia-noite), mais próximo está o raiar de um novo dia.

O movimento anual do Sol, ou a sua revolução anual. Sobejamente conhecida é inclinação e o movimento do planeta Terra (cerca de 23º em relação ao seu plano de órbita) na sua viagem em torno do Sol durante um ano.

Pelo maior ou menor afastamento do Sol de cada Hemisfério inclinado é que sobrevêm as estações ou os ciclos da Natureza – Primavera, Verão, Outono e Inverno - oposto conforme a semiesfera.

Sob o ponto de vista da Terra aparentemente o Sol se desloca em sua eclíptica(1) inclinando-se a partir do Equador mais para o Sul, ou mais para o Norte conforme o ciclo natural e, desse movimento aparente, devido à inclinação do Planeta, marcam-se as datas solsticiais(2), cujas particularidades apresentam dias e noites diferentes na sua duração (no máximo de afastamento do Sol do Equador) e as datas equinociais que proporcionam os dias e noites iguais na sua duração (Sol sobre o Equador - equidistante).

O máximo afastamento aparente do Sol da linha imaginária do Equador para o Norte tem o seu limite demarcado pelo trópico de Câncer e para o Sul pelo trópico de Capricórnio.

Os ciclos naturais, ou as estações do ano, estão astronomicamente demarcados pelo alinhamento da Terra por sua vez com as doze constelações do Zodíaco durante o seu movimento de translação em torno do Sol. Assim o Zodíaco (do grego zodiakós- relativo às constelações dos animais) significa a zona circular, ou faixa, pela qual passam à eclíptica e que contém as doze constelações que o Sol aparentemente percorre durante o ano.

Esses alinhamentos são divididos de três em três por quatro grupos distintos, cujo início do primeiro grupo se dá a 21 de março - equinócio de Primavera no Norte e Outono no Sul; o segundo grupo se dá a 21 de junho – solstício de Verão no Norte e Inverno no Sul; o terceiro grupo se dá a 21 de setembro – equinócio de Outono no Norte e de Primavera no Sul. Por fim o quarto grupo que se dá a entre 21 e 23 de dezembro – solstício de inverno no Norte e de Verão no Sul. Assim os quatro grupos compostos cada qual por três alinhamentos perfazem o número de doze, cujos grupos são conhecidos por estações do ano. Em número de doze os alinhamentos correspondem trinta dias, ou um mês, que se iniciam geralmente no dia 21 do calendário gregoriano. Daí o ano nesse caso se inicia em 21 de março (início da primavera no hemisfério norte) e se encerra no dia 20 de março do ano seguinte (fim do inverno no hemisfério norte) – calendário equinocial muito usado pela Maçonaria – sempre com base no hemisfério Norte.

Em um Templo maçônico do Rito Escocês Antigo e Aceito os elementos que sugerem esse movimento anual do Sol são representados pelas Colunas Zodiacais, pelas Colunas Solsticiais (B.'. e J.'.) e pela linha imaginária do Equador.

Em relação à Maçonaria esse movimento aparente do Sol, ou as estações do ano, simbolicamente sempre corresponde ao Hemisfério Norte por ser este berço da Maçonaria em geral e do Rito em questão em particular.

A Marcha do Sol na concepção iniciática dos três Graus simbólicos. As Colunas Zodiacais, particulares da simbologia e alegoria do Rito Escocês Antigo e Aceito, rito de origem francesa, representam os ciclos e a evolução da Natureza. Essa particularidade esta presente no arcabouço doutrinário do Rito porque compara a evolução e aperfeiçoamento do Homem à perfeição das Leis Naturais, cujos ciclos sugerem essa relação com a Primavera, com o Verão, com o Outono e com o inverno às etapas da vida humana – nascimento, infância-adolescência, juventude e maturidade.

As doze Colunas, seis ao Norte e seis ao Sul, divididas em grupos de quatro correspondem às estações do ano representadas pelas Constelações do Zodíaco (sobre os capitéis das doze Colunas). Comparado cada ciclo à transformação essa alegoria suportada pelos adereços simbólicos das constelações sugere também o Homem como elemento integrante da Natureza, o que representa em primeira instância uma espécie de teatro da vida – a Primavera (infância), o Verão (adolescência/juventude), o Outono (juventude/maturidade) e o Inverno a morte.

Essa alegoria baseada nos ciclos que se relacionam com as constelações visíveis conforme os momentos astronômicos da translação terrestre não é propriedade da Maçonaria, já que essas relações se apresentam desde a Antiguidade e serviram de base para que as antigas civilizações calculassem o espaço e tempo das previsíveis estações terrenas.

Essas constelações eram então imaginadas como deuses relacionados com animais (zodíaco) fixados no firmamento – Áries, Touro, Gêmeos, Câncer, etc., cuja afinidade com a evolução da Natureza e o Sol dera origem aos Cultos Solares da Antiguidade, base na grande totalidade das religiões hoje conhecidas, inclusive o Cristianismo.

Esse mesmo conceito alegórico através dessas Constelações e Colunas Zodiacais veio a servir para a Moderna Maçonaria e em particular para o simbolismo escocês. Assim os símbolos representativos desses corpos celestes passariam durante o segundo quartel do século XIX a integrar o Templo simbólico do Rito em questão, cuja referência da situação topográfica desses elementos em relação ao ponto de vista do Maçom é aquele de se estar posicionado no centro do Ocidente e sobre o Equador do canteiro (Loja).

Dessa posição, olhando para o Topo da Coluna do Norte (parede Norte) se localizam a partir do canto com a parede ocidental o primeiro grupo constituído pelas constelações Áries, Touro e Gêmeos (Primavera – 21/03 à 20/06) e, ainda nessa parede, o segundo grupo constituído pelas constelações de Câncer, Leão e Vigem (Verão – 21/06 à 20/09). Do mesmo ponto de vista, porém agora observando o Topo da Coluna do Sul (parede Sul) se localizam a partir da grade do oriental o terceiro grupo constituído pelas constelações de Libra, Escorpião e Sagitário (Outono – 21/09 à 20/12). Por fim e ainda nessa parede o quarto e último grupo constituído pelas constelações de Capricórnio, Aquário e Peixes (Inverno – 21/12 à 20/03).

Cabem aqui ainda duas observações, sendo que a primeira serve para ratificar que toda essa relação está para o hemisfério norte da Terra, enquanto que segunda lembra que as Colunas Zodiacais se localizam apenas nas paredes Norte e Sul do Templo, entre a parede ocidental e a grade do Oriente no Norte e vice-versa no Sul – Câncer estará sempre ao Norte e Capricórnio no Sul (razão pelo destaque em negrito no parágrafo anterior).

Dando então sequência às considerações, a senda (caminho) iniciática dos três Graus simbólicos encontra-se representada no encadeamento das Colunas Zodiacais, cujo arcabouço doutrinário relaciona simbolicamente o aperfeiçoamento humano com os ciclos perfeitos da Natureza. Assim, em linhas gerais comparativas, o Iniciado no teatro simbólico da Iniciação, após ter sucumbido no interior da Terra (Câmara de Reflexão) renasce na Primavera (morreu para renascer) tal qual a semente que germina após o inverno - o neófito (do grego: neóphytos = plantado recentemente).

Recém-renascido como a Natureza o Aprendiz em busca da Luz cumpre sua jornada pelo Norte, primeiro nas três Colunas iniciais (infância-primavera) e em seguida ruma para as outras três (adolescência-verão). Assim sendo, pelo topo do Norte (encostado parede setentrional) o Aprendiz encetou sua trilha iniciática no equinócio de Primavera e a terminou na adolescência e juventude coincidindo com o solstício de Verão.

Agora, recém-chegado à juventude o já Companheiro simula a sua passagem para a maturidade cruzando a linha do Equador (do Norte para o Sul – Elevação, ou para a perpendicular ao nível) até o Topo do Sul, passando pelas outras três Colunas (outono – maturidade). Por fim, ainda no meridião tal como o Sol na sua trajetória, o Companheiro incide nas três últimas Colunas (inverno – fim da vida), o que alegoricamente significa o encerramento de mais um ciclo perfeito, ou o morrer para renascer – a volta do Sol. O Exaltado morre para renascer no Oriente.

Em resumo essa marcha anual (movimento) aparente do Sol relacionada ao Maçom e sugerida no Templo pelas Colunas Zodiacais se inicia no equinócio de Primavera (renascer da Natureza) na constelação de Áries, percorre o topo do Norte até o solstício de Verão na constelação de Câncer. Encerrado o Verão o Astro Rei se precipita para o Sul, ou Meio-Dia na constelação de Libra no equinócio de Outono. Por fim o Sol ingressa no derradeiro ciclo pela constelação de Capricórnio no solstício de Inverno.

De modo iniciático essa evolução representa progresso do aperfeiçoamento humano como se os ciclos naturais, ou estações do ano se assemelhassem simbolicamente às etapas da vida – infância, juventude, maturidade e morte.

Assim, o Templo como palco desse canteiro de aperfeiçoamento suporta essas referências que envolvem a marcha do Sol com as suas das datas equinociais (primavera e outono) e as solsticiais (verão e inverno).

Os solstícios, além de também pertencerem ao contexto histórico operativo dos Canteiros Medievais (origem da Moderna Maçonaria) que inclusive envolvem as datas comemorativas de João, o Batista e João, o Evangelista, estão na doutrina do Rito Escocês, que é de origem francesa, representados pelas Colunas Solsticiais, ou Vestibulares B.´. e J.´. que marcam a passagem abstrata dos trópicos de Câncer, ao Norte e Capricórnio ao Sul. Entre os trópicos, ao centro está à linha imaginária do Equador, que vai do centro da porta de entrada até o Oriente em direção ao Delta.

Essa linha imaginária divide o Ocidente em duas bandas distintas. À esquerda de quem entra está a Coluna do Norte em cuja cumeada (parede) estão localizadas as seis primeiras Colunas Zodiacais, ou as Constelações pelas quais o Sol percorre na eclíptica partindo da Primavera até o Verão. À direita de quem entra está a Coluna do Sul, em cuja culminância (parede) estão situadas as seis últimas Colunas Zodiacais, ou Constelações pelas quais o Sol percorre na eclíptica seguindo do Outono até o Inverno.

No tocante ao simbolismo do Norte ser mais escuro é pela referência feita à Maçonaria relacionada ao seu berço de nascimento que é no hemisfério Norte. Assim essa relação implica que no hemisfério boreal quanto mais afastado se estiver do Equador, pela inclinação e curvatura da Terra, a Luz fica mais distante, o que é dito “mais escuro”, ou “menos Luz”, enquanto que sob o ponto de vista do Norte, o Equador mais ao Sul, aparenta ser mais iluminado, o que dá o título ao hemisfério Austral de Meio-Dia, ou Sul – quanto mais próximo do Equador, mais iluminado.

A regra de observação sempre do hemisfério Norte pode ser verificada no Painel da Loja de Aprendiz e de Companheiro, onde as “três janelas” (rota do Sol) se apresentam mais ao Sul, o que dá inclusive a posição do Segundo Vigilante na Coluna do Sul e caracteriza simbolicamente o topo do Norte, oposto ao Sul, como lugar onde a incidência de Lua é menor (veja a Pedra Bruta). Essa é a explicação para o “Norte mais escuro, ou menos iluminado”.

Obviamente esse é apenas um trato simbólico, já que pela esfericidade da Terra, aquele que estiver posicionado no Sul e quanto mais afastado estiver do Equador também receberá menos Luz, já que astronomicamente as situações se invertem conforme o hemisfério. Entretanto, como a Maçonaria é simbólica as suas relações doutrinárias e tradicionais estão relacionadas sempre ao Hemisfério Norte da Terra, salvo algum caso pertinente a um rito maçônico específico que tenha surgindo no Hemisfério Sul.

Ainda para ilustrar o movimento anual do Sol no escocesismo simbólico, observe-se o número de Luzes que compõem o lugar do Venerável e dos Vigilantes. Estas se constituem se somadas no máximo de “nove”, o que significa a falta de Luz nos três meses de Inverno – a Terra fica viúva do Sol. Em síntese significa a morte do Mestre, cuja revolução anual está na procura pelos “nove” Mestres do corpo assassinado (o Sol) pelos três meses de Inverno.

Toda essa alegoria do movimento do Sol, os Solstícios e os Equinócios é perfeitamente compreendida se bem observados os passos da Marcha do Terceiro Grau, cujos movimentos do eixo para os respectivos hemisférios (Colunas) representam o Sol em solstício de Inverno e Verão. Em linhas gerais a Marcha do Mestre representa o movimento anual do Sol enquanto que a Lenda do Terceiro Grau, desde que despida de opiniões ocultistas e proselitistas geralmente hauridas de apreciações pessoais, é verdadeiramente uma belíssima lição de aperfeiçoamento humano e de sociologia suportada pela ciência da moral e da ética.

(1) .Eclíptica – 1. Plano da órbita terrestre. 2. Círculo máximo da esfera celeste, que é a interseção da eclíptica (1) com esta.

(2) Solstício - Época em que o Sol passa pela sua maior declinação boreal ou austral, e durante a qual cessa de afastar-se do equador. Os solstícios situam-se, respectivamente, no dia 21 de junho para a maior declinação boreal, e no dia 21 ou 23 de dezembro para a maior declinação austral do Sol. No hemisfério sul, a primeira data se denomina solstício de inverno e a segunda, solstício de verão; e, como as estações são opostas nos dois hemisférios, essas denominações invertem-se no hemisfério norte.

TIC TAC - Newton Agrella


Newton Agrella é escritor, tradutor, um dos mais notáveis intelectuais da maçonaria no Brasil


É para ficar pensativo quando nos deparamos com a instigante expressão:

"...Vamos fabricar relógios e não dar a hora certa..."

Ora, todos temos o direito de saber o horário das nossas atividades, dos deveres e obrigações que nos aguardam, do respeito por aqueles que nos esperam e claro, a noção relativa do periodo daquilo que começamos e terminamos.

Porém, nada justifica tornarmo-nos escravos e submissos ao nosso prazo de validade, tampouco permanecermos monitorando cada fração de segundo que se vai...

Nossa existência é exclusiva por si só , uma vez que ela não se resume a uma fugaz experiência material, corpórea ou material.

Somos bem mais que isso.

Dispomos do espírito e da razão, que somadas à inteligência compõem uma propriedade única e consistente que nos conduz à chamada "consciência".

Esta sim, é a verdadeira manifestação humana e anímica que nos conecta com o Principio Criador e Incriado do Universo.

Especular o quanto de tempo vamos viver esta experiência presente, não é um atributo de nossa competência.

Nosso propósito é aprender "como viver" e de que maneira podemos aperfeiçoar o nosso interior, além de praticar e compartilhar a Virtude com todos os que estão à nossa volta.

Fabricar relógios é um exercício inspirado na contemplação de um objeto de estilo, requinte, elegância e até mesmo de status social.  Para por aí !

Sob a égide dialética, contudo, "dar a hora certa", encerra uma idéia que transgride a nossa capacidade existencial.

A hora certa não é minha, dele, dela ou nossa. Ela é simplesmente a propriedade geral da exterioridade do pensamento.

O ser humano, pela sua condição mortal, sob o ponto de vista físico, é impactado pelo tempo de maneira diferente da do espaço. 

Dado o seu caráter de irretroatividade, ciclicamente contido na idéia constante de Passado, Presente e Futuro, o tempo tem o poder de causar angústia pelo fim desconhecido.

Segundo o filósofo grego Platão, há no mito do eterno retorno, onde o tempo simboliza um movimento cíclico.

O conceito deste mito, apesar de extinguir o peso do passado e da vida, encerra o homem nas suas possibilidades e ações factível e imagináveis, bem como no empreendimento de sua liberdade.

Fica um convite para que ao olharmos para os ponteiros do relógio, nos detenhamos sobretudo na forma e sofisticação de seu design, deixando um pouco de lado a preocupação impronunciável de seu destino.


abril 06, 2022

AS ORIGENS DA MAÇONARIA ESPECULATIVA - Ir∴ Antonio Rocha Fadista.



Para pesquisar este complexo tema faz-se necessário examinar algumas lendas enraizadas no imaginário maçônico, para as quais não existe nenhuma comprovação documental.

A primeira delas descreve o nascimento da Maçonaria Especulativa como sendo a descendente direta da Guilda de Ofício correspondente, que teria deixado entrar os não operativos ou aceitos em suas Lojas.

Estes novos membros acabariam por dominar a guilda de ofício, não só em número, mas também na sua administração, transformando-a na organização maçônica que conhecemos a partir de 1717.

Sem dúvida, a Maçonaria moderna muito deve à instituição chamada de Venerável Companhia dos Maçons Livres da Cidade de Londres, como era chamada nos documentos oficiais, a corporação que reunia os que praticavam a arte de construir. Não é sem razão que a instituição atual é a sua sucessora, quase sem mudanças, no nome e em muitos dos seus princípios de governo.

A Maçonaria atual herdou nos nomes dos Oficiais e Dignitários mais importantes, o método de auto sustentação financeira, a taxa de admissão, e outros usos, A bem da verdade, estes usos eram típicos de todas as corporações medievais, Entretanto, tudo isto não explica por quê os não operativos teriam solicitado a sua admissão, especificamente nesta corporação de oficio.

Uma explicação inicial, que Anderson foi buscar na antiguidade, consistiria no fato de que a admissão à corporação era atrativa em termos de “status social”, ou seja, por ser um ”símbolo de distinção”, como atualmente o é a admissão em associações do tipo Rotary ou Lions Clubs.

Assim sendo, tratar-se-ia da atração que uma Companhia de Ofício, rica e poderosa, teria exercido sobre os homens que profissionalmente não pertenciam à corporação. Na realidade, isto é altamente improvável. De fato, devemos considerar que já no inicio do séc. XVII a Companhia de Ofício tinha perdido toda a sua importância e poder efetivo (causada pela falta de grandes obras, geralmente patrocinadas pela Igreja, cujo prestigio e poder econômico estava em decadência e já não era o mesmo da alta Idade Média).

Qual seria então a atração que uma corporação em declínio poderia exercer sobre homens em busca de realizar suas ambições sociais?

Uma segunda explicação sustenta que os não operativos foram atraídos para a corporação devido aos segredos esotéricos que esta possuía. Aqui também, devemos ressaltar que não existe nenhum documento das lojas operativas que ateste a existência de qualquer tipo de mistério que não fosse aquele ligado aos segredos de profissão, do mesmo tipo que se podem encontrar em qualquer outra corporação do gênero.

A propósito, recordamos a suposta existência, na Inglaterra, de um grupo da chamada sobrevivência operativa, com um ritual com sete graus, que dividiam os Irmãos conforme o grau, em maçons do esquadro e maçons do arco, hipótese tão cara a René Guénon, o que é uma mistificação que apareceu e logo desapareceu no inicio do séc. XX.

No que se refere à assim chamada Compagnonage, organização que só existiu na França, e na qual os Maçons não tinham a predominância, sabe-se que a sua parte ritual e esotérica é posterior à da Maçonaria Especulativa.

Quanto aos famosos Mestres Comacinos, não existem documentos que atestem que tenham existido sob a forma de corporação. Os éditos longobardos que os mencionam são dos séc. VII e VIII, enquanto que os sistemas corporativos, com os seus juramentos, só aparecem no início do séc. XII (O Estatuto de Bolonha, de 1248). Os artigos dos éditos de Rotari e de Luitprando, falam somente dos regulamentos a serem aplicados nos casos de eventuais acidentes no exercício da profissão de construtor. Falam também das compensações a serem atribuídas aos acidentados ou às suas famílias. Por outro lado, não se encontra nestes éditos nada que possa sugerir algo de misterioso ou de esotérico na profissão dos Mestres Comacinos.

Também não é conhecido nenhum documento medieval das Guildas de Ofício que mencione qualquer forma de ensinamento esotérico, partilhado por seus membros. Especificamente em relação à Inglaterra, ninguém que já tenha lido os manuscritos Regius, Cooke, etc. encontrou neles quaisquer segredos, a não ser os relativos à profissão, a par de uma forte influência cristã, além da atenção dispensada aos problemas práticos, econômicos e referentes à administração do pessoal operativo.

Assim sendo, não se conhece nenhum documento que contenha referências àqueles que são os pontos fundamentais do esoterismo maçônico atual, ou seja: Palavras, Sinais, Toques, a Lenda do Terceiro Grau ou similares. Na realidade, todos os documentos afirmam exatamente o oposto, isto é, que só depois do ingresso dos membros não operativos, no séc. XVII, foi que começaram a encontrar-se indícios de que algo misterioso estava acontecendo no interior da corporação. A propósito, mencionamos algumas datas:

Já nos anos de 1520/21 os registros contábeis da corporação mencionam pagamentos efetuados por alguns membros e oficiais operativos, que tinham sido feitos maçons aceitos. É de ressaltar que nesta altura alguns membros aceitos eram já membros “ativos e quotistas” da Corporação de Ofício (embora a primeira admissão oficial, na Saint Mary’s Chapell Lodge, só tenha sido registrada em 1600).

Deste modo, estamos diante de acontecimentos exatamente opostos àqueles que sempre se supôs acontecerem, isto é, que são os membros operativos que são admitidos entre os Aceitos, e não o inverso. De tal fato, podemos supor a existência de uma estrutura organizada e independente. Assim, fazer parte da organização operativa não significava pertencer automaticamente à organização especulativa.

Outro fato significativo é que nos anos de 1655/56 a Companhia de Ofício decidiu retirar a palavra “freemasons” (Pedreiros Livres) de seu título, passando a chamar-se somente Companhia dos Maçons. Este fato permite supor que a mudança no nome da Companhia de Ofício visava oferecer cobertura a uma nova organização surgida em seu interior.

O certo é que os primeiros sinais dos não operativos são todos posteriores ao início do séc. XVII. Na Escócia, em Edimburgo, os primeiros sinais aparecem em 1634. Em Atchison”s Haven, em 1672, 1677 1693. Em Kilwinning, em 1672 e em Aberdeen, em 1670. Na Inglaterra, já em 1621 os registros comprovam a existência de uma Sociedade de Maçons, em conjunto com a corporação de ofício regular. Esta nova sociedade recebia capitações dos maçons Aceitos, tanto dos construtores de ofício, quanto dos que não tinham nenhuma relação com a profissão.

Deste modo, é pode-se perfeitamente admitir que durante o séc. XVII tenha sido constituída uma fraternidade oculta, dentro da corporação profissional. Os seus membros ditos Aceitos seriam os efetivos possuidores do esoterismo e da maior parte da ritualidade que nos é hoje conhecida. Os membros desta nova fraternidade foram gradativamente assumindo a sua condição maçônica perante o público externo, a partir da segunda metade do mesmo século.

A partir deste ponto, devemos procurar as origens deste novo grupo, a possível data de sua constituição, os seu conteúdo filosófico e esotérico, os seus fundadores, e o motivo pelo qual decidem ocultar-se dentro da corporação dos construtores.

Todos os pesquisadores concordam em que o esoterismo maçônico, com a sua tradução em rituais, símbolos e ensinamentos, é uma criação desenvolvida ao longo de algumas dezenas de anos, e é obra dos Especulativos. Quem seriam os homens que possuíam este tipo de conhecimentos ? Sem dúvida, eram homens de condição social média/alta, pertencentes à burguesia iluminada e que, nos dias de hoje, poderiam ser chamados de “liberais”.

Eram pesquisadores e estudiosos das culturas da antiguidade, colecionadores de manuscritos e de livros raros. Muitos se tornaram membros da Sociedade Real (Royal Society). Fazia também parte do seu projeto social a difusão do conhecimento científico, visando melhorar as condições de vida das populações mais humildes. Sob o ponto de vista religioso, numa época conturbada da história da Europa ( a Inquisição ) estes homens manifestavam uma forte tendência para a tolerância, a partir de um forte teísmo do tipo judaico-cristão.

Características muito importantes são as relações que muitos deles tinham com os sobreviventes do movimento Rosa-cruz da Alemanha, que se refugiaram na Inglaterra depois da dissolução do reino da Boêmia, em 1619. Os primeiros documentos que atestam a existência dos Aceitos, são datados de dois anos depois, isto é, de 1621. Deve-se notar que a Inglaterra era, na Europa de então, o único país que os colocaria a salvo dos processos e dos autos de fé da Inquisição Católica.

Mesmo na Inglaterra a situação político-religiosa estava em transição, e ainda era bastante perigosa a divulgação dos conhecimentos esotéricos, filosóficos e sociais que os haviam inspirado. Nestas condições, era bastante atraente a oportunidade de se ocultarem dentro da organização, de modo a resguardar a permanência do conhecimento não ortodoxo, bem como a sua transmissão, de modo velado. O simbolismo geométrico arquitetônico era utilizado para exprimir o conteúdo do conhecimento esotérico e filosófico.

Assim, nada melhor para assegurar a continuidade da transmissão velada deste conhecimento do que a utilização de uma corporação de ofício, em declínio e de fácil manejo. Deste modo, a mensagem rosa-cruz foi introduzida na corporação dos maçons operativos ingleses, com a criação de rituais que asseguraram a sua sobrevivência e a sua transmissão futura.

Como já dito, estes rituais – Aprendiz e Companheiro – foram sendo desenvolvidos durante todo o séc. XVII e início do séc. XVIII. Não se conhecem com exatidão as datas em que foram concluídos estes rituais, por dois motivos: em primeiro lugar, os rituais não eram escritos. Em segundo lugar, porque eram escassos os registros das reuniões das Lojas. Os registros existentes das reuniões deste período referem-se, basicamente, aos aspectos administrativos das reuniões. Jamais, em relação aos aspectos ritualísticos.

A mensagem rosa-cruz tinha duas componentes: uma exotérica e outra esotérica. A primeira é facilmente reconhecida, e ainda hoje é uma das colunas de apoio do ensino maçônico. Propõe a tolerância religiosa, a ação social em favor dos necessitados, a difusão da cultura, a preferência pelos sistemas democráticos de governo, a aversão por toda a forma de despotismo, o compromisso com o social em todas as suas formas, e a obrigação de manter um comportamento ético irrepreensível.

A componente esotérica e metafísica começa a ser conhecida com o aparecimento dos Aceitos. Inicialmente se tem conhecimento da expressão “Palavra Maçônica”, cujo significado era desconhecido, e cujo segredo os Aceitos defendiam de maneira quase feroz. A esse respeito, Henry Adamson escreveu em 1638: “Nós temos a Palavra Maçônica e a segunda vista”. Henry Home assim se expressava em 1640: “Existem muitas palavras e sinais Maçônicos que vos serão revelados e de cujo segredo vos pedirei contas diante de Deus, no grande e terrível dia do Juízo Final. Deveis manter sempre o segredo sem revelá-lo a ninguém, a não ser aos mestres e companheiros da Sociedade dos Maçons”.

Além disso, encontramos referências nos juramentos de que essa Palavra jamais devia ser escrita, nem sequer na areia, sob pena de terríveis punições. Assim, parece certo que esta palavra devia consistir de algum tipo de conhecimento que nunca foi revelado. Neste ponto, é inequívoca a influência rosa-cruz.

Vejamos ainda alguns pontos que ajudarão em nossas conclusões. Sem imitar o trapalhão Ragon, analisemos as características do maçom aceito mais conhecido do séc. XVII. Referimo-nos a Elias Ashmole, iniciado em Warrington a 16 de outubro de 1646, aos 29 anos, como consta em seu próprio diário, no qual o termo usado não é “iniciado”, mas “aceito”. Em outro de seus diários ele escreveu, a 13 de maio de 1653, que o seu padrinho na Ordem, o senhor Blackhouse, lhe revelou no leito de morte, por sílabas, o nome da matéria da Pedra Filosofal. Em 1663, Ashmole tornou-se membro da Sociedade Real.

O segundo ponto a ressaltar consiste nas freqüentes referências, nos rituais, à assim chamada Lenda Críptica e às suas conexões com o simbolismo do Templo de Salomão. Convém lembrar que o ritual maçônico do grau de Aprendiz, praticamente na forma em que o conhecemos, foi desenvolvido e aperfeiçoado ao longo da segunda metade do séc. XVII e, provavelmente nas primeiras décadas do século seguinte.

Devemos também lembrar que a definição de Deus como Grande Arquiteto do Universo não é, como se poderia pensar, de origem maçônica, mas sim de uma antiga versão de uma lenda Alquímic0/Rosa cruz. L”Andréa, conhecido por ter divulgado os Manifestos Rosacruzes em Londres, já usa esta expressão em um trabalho de 1623. Portanto, muito antes do desenvolvimento dos rituais maçônicos.

No que se refere ao sistema ritual que contém o Real Arco, muito apreciado pelos maçons, deve-se ressaltar que a lenda críptica é repetida, em várias versões, e que as referências alquímicas nos graus superiores ao terceiro são bastante explícitas, sem esquecer que um dos graus mais importantes do sistema é o Príncipe Rosa-Cruz.

Os argumentos acima expostos permitem concluir que o ensinamento dos Aceitos tem por base os conhecimentos alquímicos dos rosa-cruzes, com todas as suas consequências filosóficas e metafísicas.

Assim, concluímos também que o conhecimento esotérico e ocultista esteve presente nos primórdios da Instituição Maçônica atual e que a evolução do ritual e do simbolismo, ocorrida ao longo do séc. XVII e início do séc. XVIII, foi a maneira encontrada para manter vivo e compreensível todo este acervo de conhecimentos, cujo objetivo maior é o aperfeiçoamento moral e espiritual do ser humano.

BIBLIOGRAFIA

Freemasonry - Bernard Jones

The Compagnognage and the Craft - C.N. Batham

Historiae Patriae Monumenta - Edita Langobardorum

Medieval Masters and their Secrets - W.W. Conery-Crump

Speculative Masonry - Harry Carr

The Transition from Operative to Speculative Enlightenment - F.A. Yates The pre-eminence of the Great Architect in Freemasonry - R.H.S. Rottenburg