Na maioria dos Ritos, Tubalcaim só é mencionado no Grau de Mestre, mas em outros já é mencionado desde o Grau de Aprendiz (Ritos Adonhirmita e Moderno)
Segundo uma lenda pouco conhecida pelos próprios Maçons, Tubalcaim certa vez surgiu diante de seu descendente Hiram Abif para informar-lhe sua genealogia, a genealogia dos descendentes de Caim. Essa lenda maçônica absorve a tradição talmúdica judaica e a do Sepher-ha-Zohar, e coincide em muitos pontos com o relato bíblico de Gênesis, dele diferindo em outros.
Conta a lenda, que Tubalcaim leva Hiram Abif até o centro da Terra e relata-lhe a tradição dos ferreiros mestres do fogo, dos descendentes de Caim, os cainitas:
Para melhorar as condições de vida de sua família, expulsa do Éden e entregue à própria sorte, Caim, sozinho, dedicava-se à agricultura, trabalhava a terra, semeava, cultivava, colhia e realizava penosamente todas as demais tarefas decorrentes.
Enquanto isso, seu irmão Abel, indolentemente deitado sob a sombra de uma árvore, contentava-se em vigiar os rebanhos que apascentavam e se reproduziam livremente.
Caim oferecia a Deus sacrifícios de frutas, trigo e outros produtos resultantes de seu penoso trabalho. Abel, ao contrário, oferecia em holocausto sacrifícios cruentos dos “primogênitos das suas ovelhas e da sua gordura” (Gênesis 4:4).
Enquanto a fumaça dos sacrifícios de Abel elevava-se em rolos aos céus, a de Caim espalhava-se pela terra, revelando a preferência de Deus pelos sacrifícios de sangue, pelas oferendas docilmente obtidas sem qualquer esforço de Abel, desdenhando os sacrifícios não cruentos, mas obtidos do trabalho penoso e do instinto criador de Caim.
Inconformado com tal preferência, pondo em dúvida a autoridade e o senso de justiça de Deus, Caim matou seu irmão.
Na edição de 20/12/1988, o jornal O Globo veiculou a notícia, sob o título O Primeiro Crime da História, de que no dia 18 daquele mês, em Veneza, Itália, fora realizado um tribunal simulado – integrado por 9 membros, entre os quais um padre e um rabino, além de estudiosos da Bíblia, historiadores, magistrados e criminalistas – que, após 10 horas de julgamento, resolveu absolver por 5 votos contra 4, Caim da acusação de crime premeditado contra seu irmão Abel.
Segundo o juiz, “Caim era um rapaz impulsivo, dono de caráter muito forte, e matou Abel por uma questão de emotividade humana”.
Voltemos à Lenda:
Após a morte de Abel, Adão e Eva tiveram outro filho, por nome Sete (Gênesis 4:26), de mesma índole contemplativa e dócil de seu falecido irmão.
A partir daí, a humanidade se dividiu em duas distintas linhagens: a dos setitas, descendentes de Sete, e a dos cainitas, descendentes de Caim.
E Caim então se uniu a Lebuda e gerou Enoque (Gênesis 4:17), que ensinou os homens a talhar a pedra, reunir-se em sociedade e construir seus edifícios.
E Enoque gerou Irade (Gênesis 4:18), que conseguiu aprisionar as fontes e conduzir as águas fecundas.
E Irade gerou Meujael (Gênesis 4:18), que ensinou os homens a arte de trabalhar o cedro e todas as madeiras.
E Meujael gerou Metusael (Gênesis 4:18), que inventou a escrita.
E Metusael gerou Lameque (Gênesis 4:19), que se uniu a Ada e a Zila.
Com Ada, Lameque teve dois filhos: Jabal e Jubal.
Jabal foi o pai de todos os que habitam em tendas e têm gado (Gênesis 4:20), pois foi quem ergueu a primeira tenda e ensinou os homens a coser a pele dos camelos.
Jubal foi o pai de todos os músicos, pois foi quem primeiro produziu sons harmoniosos da harpa e do cinor (Gênesis 4:21).
Com Zila, Lameque também teve dois filhos (Gênesis 4:22): Tubalcaim e Naama.
Naama, que significa doçura, idealizou a arte da fiação.
Tubalcaim foi quem ensinou aos homens as artes da paz e da guerra e a ciência de transformar os metais; foi o mestre de toda a obra de cobre e de ferro (Gênesis 4:22), de acender as forjas e soprar os fornos.
Tal como Noé salvou a si e a sua descendência setita das águas do Dilúvio construindo uma arca, Tubalcaim construiu galerias subterrâneas na montanha de Kaf, salvando a si e a sua linhagem cainita.
Escoadas as águas, Tubalcaim uniu-se à mulher de Cão, filho de Noé, gerando Cuse.
E Cuse gerou Sebá, Havilá, Sabtá, Raamá, Sabtecá e Ninrode (Gênesis 10:7-8), sendo que este último tornou-se mestre da caça e poderoso na terra, reinando sobre Babel, Ereque, Acade e Calne, na terra de Sinear; e em Nínive, Reobote-Ir, Calá e Résen, na terra Assíria (Gênesis 10:8-12).
Hiram Abif, descendente de Tubalcaim e, tal como ele, um metalúrgico hábil em trabalhos com todos os metais, é apresentado a Salomão por Hiram, Rei de Tiro, como um “filho da viúva” (I Reis 7:13).
Tubalcaim conta ainda a Hiram Abif que Balkis, a Rainha de Sabá, com quem se unira secretamente durante sua estada em Israel, é igualmente uma cainita. Com a morte de Hiram Abif, o fruto de sua união com Balkis, a Rainha de Sabá, será também um “filho da viúva”.
Salomão, como seu pai David, era descendente de Sete e dotado de grande sabedoria. Contudo, foi incapaz de realizar o projeto do templo, pedindo o auxílio de Hiram, Rei de Tiro, da linhagem de Caim, que com sua força e iniciativa, possibilitou a concretização do projeto, nomeando Hiram Abif, de sua confiança, e, como ele, cainita, como executor e responsável por todas as obras do templo.
A Sabedoria não realiza obras sem a Força. A Força não realiza obras sem a Sabedoria. A Sabedoria planeja e a Força executa. A Sabedoria e a Força, o planejamento e a execução, realizam obras, mas dependem da Beleza, da moral, da ética, para que o trabalho possa ser considerado Perfeito.
O Templo de Salomão, portanto, não era tão-somente um edifício erguido para se cultuar a Deus, como pretendiam os setitas. Para os cainitas, o Templo de Salomão era o paradigma de uma obra Perfeita, de um grande ideal, a representação do Universo e do Homem.
Assim, cainitas e setitas, durante a construção do templo, se uniram, cada qual em torno de seu objetivo, e encobriram suas inconciliáveis diferenças.
As duas linhagens sempre viveram e continuarão a viver em oposição. Seus arquétipos são perfeitamente identificáveis:
Os setitas constituíram o sacerdócio e tornaram-se os guias espirituais da Sabedoria Divina. Vivem pela Fé e não pelas obras.
São dóceis, disciplinados, conservadores, desprovidos de ambição, contemplativos e sugestionáveis.
Pregam o abandono do mundo perverso e a busca do consolo divino. Como Mestres da Magia, tornaram-se hábeis no uso da linguagem, sobretudo para invocações, rogando aos céus pelos trabalhadores, a fim de deles obter o seu sustento.
Os cainitas desenvolveram as ciências, as artes, o comércio e a indústria. Com sua força e energia, transformaram o mundo e alcançaram a Sabedoria Terrena. Vivem pela Razão e pelas obras que realizam.
São agressivos, indisciplinados, progressistas, ambiciosos, criativos, dotados de grande iniciativa e rebeldes a qualquer tipo de sujeição, humana ou divina. Como Mestres da Razão, formaram operários hábeis na consecução das obras que lhes permite sustentar a si e aos que deles dependem e adquiriram o poder temporal, promovendo o bem-estar da humanidade pela conquista do mundo material.
Todavia, os descendentes de Caim ficaram presos ao corpo físico e perderam a visão espiritual.
Um dia, esses “filhos da viúva”, condenados a vagar na semi-obscuridade do mundo material, baterão à porta de um templo maçônico.
Serão desprovidos dos metais que representem luxo ou riqueza.
Ficarão seminus e totalmente cegos.
Viajarão ao centro da Terra onde conhecerão a si próprios.
Morrerão para a sua antiga existência profana e renascerão para uma nova vida, regenerados e purificados pelos quatro elementos.
Lhes será perguntado o que procuram e responderão “a Luz”.
E a Luz lhes será dada.
E se transformarão em filhos da Luz.
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Do livro *Personagens Bíblicos da Maçonaria Simbólica* do Irm.’. Almir Sant’Anna Cruz