junho 10, 2023

O POEMA REGIUS E O SEGREDO - Almir Sant’Anna Cruz


O Poema Regius, Manuscrito Regius ou Documento Halliwell, que se acha atualmente no Museu Britânico de Londres, foi manuscrito entre 1356 e 1450 e encontrado em 1839 na Régia Biblioteca do Museu Britânico de Dnodes pelo antiquário inglês não maçom Orchard Halliwell.

Trata-se de uma compilação dos antigos regulamentos, de data incerta, dos talhadores de pedra (Maçons), apresentada em 33 folhas de pergaminho, numa bela escrita gótica e sob a forma de um poema de 790 versos, para que os operários analfabetos pudessem facilmente decorá-los.

Seu autor foi provavelmente um clérigo com conhecimento de vários antigos documentos relativos à história da Ordem, pois, naquela época, os letrados eclesiásticos assumiam frequentemente as funções de secretário nas Lojas dos Maçons operativos, ou seja, foram os primeiros Maçons aceitos.

Presume-se também que o autor tenha sido encarregado de redigir um manual com as lendas do ofício e as regras da fraternidade, compilando-as das que já eram usadas nas assembleias dos Maçons. 

Está dividido em nove seções (três vezes três).

A terceira seção compreende quinze Pontos, sendo particularmente interessante o terceiro, que impõe o segredo profissional, provável embrião do segredo maçônico: 

*Os conselhos de seu Mestre devem ser guardados e não revelados, assim como os conselhos de seus Companheiros. Não revelar a ninguém o que se passa na Loja O que ouvir ou que veja fazer deve ser guardado em seu coração. Não dizer a ninguém, onde quer que vá, os conselhos da sala e os conselhos da câmara. Guardar os segredos com a maior honra, temeroso de que os revelando se torne culpável e, com sua falta, seja motivo de opróbrio para o ofício*


Excertos do livro *O que um Mestre Maçom deve saber*Interessados no livro contatar o autor, Irm.’. Almir, no WhatsApp *(21) 99568-1350*

junho 09, 2023

A IMPORTÂNCIA DO RITUAL - Rui Bandeira





Meus Irmãos, saúdo-vos fraternalmente, em todos os vossos graus e qualidades.

A suspensão dos trabalhos presenciais por virtude da pandemia em curso revelou-nos a falta que o Ritual, a execução do Ritual, nos faz. É essa a natureza humana: muitas vezes só nos damos conta do que é importante quando o não temos. Mas não é sob esta perspetiva que escolhi expor a Importância do Ritual. Vou procurar incidir a nossa atenção sobre a razão por que o Ritual é importante, porque só tendo-se essa noção é que nos apercebemos completamente da importância do mesmo.

Começo por fazer uma afirmação que aparentemente não tem nada a ver com o tema e que é – como todas! – discutível, mas cujo mérito vos peço que julgueis apenas no final desta nossa conversa: a Maçonaria não se ensina, aprende-se!

Não quero com esta afirmação dizer que os mais experientes não devem partilhar com os mais novos o que aprenderam, o que sabem. Com esta frase, enfatizo que, em Maçonaria, o que é importante, não é o que se transmite, mas antes o que se apreende. Porque a experiência, a vivência, a personalidade, do que transmite são diferentes das do que recebe. Assim, o que verdadeiramente interessa não é o que se ensina, se partilha, se transmite. O que importa é o que se aprende e, mais do que isso, o que se apreende, o que se interioriza. E aquelas e estas não são necessariamente - atrevo-me mesmo a dizer que raramente são - a mesma coisa. E, bem vistas as coisas, é inevitável que assim seja, pois, como já há pouco referi, o que transmite e o que recebe têm personalidades, vivências, capacidades, características diferentes. Assim, o que transmite tem necessariamente uma noção diversa do que aquele que recebe. Este, daquilo que é transmitido, receberá o que, na ocasião, estiver apto e pronto a receber, será tocado pelo que, no momento, o sensibilize. Em suma, o que ficará é o que ele aprende e apreende, não o que o que transmitiu julga que ensinou…

Não tenho, portanto, a pretensão de ensinar nada! Tenho apenas a esperança de que, da maçada a que agora vos submeto, cada um de vós retenha algo de útil.

Em meu entender, para uma correta abordagem da importância do ritual impõe-se que previamente distingamos entre Conhecimento e Sabedoria. O Conhecimento é tudo aquilo que aprendemos e estamos aptos a utilizar, quando necessitemos. A Sabedoria é algo mais profundo. Baseia-se, é um facto, nos conhecimentos que adquirimos. Mas reside na intuição, na capacidade adquirida de, relacionando tudo o que conhecemos, daí selecionar o que efetivamente importa, o que é adequado para um momento específico, uma situação concreta. Nem sempre aquele que tem mais conhecimentos é o que tem a sabedoria necessária para escolher a via justa, a palavra indicada, o gesto preciso, a atitude certa perante uma dada situação concreta. Numa muito grosseira aproximação, poderíamos dizer que a sabedoria resulta do conhecimento sublimado pela experiência. É através dos êxitos e fracassos na nossa escolha na utilização dos nossos conhecimentos que sublimamos o nosso Conhecimento em Sabedoria, que passamos do Conhecer ao Saber.

Memoriza-se e utiliza-se o que se conhece; desenvolve-se e internaliza-se o que se sabe.

O meio privilegiado para rápida aquisição de Conhecimento é o Estudo. Para se chegar à Sabedoria é preciso tempo e vivência. Mas há um meio para acelerar esse percurso, para induzir a Sabedoria: a utilização, execução e prática do Ritual. Se o Estudo é um meio de aquisição de Conhecimento, o Ritual é indutor de Sabedoria.

Com efeito, o Estudo estimula, faz funcionar, desenvolve a Inteligência Racional. Mas o Ritual, a sua prática, esse, estimula e desenvolve a Inteligência Emocional. E esta é bem mais profunda do que aquela, pois combina o conhecimento, o raciocínio, com a Intuição. O que estudamos pode não nos tocar e dar-nos apenas, pela memorização, a ferramenta necessária para agir. Mas só o que nos toca, nos emociona, efetivamente guardamos para saber como utilizar a ferramenta. A ferramenta é útil, mas saber utilizá-la pela melhor forma é indispensável…

Para entendermos porque e como o Ritual e o seu exercício estimulam a nossa Inteligência Emocional e, logo, induzem a obtenção de Sabedoria, devemos ter presente que, nos primórdios da Humanidade, quando ainda não tinha sido inventada a escrita – e muitas e muitas gerações de humanos viveram sem que houvesse escrita… -, a aquisição de conhecimentos e o acesso à Sabedoria processavam-se através da Tradição Oral. Era exclusivamente por essa via que os mais velhos e os mais experientes transmitiam o que sabiam aos mais novos e sem experiência.

Não havia então propriamente aulas, nem escolas. Os mais velhos e experientes diziam o que tinham aprendido, executavam perante os mais novos os gestos que era necessário fazer, repetiam, uma e outra vez, e faziam repetir muitas e muitas vezes, as palavras, os gestos, os atos de que dependiam, tantas vezes, a alimentação, a segurança e a sobrevivência, não só individuais como do grupo.

Ora, repetir uma e outra vez as mesmas palavras, para transmitir as mesmas noções, executar muitas e muitas vezes os gestos e as ações adequados para a obtenção dos resultados pretendidos mais não é do que… executar um ritual! Um Ritual é um conjunto de palavras, gestos e atos proferidas e executados sempre da forma similar.

Então, nos primórdios da Humanidade, aprendia-se e vinha-se a saber através da repetida execução de rituais. Era pelo que se via, pelo que se ouvia, pelo que se executava, pelo que exaustivamente se repetia, que se entranhava em cada um o que fazer e como fazer para obter alimento, para garantir segurança, para melhorar e curar maleitas, para adquirir o conforto possível.

Os rituais aprendidos e executados propiciavam, assim, a sabedoria necessária para sobreviver e viver o melhor possível.

O cérebro humano foi portanto, desde muito cedo, formatado em primeiro lugar para reagir aos estímulos visuais e auditivos.

Só mais tarde, muito mais tarde, o cérebro humano adquiriu a capacidade e habilidade de decifrar o código da escrita. A criação da escrita foi um avanço civilizacional imenso. Permitiu registar o que se tinha por importante, aquilo que anteriormente tinha de ser adquirido e mantido à custa de repetições. A escrita e a habilidade de a utilizar permitiram à Humanidade um meio mais fácil de registar e dar acesso ao Conhecimento. O cérebro humano naturalmente adquiriu, assim, também a capacidade de adquirir Conhecimento através da escrita, da leitura, do estudo.

Mas tenhamos presente que a camada mais profunda do nosso cérebro é desde sempre estimulada auditiva e visualmente e por execuções ritualizadas do que se pretende transmitir. A aquisição de Conhecimento através da escrita, da leitura, do estudo é uma habilidade mais recentemente adquirida, logo, mais superficial no nosso cérebro.

Não nos enganemos: o estudo, a aquisição de Conhecimento pelo estudo, dá trabalho. Esse trabalho é recompensado pelo desenvolvimento da nossa Inteligência Racional, pela habilidade de memorizar, de relacionar, de aplicar. Mas é apenas a Razão que é aplicada e fortalecida.

Para se desenvolver, para se utilizar a Inteligência Emocional, a que nos permite, quantas vezes sem sabermos como, intuitivamente dizer a palavra certa, executar o gesto adequado, efetuar a ação necessária sem termos de longamente pesar os prós e os contras, sem necessitarmos de fazer exaustivas análises e cálculos, para isso temos de recorrer às camadas mais profundas do nosso cérebro – e essas desde o início dos tempos foram estimuladas pelo que se via e ouvia, pelo que se repetia uma e outra e muitas vezes, pelo que se ritualizava.

Por isso afirmo que o Ritual é o indutor de mais rápida passagem do Conhecimento à Sabedoria, acelerando o que só a Experiência, a Vida vivida, os erros cometidos e as vitórias alcançadas nos permitiria atingir, não fora ele.

Meus Irmãos: até agora tenho sempre falado de Ritual, sem adjetivar e, sobretudo, sem utilizar o adjetivo maçónico.

Porque o ritual, penso tê-lo demonstrado, existe desde sempre e desde sempre aumenta a capacidade humana de discernir, em suma, de saber. E não há “o “ ritual, há muitos rituais, respeitando a muitos momentos, ocasiões e atividades. Existem, bem o sabemos, rituais religiosos. Mas também de outra natureza, uns mais solenes e utilizados em ambiente de Poder ou de significado social, outros mais simples, íntimos até. Atrevo-me a dizer, por exemplo, que todos os casais com algum tempo de ligação criam os seus rituais próprios, indutores de segurança, conforto e manutenção da relação afetiva. 

Uma categoria de rituais que merece referência é o ritual que podemos denominar de grupal, o que marca, define e corporiza a integração de alguém num determinado grupo. Aí não está em causa a aquisição ou consolidação de conhecimentos ou o acesso a sabedoria, mas simplesmente o estabelecimento de uma união grupal, a que o neófito passa a aceder.

Todo o ritual é importante, precisamente porque correspondendo à mais antiga e natural forma de a Humanidade processar a aquisição de conhecimentos, ganhar e manter confiança, obter conforto e segurança. Não é assim porque queremos que seja, assim é porque a nossa evolução como espécie o determinou. Talvez algo grandiloquentemente, pode-se afirmar que a Civilização se alicerça em rituais. 

Mas os Rituais Maçónicos, esses, partilhando com os demais a mesma natureza de meios indutores de aquisição de Sabedoria, têm ainda uma valência própria, quiçá não exclusiva, mas seguramente que identitária.

Os rituais maçónicos têm uma tríade de caraterísticas, duas delas já referidas e uma terceira que podemos considerar própria. Os rituais maçónicos assumem a natureza de indutores de Sabedoria, são também, particularmente nos rituais de Iniciação e de Aumento de Salário rituais grupais, mas também assumem a natureza de explanação e aprofundamento de Princípios e Valores.

Esta uma especificidade não negligenciável. Os vários rituais dos diferentes ritos maçónicos apresentam-nos e definem-nos Valores e Princípios a que os maçons devem corresponder. Não estão aqui em causa conhecimentos a interiorizar. Estão, diretamente, aspectos e referências morais a seguir, a cumprir, a divulgar.

Os rituais maçónicos ao promoverem Princípios e Valores apelam diretamente às caraterísticas básicas do cérebro humano. Os princípios e Valores expostos, facultados, não se destinam a ser meramente apreendidos pela Inteligência Racional, através do estudo e da aquisição de conhecimentos. Procura-se atingir a Inteligência emocional, o âmago da personalidade de cada um e aí efetuar as modificações inerentes a esses Princípios e Valores.

Busca-se a aceleração do processo. Em vez da mera aquisição pela Inteligência Racional e posterior enraizamento através da experiência, busca-se a inserção direta e eficaz na mente do maçom, atingindo o que o Ritual, desde os primórdios da Humanidade toca: a Inteligência Emocional, logo as profundezas do ser que cada um de nós é. Não se semeia, para que porventura nasça e cresça. Planta-se para que, no mais curto espaço de tempo, haja frutos. 

Os rituais maçónicos destinam-se assim, para além da integração de indivíduos em grupos, a propiciar a modificação de cada um, através da interiorização de Princípios e Valores morais, que devem nortear a conduta de cada um,

Expostos de forma ritualizada, muitas vezes repetida, encenada e praticada, tais Princípios e Valores entranham-se diretamente no âmago essencial de cada um, assim propiciando o seu aperfeiçoamento.

Este processo de aperfeiçoamento não é imediato. É demorado, é evolutivo, depende de patamares.

É por isso que é um erro pensar-se que, sabido o ritual, aprendido a executar o mesmo com perfeição, o nosso trabalho está terminado.

Posso garantir-vos, com base na minha experiência de mais de 30 anos de maçom, que não é assim que funciona.

Decorar o ritual, executá-lo na perfeição, são ainda tarefas do Intelecto, da Inteligência Racional. O que importa é senti-lo, vivenciá-lo, apreender aqui e ali algo de novo, algo que nos chama agora a atenção e em que não reparáramos antes. Porque esse é o processo de entranhamento das noções transmitidas pelo ritual, esse é o processo de passagem do Conhecimento à Sabedoria.

Se há algo que verdadeiramente aprendi com os nossos rituais é que se está sempre a aprender algo de novo com os mesmos. Em mais de trinta anos de Maçonaria, já repeti, já executei, já vi serem repetidos, já vi serem executados, os nossos rituais centenas de vezes. Nunca me incomodei com a repetição. Nunca deixei de me concentrar na sua execução. E, trinta anos passado, ainda me sucede que subitamente encontro algo de novo, apesar de ser o mesmo ritual que pratico e a que assisto ao longo deste tempo.

Tal sucede por uma simples razão: encontro numa ocasião aquilo que então estou preparado para encontrar. As palavras, os gestos, os atos, são os mesmos desde o princípio. Mas antes eu não compreendera aquele particular significado, porque ainda não estava preparado para tal. Porque tive de seguir uma evolução, compreendendo aqui algo que mais tarde me permitiu perceber aquilo, que me modificou e levou a entrever aqueloutro pormenor, num processo evolutivo permanente.

É para isso que serve o nosso ritual. Porque o ritual maçónico não é um simples ritual igual a todos os outros que a Humanidade segue. O ritual maçónico é um meio de Construção e Aperfeiçoamento de Nós.

É esta a sua importância!

junho 08, 2023

MANÁ - Adilson Zotovici



Tudo pronto no canteiro

Oficiais preparados

Instrumentos adequados

Cruciais ao livre pedreiro


De aventais, paramentados,

Mestre,  aprendiz, companheiro

Formais, diretriz e roteiro

Por Grande Arquiteto guiados


Saga em templo sobranceiro

Labores realizados

Sem qualquer paga em dinheiro


Vez que aos assalariados

_O saber_ alvissareiro

_É o maná_dos iniciados !



OS MAÇONS E A MAÇONARIA - HUMANISMO E GLOBALIZAÇÃO - Luis Carlos M.'.M.'.(Grande Oriente Lusitano)


Ao longo destas quase duas décadas decorridas sobre a minha Iniciação, e que se seguiram a outras quase duas décadas de aproximação aos valores do Humanismo, da Liberdade de Pensamento e de uma crescente consciência social e de cidadania, tenho vindo a sedimentar alguns valores, alguns princípios que, na minha modesta opinião, são fundamento, fundação e significado do fato de se ser Franco Maçom. 

Ser Maçom, significa, antes de tudo, ser reconhecido como tal pelos restantes Maçons. 

Não se trata de um atributo a que se acede com "cunhas", pelo pagamento de cotas ou pela assinatura livre de uma condição. 

Não é o mesmo que se ser sócio de um clube ou membro de uma associação. 

Para ser Maçom, é condição sine-qua-non, o ser reconhecido inter-pares. 

O processo que conduz à possibilidade de o ser, passa por uma série de provações - os contactos, as sindicâncias, os interrogatórios, a exposição nos "passos perdidos" - e por um ato iniciático. 

Este começa por assentar numa descida ao limbo, ao útero, à escuridão primordial, como uma semente que passa a germinar no silêncio e nas trevas do subsolo, seguindo-se-lhe uma gradual ascensão, por ação dos restantes elementos tradicionais - a água, o ar e o fogo -, os pais, os companheiros e o amigo, no sentido da LUZ. 

O dar a Luz ou vir à Luz é apenas o início de algo, que o porvir irá ou não determinar. 

Quantas sementes lançamos a terra e nela apodrecem sem ver a Luz?

Quantas germinam, para logo padecer às agruras do clima, sem nunca virem a frutificar?

Vejamos: A verdadeira iniciação não é o momento da "tomada da Luz" nem o da aclamação pelos Irmãos presentes, que representam ali todos os Irmãos Maçons do Universo. 

A verdadeira Iniciação estou em crer, é toda a vida futura após aquele momento iniciático. 

Por mais que pareça ser um lugar comum, continuo a acreditar e a afirmar que serei sempre um eterno Aprendiz! 

A Iniciação leia-se, ignição, é apenas a abertura, o prelúdio de todo um devir iniciático, que envolve um solene e profundo até de responsabilização perante todos os outros, os presentes, os ausentes, os antecessores e aqueles que nos virão a suceder. 

Assumimos, nesse momento mágico, a responsabilidade de trabalhar, com preserve rança e entrega totais, no sentido do nosso aperfeiçoamento espiritual: o tal trabalho simbólico sobre a pedra bruta. 

É em Loja que nos entregamos a esse Trabalho. 

É a Loja que nos guia, nos acolhe, nos incita, nos transmite os hábitos, a técnicas, os preceitos e fundamentos teóricos da ARTE. 

Essa transmissão é-nos feita ou dada através do método que a Tradição nos ensinou: o RITUAL. 

É na sistemática e repetida prática do Ritual que interiorizamos e nos confrontamos com a simbólica, os valores e os signos que conformam a Arte Real. 

A Abertura dos Trabalhos, a Cadeia de União e o Encerramento dos Trabalhos, juntamente com a decoração do Templo, contêm em si mesmos, em qualquer dos três Graus Simbólicos, em qualquer Rito, todo o acervo de informação de que o Aprendiz precisa para prosseguir o seu infindável processo de Iniciação. 

Podem e devem ser debatidas pranchas simbólicas e filosóficas no período da Ordem do Dia, debater-se questões administrativas, profanas ou conjunturais na Palavra a Bem da Ordem, mas é na prática efetiva do Ritual que se centra o trabalho sobre a pedra bruta, ou seja, o verdadeiro trabalho maçônico. 

Perdoem-me a analogia de cordel, mas tendo a crer que a Loja é como um meio de transporte (chamemos-lhe autocarro), que pára em diversas estações, transportando passageiros de diversas origens para diversos destinos, segundo regras comumente aceites e por todos partilhadas. 

Em linguagem profana coeva, diria que cada um desses autocarros, desenhados segundo determinado modelo (Rito), preparados para determinados tipos de viagem (Rito), e conduzidos por uma determinada tripulação (Luzes), por razões logísticas e culturais faz parte de uma frota (Obediência) que, conjuntamente com a globalidade das frotas (Obediências) conforma aquilo a que chamamos um sistema de transportes (a Maçonaria Universal). 

Todas nos assentam mesmo objetivo, todas procuram participar na construção de um Mundo mais humano, mais livre, mais fraterno, mais justo, mais ilustrado. 

(Algumas frotas, contudo, só transportam passageiros de um determinado sexo, outras de determinada cor, outras procuram transportar o maior número possível de passageiros, outras, ainda, dão preferência a determinados credos ou oferecem e exigem tipos diferenciados de serviço. Trata-se de outra Pedra Bruta a trabalhar, conjuntamente, por todos os Pedreiros verdadeiramente Livres e de bons costumes. Estou plenamente convencido que lá chegaremos, mais cedo ou mais tarde. Como é óbvio, a Obra está longe de estar concluída!). 

Não acredito na existência de um "novo Humanismo". O Humanismo foi, é e será sempre o mesmo objetivo a atingir e assenta redondamente no nosso sistema de valores. 

Os meios e sistemas de organização política e social ao nosso alcance em cada momento histórico, geográfico e cultural é que poderão variar, mas o conceito de Humanismo será sempre o mesmo: a liberdade de opinião, a liberdade de escolha, o respeito do Homem pelo seu semelhante e pela Natureza, o respeito pela opinião e pela diferença, o sentimento de cooperação e de interajuda, a noção cada vez mais presente de que habitamos todos sob um mesmo texto, vão-se construindo, à medida que a História e a Ciência nos desvelam o mundo nas suas diversas dimensões. 

O Homem foi, é e será sempre, uma espécie em construção, sob pena da sua total diluição no abismo da amnésia cósmica. 

O mundo atual revela-nos a globalização, a generalização da informação, a possibilidade de um sistemático estado heterotópico no habitar, no ser, no existir. 

Alguns de nós somos meros transeuntes apressados num mundo virtual (tele móveis, aeroportos, supermercados, fast-food, televisão, Internet, etc.), outros, optamos por ser viajantes atentos de um mundo real 

- não dispenso ir à janela do meu quarto, quando acordo ou chego a casa; de confraternizar à mesa, com amigos ou familiares, com frequência, ou de sistematicamente participar nas sessões da minha Loja, não faltando nunca ao ágape que se lhes segue, com os meus Irmãos. 

Houve um tempo em que, transgredir - condição única para o progresso -, significava, como em Lewis Carroll, passar para o outro lado do espelho. 

Hoje, a grande maioria da população urbana dita civilizada vive do outro lado do espelho, na net, nos programas de televisão, nos espaços virtuais que o mundo contemporâneo tem vindo a engendrar em catadupa. 

Estou convencido de que transgredir, hoje - atitude revolucionária como sempre -, significa manter a lucidez suficiente para ver, olhar, sentir, ouvir, tocar, degustar, cheirar tudo aquilo que é sensível e real, nos envolve e enriquece, nos faz pensar e agir, conjuntamente com pessoas reais (Cadeia de União), em práticas objetivos e materiais (o Ritual) que nos transportem para o onírico mundo dos hábitos, dos saberes e dos sabores, que nos devolvam os reais prazeres do corpo e da mente, em equilíbrio, numa consciente e profícua atitude de atuação e mudança: como poderei eu sentir-me bem comigo mesmo se tenho consciência do sofrimento e da dor dos meus Irmãos? 

Sendo que estes são, no sentido lato, toda a Humanidade Sofredora que me antecedeu, me acompanha e me sucederá através do tempo e do espaço. 

Assim, em jeito de remate, gostaria de vos dizer, meus Irmãos, do mais fundo das minhas convicções e saberes, que o papel dos Franco Maçons e da Maçonaria na construção do Humanismo, na consumação dos Valores, dos quais destaco como mais importante de todos o da Felicidade Universal, é o do persistente, sistemático e consciente trabalho sobre a pedra bruta que cada um de nós é, através de um profícuo trabalho Ritual em Loja, para que, nos diversos momentos em que somos, vivemos e atuamos , possamos contribuir serena e seguramente para a construção coletiva do Templo do Homem




junho 07, 2023

A MAÇONARIA VEM PRIMEIRO - Thomas W. Jackson



Nos últimos anos, tornei-me mais estudante da Maçonaria do que era no passado e, embora ainda hesite em me considerar um erudito maçónico, há aqueles que tendem a colocar-me nesta categoria. Se eu me tornei um estudante ou um estudioso da Ordem não é tão significativo quanto é o meu reconhecimento da grande escassez de estudantes e estudiosos maçónicos na Maçonaria atual em comparação com o passado. Duvido que alguém negue que um dos maiores problemas que a Maçonaria enfrenta hoje é a falta de conhecimento do que ela realmente é, e isto inclui tanto o Maçom quanto o não Maçom. Simplesmente temos uma percentagem muito grande dos nossos membros, relutantes em fazer um esforço para compreender a verdadeira filosofia e significado da nossa Fraternidade.

Conta-se a história de um velho médico francês que dedicou a sua vida aos pacientes, dando muito de si mesmo e exigindo pouco em troca. Se eles não podiam pagar, ele não cobrava. Quando se aproximou o dia em que o velho médico já não podia continuar na sua profissão, os seus pacientes quiseram dar algo ao velho em troca da devoção e das contribuições altruístas que ele deu às suas vidas. No entanto, eles eram pobres demais para dar ao velho médico o tipo de reconhecimento que achavam que ele merecia. Cada um, porém, produzia vinho para seu próprio uso. Eles decidiram que cada um contribuiria com uma jarra de vinho e presenteariam o médico com um barril de vinho de onde ele poderia beber enquanto relaxava após se ter aposentado.

Quando chegou o dia inevitável e terminaram os discursos de reconhecimento e gratidão, o velho médico aceitou o vinho daqueles a quem servia há tanto tempo e tão bem e voltou para sua casa. Ele agarrou numa taça de vinho e sentou-se numa cadeira para relaxar. Quando provou o vinho, contudo, o gosto era de água. Pensando que algo devia estar errado, encheu um segundo copo, mas também tinha gosto de água e, infelizmente, a verdade foi revelada.

Cada um dos seus pacientes achava que tinha muito pouco para seu próprio uso e que não tinha dinheiro para contribuir para o médico. Cada um deles raciocinou que, como tantos outros estavam a dar, a sua pequena contribuição não faria falta.

É triste, mas verdadeiro, que esta analogia também possa ser aplicada à nossa Fraternidade, hoje. Muitos acham que a sua pequena contribuição não fará falta e, como resultado, a Maçonaria, como o velho médico, que significou tanto para tantos, experimenta a decepção.

Quanto mais familiarizado estou com esta organização, mais impressionado fico com a magnitude do impacto que ela causou no mundo como o conhecemos hoje. Não pode haver dúvida de que sem a Maçonaria o mundo civilizado, na sua forma atual, provavelmente não existiria. Mas, tendemos a tornar-nos uma Fraternidade passiva à medida que o não envolvimento se torna mais uma parte das nossas vidas. Cada um de nós provavelmente se orgulha de ser capaz de apontar tantos grandes homens que fizeram parte da Maçonaria, mas esta tendência de apontar os grandes homens levou-nos a ignorar a grandeza da Ordem. É a grandeza da Ordem com as suas filosofias e preceitos que atraiu os grandes homens para começar, e que fez do mundo o que é hoje. A Maçonaria vem primeiro; a adesão é secundária. Sem a grandeza da Ordem, a sua composição teria sido irrelevante. No entanto, ao mesmo tempo, foi a contribuição dos membros que fez a filosofia da Ordem funcionar.

Jamais devemos deixar de nos orgulhar do nosso passado; mas não podemos dar-nos ao luxo de insistir nisso, se nos faz perder de vista o presente. Cada contribuição, por menor que seja, é uma contribuição para a perpetuação de um ideal – talvez o maior ideal – que a mente do homem concebeu. Numa época que continua a ver os maiores conflitos do mundo ocorrendo em nome de Deus e da religião, a filosofia da tolerância ainda é tão desesperadamente necessária quanto no passado. Não encontramos nenhuma organização hoje que defenda uma filosofia semelhante. Podemos continuar a expressar os nossos adoráveis chavões e não dar nenhuma contribuição; ou podemos ser o que dizemos que somos e praticar o que pregamos.

Não pode haver dúvida, porém, de que se continuarmos a não saber o que somos, continuaremos a deixar de ser o que éramos. Provavelmente, o maior desafio enfrentado pela liderança maçónica hoje é a educação dos membros sobre o verdadeiro significado da Maçonaria. A Pensilvânia tem sido extremamente afortunada no campo da educação maçónica. Tivemos, e continuamos a ter, um dos maiores programas de educação maçónica em operação em qualquer Grande Loja do mundo. Mas, como já foi dito muitas vezes, não se pode fazer 20.000 volts passar por um não condutor e, infelizmente, muitos dos nossos membros de hoje, tornaram-se não condutores por escolha própria. Se não entendemos a Ordem, como podemos esperar que aqueles de fora nos entendam?

Se continuarmos a pensar que a nossa pequena contribuição não fará falta, então, como o velho médico, uma organização que tem causado grande impacto neste mundo por quase 300 anos durante a evolução da civilização, será como ele – condenada a se decepcionar. Pensem nisto, meus Irmãos. A vossa contribuição, não importa quão pequena, é significativa.


Tradução de António Jorge Fonte: Publicado originalmente em “The Pennsylvania Freemason”, Fevereiro de 1996.

junho 06, 2023

VER – OUVIR - CALAR








 ...“Benedictus Dominus Deus noster qui dedit nobis signum”...

Irmão Iniciado: Um forte querer vos impeliu a buscar admissão aos umbrais do Templo, aspirando receber a Luz, como outrora peregrinavam os buscadores, nas regiões do Oriente, também desejosos de obter a Iniciação nos Mistérios. 

Descendo à sombria câmara, fostes buscar no interior da Terra a Pedra Oculta – o encontro com o Eu real – como o Mestre que se recolheu ao deserto para vencer suas tentações.

O terror do Umbral não vos causou medo, nem ao percorrer os caminhos largos e estreitos, guiado por mãos tão desconhecidas quanto às provas que vos aguardavam. 

Passando por Fogo, Terra, Ar e Água, seguistes o exemplo do Mestre que triunfou das tentações e foi servido pelos Anjos. 

Por ousar vencer essas provas, a Luz vos foi concedida, como prêmio da Iniciação: Ali estava a Luz verdadeira, que alumia a todo o homem que vem ao mundo. 

Como mais um Iniciado, livre e aceito, tomai vosso lugar no Templo.

No Oriente, o Mestre pouco a pouco vos desvelará os Augustos Mistérios da Tradição antiga, orientando para as obras de Luz, o fruto da Árvore da Ciência do Bem e do Mal.

Ousai fazer, e o Poder vos será dado. 

Mas lembre-se de sua responsabilidade: No dia em que comeres deste fruto, serás ferido de morte. 

Que o saber não lhe deslumbre, nem acirre sua vaidade, que é destruidora da Luz. 

O saber vos tornará o Mestre de vosso próprio Templo, pois o Reino de Deus está dentro de vós.

Para que o Negro em Branco, e o Branco em Vermelho, seja transformado, o Iniciado separa o sutil do espesso, domina os elementos e opera a quadratura do círculo, tornando cúbica a pedra que era bruta. 

Está, enfim, diante da Realização da Grande Obra, e agora só lhe resta calar.

Velai prudentemente a Verdade oculta nos símbolos e alegorias cujo real sentido a poucos é dado conhecer, para não entregardes as luzes do Conhecimento às contradições humanas. 

Não lanceis vossas pérolas aos porcos.

O silêncio é o testemunho de tudo o que vistes e aprendestes – é o fecho de ouro dos quatro verbos do Iniciado. ...

Bom dia meus irmãos. 

(Desconheço a autoria)

junho 05, 2023

A ÉTICA E O VALOR MORAL NA MAÇONARIA - José Airton de Carvalho











A Ética, denominada de Filosofia Moral ou Ciência Moral, trata da análise e a reflexão sobre as condutas humanas, tanto individuais, quanto coletivas, e as normas morais como princípios dos comportamentos. Sua finalidade é fazer com que o desenvolvimento humano atinja a plenitude, respeitando as diferenças individuais.

Segundo Aristóteles, “a Ética estabelece o que se deve ou se pode fazer, e o que não se deve ou não se pode fazer”.

É evidente que quando se estuda o procedimento do homem no meio social, deve-se levar em conta que o homem é um ser moral, justamente por ser ele um se político. É um ser político porque a isso o obriga a sua natureza humana.

Mais do que nunca o homem tem que se adaptar à vida em comunidade, mormente nos tempos de globalização, quando o mundo virou uma “aldeota”, onde a aviação e os meios de comunicação acabaram com as distâncias.

O homem vive em sociedade e o Estado onde ele vive precisa dele, como ele precisa do Estado. Na sua larga visão, Aristóteles em “A Política” assinala:

…“Está claro que o Estado é produto da natureza e superior ao indivíduo; quem não fosse capaz de viver na comunidade civil ou dela não tivesse necessidade para bastar-se a si mesmo, não se tornaria nenhuma parte do Estado…”.

Tenhamos em mira que a teoria aristotélica da moral é o fundamento dessa corrente do pensamento chamado Ética.

É interessante verificar que a palavra ética, em português, é derivada do vocábulo grego ethos que significa hábito, costume.

Os romanos traduziram o ethos grego por moralis. Cícero diz em uma das suas obras, referindo-se ao vocábulo grego, que “Aquilo que tem a ver com os costumes, que eles (os gregos) chamam ethos, nós, nesta parte da filosofia referente aos hábitos, costumamos chamar de moral”.

O dicionário esclarece que Moral é a parte da filosofia que trata dos costumes ou deveres do homem para com seus semelhantes e para consigo mesmo.

Aristóteles não separa a Ética da Virtude, porque, para ele, toda a virtude se gera e perece dos mesmos atos, e mediante os mesmos atos; e exemplifica dizendo que “de tocar cítara surgem os bons e os maus citareiros”. Isto significa que, pelos atos, se conhece se o indivíduo é virtuoso ou não.

Mais adiante ele enfatiza: “É necessário, pois, atentar para a qualidade dos atos que praticamos, porque consoante a sua diferença resulta a diferença dos hábitos.”

Se o homem considerar que a prática dos deveres para com os outros e para consigo mesmo é o único caminho que leva à perfeita harmonia social, estará, pois, procedendo corretamente e pode considerar-se feliz.

Analisemos o que Aristóteles estabelece de fundamental na sua “Ética”:

“Os atos morais são livres, motivo por que o indivíduo assume a sua responsabilidade. Em assim sendo, torna-se, para quem os pratica, causa de mérito ou demérito. A responsabilidade supõe, com certeza, o que denominamos de imputabilidade, pelo qual o ato é atribuído a um indivíduo como seu autor”.

“Existem duas espécies de responsabilidade: aquela pela qual o indivíduo responde por seus atos diante da própria consciência, ou seja, a responsabilidade moral, e a responsabilidade social que faz com que o indivíduo responda por seus atos, às vezes, perante a justiça, quando violar as leis civis”.

Aristóteles ensina que “A virtude é um hábito não só diante da reta razão, mas a ela conjunta. E a reta razão nada mais é que sabedoria”.

Resumindo, Virtude é o hábito de praticar o Bem, e vício, o hábito de praticar o mal.

Voltemos a Aristóteles e vejamos o que ele tem para nos ensinar:

“A Virtude, diz ele, se distingue segundo esta diferença: das virtudes, algumas chamo dianoéticas, a sapiência, a inteligência e a prudência; éticas, a liberalidade e a temperança. Quando, de fato, falamos dos costumes de alguém, não dizemos ser sapiente ou inteligente, mas sim, brando de ânimo ou temperante; e louvamos também, referindo-nos ao hábito: que nós chamamos virtudes aqueles hábitos que merecem ser louvados.”

Aristóteles procura estabelecer diferença entre aquilo que ele chama de virtudes dianoéticas e virtudes éticas:

“As primeiras são inatas no homem e podem crescer através do estudo, do ensinamento, razão por que têm necessidade de experiência e de tempo. Já as virtudes éticas são frutos do hábito, o que vale dizer que nenhuma delas se gera no homem por natureza, são as chamadas virtudes adquiridas. Elas não se geram nem por natureza nem contra a natureza, mas nascem em nós que, aptos pela natureza a recebê-las, nos tornamos perfeitos mediante o hábito”.

O estagirita conceitua a natureza humana como sendo equilibrada. Para ele, todo ideal tem base natural e todo natural tem desenvolvimento ideal. Reconhece, e o faz objetivamente, que a meta da vida não é o Bem por si mesmo, mas a felicidade. Assegura que a felicidade aparece como um bem perfeito, sendo a meta de todas as ações.

A Maçonaria é por excelência, uma Entidade de Moral, pois, seus princípios alcançam, em suas ações, os níveis mais elevados da Ética Universal. Sua obra, tanto material quanto espiritual advém de um passado remoto. Educando e disciplinando, prepara seus membros para que participem na busca da verdade, elevando-os em sua dignidade, fazendo com que ajam com justiça, desfrutando da liberdade, praticando a fraternidade e dedicando-se com amor à Humanidade.

Diante da evolução por que passa o mundo é necessário que visualizemos, à luz maçônica, os grandes desafios. O rigor moral e a força da autêntica solidariedade social se fazem necessários para que corrijamos os deslizes individuais, as más instituições políticas, econômicas e sociais, com o intuito de que o relacionamento humano seja mais fraterno.

A resposta não é simples, mas, podemos assegurar que sem ela enveredamos os mais tristes e funestos destinos. A Moral permite o cultivo de todas as virtudes, o que garante uma promissora convivência com nossos pares.

O imoral e o amoral, hoje ou amanhã, pagarão alto preço de uma conduta desmedida, destruindo, assim, suas vidas. “A História, mestra da vida”, testemunha a decadência dos que se distanciam da moral.

Nenhuma nação, nenhum povo e nenhum homem poderão concretizar seus sonhos, se não estiverem embasados nos conceitos da Moral. Seria como construir castelos ao vento, ainda que a aparência pareça estável.

Portanto, a cada um, a concepção do dever, do bem, da justiça, das virtudes e, sobretudo, da verdade, pois aí está a formatação da moral, revelando-nos os valores que norteiam o homem e os povos, prestigiando suas instituições e reafirmando na fé, a verdadeira perfectibilidade humana.

A Maçonaria nos chama ao cultivo da Moral e à sua nobre prática, para que sejamos cada dia, mais virtuosos.

*Zé Airton é Mestre Instalado, membro da ARLS Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte, presidente da Escola Maçônica Mestre Antônio Augusto Alves D’Almeida e membro da Loja de Pesquisas Quatuor Coronati Pedro Campos de Miranda.

junho 04, 2023

NINGUÉM É O QUE VESTE... - Joab Nascimento

 







Ninguém é o que veste,

Muito menos o que tem!


Fui criado com tão pouco,

Com pouco sinto-me bem,

Não me iludo com o muito,

Nem com dinheiro também,

Gosto da simplicidade,

Abomino a vaidade,

E todo orgulho de alguém,

Mando a riqueza pra peste,

Pois ninguém é o que veste,

Muito menos o que tem!


Fui criança de pé no chão,

Usei calção remendado,

Almocei café sem pão,

Tinha farinha ou grolado,

Nunca conheci fartura,

Sempre tive vida dura,

No bolso nenhum vintém,

Quem quiser que me conteste,

Pois ninguém é o que veste,

Muito menos o que tem!


Não gosto de ostentação,

Nem tão pouco me mostrar,

O trocado que eu tenho,

Eu sei muito bem gastar,

Prefiro não ser notado,

Ficar um pouco afastado,

Passar-me por Zé Ninguém,

Ser matuto do agreste,

Pois ninguém é o que veste,

Muito menos o que tem!



ALQUIMIA -



A finalidade principal da Alquimia (do árabe al-kimia) era a transformação de substâncias por processos químicos e as tentativas de transmutação dos metais. Embora a sua época de apogeu tenha sido a Idade Média, quando, sob esse nome, ela foi introduzida, no Ocidente, pelos árabes (século VII), a verdade é que ela foi praticada desde tempos muito antigos, no Egito, na Pérsia, na China, na  Índia e na Grécia arcaica. Os egípcios já a utilizavam, de maneira prática, para curtir couros, preparar ligas de metais comuns e fabricar corantes e cosméticos; os persas tiveram grande interesse por esse novo tipo de conhecimento e o espalharam entre os povos conquistados; através dos persas, ela chegou à Grécia, onde os gregos a incorporaram aos seus conhecimentos teóricos sobre os mistérios da vida.

É necessário, já de início, que se estabeleça a existência de dois tipos de alquimia: a prática, precursora da química e estabelecida pelo médico suiço Theophrastus Bombastus von Hohenheim, mais conhecido como Paracelso (1493-1541), e a alquimia oculta, muito associada à magia.

Em todas as teorias cosmogônicas do mundo antigo, existe a idéia da existência de um elemento primordial, do qual derivam todos os demais elementos. A mais antiga idéia, relativa a esse conceito, é aquela que considerava a água como elemento fundamental, associada aos trabalhos do sábio grego Thales, de Mileto. Na mesma Grécia, entretanto, muitos filósofos defenderam idéias diferentes. Anaxímenes afirmava que o elemento primordial era o ar, pois ele podia ser condensado, formando nuvens e chuvas, cujas águas, ao se evaporar, formando, novamente, o ar, deixavam um resíduo sólido de terra. O mitraísmo persa via a manifestação do poder divino no fogo, crendo, portanto que esse era o elemento formador de todas as coisas; Heráclito também defendia a teoria do fogo, afirmando que tudo, no mundo, está em constante transformação e que o elemento que pode provocar as mais intensas transformações é o fogo, daí a máxima hermética Igne Natura Renovatur Integra (o fogo renova toda a Natureza). Já Feresides escolheu, como fundamental o elemento terra, pois, afirmava, ao se queimar um corpo sólido, obtém-se água e ar. E Aristóteles, finalmente, defendendo uma concepção de Empédocles, afirmava que esses quatro elementos eram fundamentais e que todos os corpos eram formados por combinações deles.

As ideias de Aristóteles, básicas para a alquimia, eram ensinadas nas escolas de pensadores da cidade de Alexandria, no Egito, a qual foi o grande centro alquimista da Antiguidade, nela se dando a fusão entre as práticas egípcias e as teorias gregas, mais tarde desenvolvidas pelos árabes. Estes, ao conquistar, em 642, o Egito, atingindo, depois, a Síria e a Pérsia, trouxeram, para o ocidente, a nova contribuição, que gerou aquilo que, hoje, é chamado de alquimia.

Dos árabes conquistadores, originou-se um dos maiores alquimistas de todos os tempos: Jabir ibn Hayyan (721-813), conhecido, na Europa, como Geber. Este aceitava a teoria aristotélica dos quatro elementos, adicionando, todavia, outros dois elementos essenciais, o mercúrio e o enxofre, os quais explicavam certas propriedades dos metais; um terceiro elemento, o sal, foi, posteriormente, incluído, formando, com os outros dois, o trio fundamental (trio prima) de Paracelso e de seus discípulos, no século XVI.

Essencialmente, a alquimia era caracterizada pela busca de duas substâncias: a pedra filosofal, capaz de transformar os metais inferiores em ouro, e o elixir da longa vida, capaz de manter os homens eternamente jovens. Para Geber, todos os metais seriam formados apenas de enxofre e de mercúrio; desses elementos, deveriam ser extraídas as essências, que transformariam todos os metais "em ouro mais puro do que o das minas". Partindo do princípio de que todas as substâncias possuem uma única raiz, parecia possível, para os alquimistas, transformar os corpos, entre os quais os metais, em ouro, o qual, além de ser o princípio concreto da força, que serve para comprar a glória e a felicidade material, é, também, o símbolo do Sol, da luz, do poder criativo, da revelação divina.

Teosoficamente, a alquimia trata das forças sutis da natureza e das diversas condições da matéria, nas quais aquelas forças agem. Quando, dá, aos iniciados, a idéia do mysterium magnum, sob o véu regularmente artificial da linguagem, para que não represente perigo nas mãos de egoístas, o alquimista aceita, como primeiro postulado, a existência de um determinado dissolvente universal da substância homogênea, de onde evoluíram os elementos, ao qual chamam de ouro puro, ou summum materiae. Este, possuía o poder de lançar fora do corpo humano todos os germes de doença de renovar a juventude e de prolongar a vida: assim é a Pedra Filosofal (Lapis Philosophorum).

A alquimia é, na realidade, tratada sob três aspectos distintos: o cósmico, o humano e oterrestre; esses três aspectos eram típicos, sob as três propriedades alquímicas: o mercúrio, o sal e o enxofre, que são os três princípios da Grande Obra (transformação dos metais inferiores em ouro).

No aspecto terrestre, ou meramente material da alquimia, o objetivo é transmutar os metais grosseiros em ouro puro, já que é indiscutível que, na natureza, ocorre a transmutação de metais inferiores em outros, melhorados. Existe, todavia, um aspecto muito mais místico, o ocultista, da alquimia. O alquimista ocultista despreza o ouro terrestre, material, e dirige todos os seus esforços na transmutação do quaternário inferior em ternário divino superior ao homem, os quais, quando se unem, acabam constituindo um só. Os planos da existência humana, espiritual, mental, psíquico e físico, comparam-se, na alquimia oculta, aos quatro elementos da teoria de Aristóteles (o fogo, o ar, a terra e a água); cada um deles é capaz de uma tríplice constituição, ou seja: fixa, instável e volátil.

A Grande Obra, para a alquimia oculta, consistia no constante renascer, para que o iniciado percorresse o caminho do aperfeiçoamento e do conhecimento, até chegar à comunhão com a divindade, conceito muito parecido com os do hinduísmo e os da doutrina de revelação do mitraísmo persa. Assim, os metais inferiores simbolizam as paixões humanas e os vícios, que devem ser combatidos e transformados em ouro do espírito, que é o objetivo da Grande Obra, ou Obra do Sol, ou Crisopéia, ou Arte Real. 

As operações da natureza são, praticamente, as mesmas da alquimia, diferenciando-se somente na denominação, podendo ser reduzidas a sete principais: calcinação, solução, putrefação, destilação, sublimação, conjunção e coagulação, ou fixação. É necessário, porém, tomar essas palavras no sentido filosófico, de acordo com o procedimento da natureza, a qual deve ser bem estudada e conhecida, antes de ser imitada.

Não se pode negar que a Química moderna deve os seus melhores descobrimentos à alquimia, a partir de Paracelso, que achava que "apenas os idiotas pensam que a alquimia é o conhecimento de como obter ouro; o objetivo da alquimia é procurar descobrir novos remédios". Os antigos e infatigáveis trabalhos alquímicos relativos à transmutação dos metais até ao ouro potável (conseguida pela Química moderna), originaram inúmeras descobertas, às quais deve, a humanidade. o seu progresso atual. Muitos dos descobrimentos tidos, exclusivamente, como modernos, já eram conhecidos pelos magos e alquimistas de tempos bem remotos: os sacerdotes etruscos, adeptos da magia, conheciam bem a eletricidade e fizeram uso dela para a defesa de cidades; o arquiteto e alquimista Anselmo de Tralle já conhecia os efeitos do vapor, enquanto o monge alquimista, Pauselenas, fala, em suas obras, sobre a aplicação da química nas fotografias e afirma que autores jônicos falam desse mesmo processo, assim como de câmara escura, sensibilidade de placas e aparelhos ópticos.

Com a união, na Idade Média, principalmente a partir do século XIII, dos alquimistas com os cabalistas, hermetistas e adeptos da magia, surgiriam diversas seitas e grupos secretos, como o dos adeptos e o dos iluminados, os quais, posteriormente, como elementos aceitos, incorporaram-se às associações de construtores medievais, levando, para a nascente Maçonaria dos Aceitos (ou "especulativa"), os seus conceitos, ideias e símbolos.

A Maçonaria ainda conserva muitos símbolos dos alquimistas, para armar a sua doutrina moral e espiritual. Um exemplo é, em muitos ritos, a chamada Câmara de Reflexão, onde o candidato à iniciação permanece, em meditação, antes da cerimônia; a câmara, que representa o útero (da terra), do qual o candidato nasce para uma nova vida, representa a "prova da terra", um dos quatro elementos aristotélicos. Nela, entre diversos símbolos representativos da espiritualidade e do valor da vida honrada, encontram-se as substâncias necessárias à Grande Obra --- sal, enxofre e mercúrio --- para lembrar, ao candidato, que ele deve percorrer o caminho do conhecimento, para chegar ao aperfeiçoamento espiritual e moral, que é a Grande Obra da vida. Na mesma câmara, uma máxima alquímica --- representada pelas iniciais de suas palavras, V.I.T.R.I.O.L. --- adverte: Visita Interiore Terrae Rectificandoque Invenies Ocultum Lapidem (vá ao interior da terra e, seguindo em linha reta, em profundidade, encontrarás a pedra oculta), a qual, além de uma referência à Pedra Filosofal, é um convite à procura do "eu interior" de cada um. Alquímicas, também, são as provas simbólicas de alguns ritos, ligadas aos outros três elementos: ar, fogo e terra.

...Do livro "Origens do Misticismo na Maçonaria", 1a. ed.: Traço Editora - 1982 - 2a. ed.: A Gazeta Maçônica: 1995.

junho 03, 2023

SOLITUDE MAÇONICA - Sérgio QUIRINO Guimarães



O termo "Solitude" é utilizado na Psicologia e na Psicanálise para expressar, de forma reduzida, o gostar de estar sozinho. Entretanto, deixa-se bem claro que Solitude não é Solidão!

Mas o que esse conceito tem a ver com Maçonaria?

Com a Maçonaria, pouco! Com os Maçons, muito!

Conceitualmente a Ordem Maçônica "é uma associação de homens sábios e virtuosos que se consideram Irmãos entre si e cujo fim é viver em perfeita igualdade, intimamente ligados por laços de reciproca estima, confiança e amizade, estimulando-se, uns aos outros, na prática das virtudes"

Os grifos já colocariam por terra a possível aplicação do conceito de Solitude entre nós. Porém, permitam uma alegoria Imaginemos que, se a Maçonaria fosse uma floresta, o conceito seria: é uma associação de árvores frondosas e vigorosas que se consideram Irmãs entre si e cujo fim é viver em perfeita equidade, intimamente enraizadas na reciproca protetiva e na geração do microclima e da retroalimentação, favorecendo umas às outras na manutenção do ecossistema.

A estrutura da floresta protege as árvores dos ventos fortes e mantém a umidade, e cada folha caida ao chão transforma-se em alimento para as demais.

Apesar dessa perfeita igualdade de função, dessa intimidade de ação e reação e do estímulo que uma possa dar à outra, isso não garante o crescimento da árvore.

O que faz a árvore, de fato, crescer é sua determinação interna. Só ela, em seu amago, produz a força necessária para romper os torrões de terra e aprofundar suas raizes à procura de seu VITRIOL. Só ela é capaz de avaliar onde lançar seus galhos em busca da LUZ que ilumina e não cega.

Nesta alegoria, espero que os Irmãos entendam que estarmos juntos é muito bom. Contudo, o Irmão deve primeiro se encontrar.

Solitude é gostar de estar consigo mesmo. É ser Maçom pelo progresso, e não pela Ordem. É a dicotomia de entender que, embora participemos de atividades em conjunto, precisamos de um isolamento voluntário para tranquilizarmos a mente à procura da essência da Maçonaria.

TORNAR FELIZ A HUMANIDADE NÃO DEVE SER VISTO COMO UMA MISSÃO DA MAÇONARIA, MAS SIM DOS MAÇONS, POIS O LAR E A FAMILIA SÃO AS CÉLULAS DE TODAS AS SOCIEDADES QUE COMPÕEM A HUMANIDADE.

As vezes nos concentramos tanto em Sessões Magnas e reuniões que nos esquecemos de que, para mudarmos o mundo, precisamos mudar o homem.

A SOLITUDE MAÇONICA É O ENCONTRO CONSIGO MESMO! É RESERVADAMENTE ESTARMOS SEM EQUIVOCOS, SOFISMAS OU RESERVAS MENTAIS DIANTE DE NOSSA CONSCIÊNCIA!

O VITRIOL É A ESPIRITUALIDADE QUE SE ENCONTRA DENTRO DE NÓS MESMOS!

Quando ela é encontrada, brota a fonte límpida e inesgotável do autoconhecimento e da autoconfiança e nos tornamos geradores de Luz.



junho 02, 2023

REFLEXÃO SOBRE A MAÇONARIA - Rui Bandeira






No século XVIII, quando se expandiu a Maçonaria Especulativa, esta seguia e divulgava os princípios do Iluminismo. A Maçonaria foi então um farol que apontou o caminho da evolução social, da conceção laica, livre, igual, fraterna e tolerante do mundo, da sociedade e do lugar nela do Homem. 

O pensamento escolástico é substituído pela Ciência Experimental; racionalismo e empirismo substituem o pensamento arcaico apenas fundado nas interpretações teológicas dominantes; Locke teoriza a Tolerância como valor social; emerge o reconhecimento e proteção dos direitos humanos; o absolutismo é substituído pela submissão à Lei; a soberania por direito divino é substituída pelo conceito de que a soberania pertence ao Povo e deve ser exercida em nome do Povo, para o Povo e pelos representantes designados pelo Povo; emerge e triunfa a noção de que as sociedades devem prezar e preservar a Liberdade, assegurar a Igualdade, possibilitar a vivência em Fraternidade; o princípio da separação de poderes triunfa. Em toda esta evolução os maçons deram o seu contributo.

Trezentos anos depois, o mundo e a sociedade são radicalmente diferentes em relação ao que eram no início do século XVIII. Os valores que a Maçonaria adotou implantaram-se progressivamente em toda a sociedade e - felizmente! - hoje são essencialmente valores da sociedade, não de qualquer estrutura social, Maçonaria incluída.

Trezentos anos depois, verificando-se que o essencial do ideário maçónico venceu e está institucionalizado no mundo desenvolvido, inevitavelmente que surge a interrogação: continua, nos dias de hoje, a Maçonaria a fazer sentido? Não será hoje uma instituição ultrapassada pelo sucesso do seu ideário, transitada da modernidade no passado para o arcaísmo no presente? 

Em termos sociais, só o que mantém utilidade e sentido permanece. Tudo o que não preenche já o requisito da necessidade, do interesse, inevitavelmente estiola, fenece, cai em desuso, desaparece. Ou então transforma-se, assegurando a sua existência e pujança pela assunção de valores e interesses socialmente úteis e necessários no momento presente. Qual a função da Maçonaria hoje? Apenas a defesa dos valores que o tempo e a evolução social consagrou? Apenas uma instituição "anti-reviralho"? Ou será que a matriz genética da Maçonaria lhe permite vislumbrar, aprofundar, consensualizar novos caminhos ainda por explorar ou desenvolver, valores a implementar? Se assim é, quais os caminhos a que dar atenção, como consensualizar a direção a tomar?

Os tempos de hoje são radicalmente diferentes dos de há trezentos anos, de há duzentos anos, de há cem anos, mesmo de há cinquenta anos. As sociedades complexizaram-se visivelmente. A comunicação e os meios de a efetuar evoluíram, modernizaram-se, democratizaram-se, vulgarizaram-se. Onde antes havia poucos meios apenas ao alcance de uns poucos privilegiados, hoje tudo está praticamente à disposição de todos. A informação hoje é tudo menos escassa. Pelo contrário, começamos a ter dificuldade em selecionar, em determinar de entre a abundante cascata que incessantemente jorra sobre nós o que verdadeiramente interessa e o que é dispensável, o que é fundamentado e o que é apenas boato, palpite ou mesmo patranha. A segmentação de interesses e a extrema variedade de temas para os múltiplos interesses pessoais instalou-se. A informação hoje é multipolar e mundividente, cabendo ao indivíduo - a cada indivíduo - selecionar o que lhe agrada, o que lhe interessa, o que pretende. Neste circunstancialismo, qual o papel da maçonaria? Como pode e deve comunicar? Com que meios? Seguindo que estratégias? Procurando assegurar que objetivos?

Trezentos anos depois, estamos no fim do caminho, chegámos a uma encruzilhada ou simplesmente somos nós que temos de desbravar o caminho para que a Humanidade chegue aonde ainda não imaginou sequer poder chegar? O nosso - dos maçons, da Maçonaria, mas também da Humanidade - caminho chega até ao horizonte ou vai para além dele?

Tudo isto são interrogações que hoje se abrem à reflexão dos maçons e que é bom que os maçons se coloquem, em reflexão individual ou em análise coletiva, mas sempre plural.  

Por mim, penso que há ainda muito a fazer, que os sonhos e anseios do ideário maçónico estão ainda por completar. Quanta intolerância ainda campeia! Como são ainda vulneráveis muitos dos valores que, muitas vezes ligeiramente, consideramos solidamente implantados! E continua a haver - sempre continuará, acho - espaço e meio para cada um de nós poder melhorar e contribuir para a melhoria da sociedade. 

Mas também penso que as interrogações que atrás coloquei devem ser postas e que é tempo de lhes darmos atenção, de estudarmos os seus contornos e de buscarmos as respostas mais adequadas para cada uma delas. Nesse aspecto, a Maçonaria tem em si mesma uma caraterística organizacional que constitui uma poderosa ferramenta: a sua estrutura nuclear, com plena autonomia de cada Loja e, dentro destas, com plena aceitação dos caminhos e reflexões individuais de cada um. Isto permite que todas as interrogações acima colocadas - e muitas outras - sejam tratadas de formas diferentes, por gente diferente, em tempos diferentes, com diversas perspectivas. Cada Loja escolhe ou naturalmente dedica-se a um pequeno aspecto de um problema. Cada maçom interroga-se sobre o que lhe chama a atenção. Umas e outros buscam caminhos, propõem soluções. Cada Loja por si. Cada maçom em si. Em aparente desorganização e descoordenação. Mas é precisamente essa desorganização que se revela, afinal, muito bem organizada, na medida em que permite e gera o máximo de liberdade na reflexão dos grupos e dos indivíduos. Desse cadinho, a seu tempo emerge uma ideia que se espalha. Das ideias que se espalham, algumas fortalecem-se. Das que se fortalecem, algumas atingirão o patamar do consenso. E assim as ideias e os valores que o tempo presente reclama emergem e fazem o seu caminho, em sociedades modernas cada vez mais complexas.

Daqui a outros trezentos anos, quem então viver e se interessar fará o balanço sobre o êxito dos trabalhos, pistas, soluções e caminhos que agora efetuamos, buscamos, encontramos e prosseguimos.


junho 01, 2023

ENTRE COLUNAS - Adilson Zotovici



São lembranças oportunas

Atento livre pedreiro

A não deixares lacunas

Em teu labor sobranceiro


Arcanos que são fortunas

Vividos o tempo inteiro

Que sem enganos coadunas

No desbaste rotineiro


Mestre, aprendiz, companheiro

Lembra-te por derradeiro

Bradam Mestres das tribunas


Onde estiveres obreiro

Nos limites do canteiro

Estarás entre colunas !!


O TESTAMENTO DE QUINTINO BOCAIUVA - José Castellani




Podendo suceder que eu faleça repentinamente, ou em condições de não poder exprimir as minhas últimas vontades, deixo escritas estas instruções, cuja execução recomendo às pessoas de minha família e cujo cumprimento rogo às pessoas estranhas, entre as quais, por acaso, eu venha a falecer.

Desejo ser sepultado no cemitério mais próximo do lugar onde eu faleça, sem honras civis ou religiosas de nenhuma espécie.

Se eu falecer na cidade do Rio de Janeiro e na minha residência habitual, desejo ser enterrado no cemitério de Jacarepaguá. Se eu falecer em Pindamonhangaba, deve o meu corpo ser sepultado no cemitério dessa cidade.

A condução do meu corpo, neste caso, deve ser feita por camaradas da fazenda de Santa Helena (seis ou oito), a cada um dos quais se abonará a gratificação de dez mil réis.

Desejo ser sepultado em cova rasa, sobre a qual não se fará lápide ou qualquer outro símbolo material, que recorde a minha existência.

Em nenhuma hipótese, faleça eu onde falecer, o meu corpo será embalsamado ou conservado por qualquer outro processo.

Minha família não fará anúncio ou convites para o meu enterro, nem tampouco mandará dizer missas por minha alma, conforme o estilo comum.

Na minha qualidade de maçom e livre pensador, não tenho direito aos sufrágios da igreja católica romana.

Penso ter sido intimamente cristão e suponho que o cristianismo, na sua pureza de origem, é ainda um ideal afastado da humanidade nos tempos que correm.

O meu enterro deve ser decente, mas singelo --- não quero armação de eça na minha casa, nem encomendação de nenhum padre, ainda que algum se ofereça para isso.

Findo o prazo legal, os meus despojos devem ir para o ossuário comum. Mais ou menos, é este o resumo das minhas disposições testamentárias.

Rio de Janeiro, julho de 1907

Q. Bocaiuva


Quintino Bocaiúva , nascido a 4 de dezembro de 1836, em Itaguaí (RJ), foi jornalista, político e um dos maiores nomes do movimento republicano brasileiro. Seu nome de batismo era Quintino de Sousa Ferreira; todavia, na época em que estudava Direito em S. Paulo, ele adotou um nome nativista --- prática em voga, na época --- passando a Quintino de Sousa Bocaiúva e, depois, simplesmente a Quintino Bocaiúva (bocaiúva é uma espécie de coqueiro brasileiro, também chamado de macaúba e coco-de-catarro).

Matriculado na Faculdade de Direito de São Paulo, no curso de Humanidades, em 1851, iniciou sua carreira jornalística como tipógrafo, redator e revisor do "O Ipiranga", jornal do Partido Liberal. Em 1852, a 29 de junho, era iniciado na Loja Piratininga, da capital de São Paulo --- fundada a 28 de agosto de 1850 ---bem antes de ter completado a idade regulamentar, por ser filho de maçom (na ata consta que ele tinha 19 anos de idade, mas tinha menos) (1).

Radicado, posteriormente, no Rio de Janeiro, teve brilhante trajetória na imprensa, primeiro no "Diário do Rio" e, depois, no "Correio Mercantil". Em abril de 1864, ele aparece como um dos instaladores da Loja Segredo, pertencente ao Grande Oriente do Vale dos Beneditinos, liderado por Joaquim Saldanha Marinho. Em junho do mesmo ano, era admitido como membro do quadro da Loja Comércio, do mesmo círculo. Essa dissidência criada por Saldanha Marinho iria chegar ao fim em janeiro de 1883, quando suas Lojas foram integradas, ou reintegradas ao Grande Oriente do Brasil.

Em 1870, Quintino foi o redator do famoso manifesto republicano, publicado no primeiro número do jornal "A República", que viria a ser empastelado em 1873. Em 1874, fundou o "O Globo" e, em 1884, o "O País", tendo, este último, exercido grande influência na campanha republicana. Por sua atuação na imprensa, ele foi cognominado, por seus contemporâneos, "o Príncipe dos Jornalistas Brasileiros" (2).

Tão grande era o seu prestígio, como líder republicano, em todos os meios, inclusive no militar, que, na madrugada de 15 de novembro de 1889, Quintino cavalgou ao lado de Deodoro da Fonseca, como único civil a participar, ativamente, do capítulo final do movimento republicano, com a queda do Segundo Império. Implantada a República, ele ocupou o Ministério do Exterior, durante o Governo Provisório.

No Grande Oriente do Brasil, Quintino foi eleito Grão-Mestre Adjunto, em 1897. Eleito presidente do Estado do Rio, tomou posse a 31 de dezembro de 1900 e estava no cargo quando foi eleito Grão-Mestre do Grande Oriente do Brasil, em fevereiro de 1901, tendo sido empossado em junho e tendo, como Adjunto, Henrique Valadares. Foi durante o seu mandato que começaram a ser implantados os Grandes Orientes Estaduais federados, de acordo com a Constituição sancionada pelo Decreto No. 179, de 31 de dezembro de 1900, a qual facultava essa implantação. O primeiro foi o de São Paulo, autorizado a funcionar, através do Decreto No. 195, de 1º de outubro de 1901, e regularmente instalado a 24 de junho de 1902. A 21 de junho de 1904, Quintino entregava o malhete de supremo mandatário da Maçonaria brasileira ao senador e general Lauro Sodré.

Em 1909, foi eleito senador da República, vindo a falecer a 11 de julho de 1912, no Rio de Janeiro, no atual subúrbio que tem o seu nome. Morreu em um ambiente de pobreza, no qual sempre viveu, pois jamais se locupletou com os cargos que exerceu.

O seu testamento é de uma absoluta coerência com o seu modo de ser, durante toda a sua vida: homem simples, rejeitou qualquer pompa em seus funerais; espiritualista, rejeitou qualquer símbolo material, que, sobre sua cova, recordasse sua existência; filho de uma época de intolerância religiosa, entendia que a pureza da doutrina cristã ainda estava longe de ser alcançada pela humanidade, exatamente em decorrência do radicalismo do clero da época; com a dignidade e a coragem de se declarar, sem subterfúgios, maçom e livre pensador, rejeitou os sufrágios da Igreja, numa época em que muitos ocultavam sua qualidade maçônica e procuravam as benesses do clero, como passaporte seguro para o reino dos céus (3).