janeiro 13, 2024

TRABALHE ENQUANTO ELES DORMEM...- André Naves



    

Jacareí, como toda cidade brasileira, também tem suas carências, suas dificuldades e suas feiuras... Mas, igual a todas as outras, tem suas belezas, suas alegrias, sua poesia cotidiana. E de uma coisa ela pode se orgulhar! 

A localização é encantadora: Jacareí, a Atenas Paulista e Cabrocha da Dutra... Estamos perto da praia, da montanha, do aeroporto, de São Paulo, do Rio e de Minas. Jacareí é um tipo de encruzilhada sudestina...

A fornalha carioca também é uma rosa cheia de espinhos... Purgatório da beleza e do caos, cantaria Fernanda Abreu... Vinícius, cheio de saudades, lembraria dos sons do piano na rua Nascimento Silva, 107, e de tudo o que já não era mais.

Mas a verdade é que o Criador também gosta de algum lirismo... Ele escreveu a mais bela poesia em forma de cidade: Rio de Janeiro.

Uma prima minha morou lá por vários anos. Ela também tem um nome poético, desses que parece um pouco a luz do luar. No fundo, se a gente pensar bem, todo nome é lírico! Toda gente é bela! A humanidade é poeta!

Mas voltando, antes que eu perca o rumo da prosa ainda mais... A casa dela ficava em Santa Tereza, bairro que une o samba à Mata Atlântica. Era um antigo convento, transformado em morada. Verde, música e lar...

E que bela decoradora, além de tantas outras coisas boas, ela é! Ela pega o objeto mais comum, normal, corriqueiro, e coloca num lugar que o enche de significado e graça. Ela taca uma moldura no ordinário e constrói o extraordinário! Enfeita a casa e constrói um lar! 

Sabe quem enxerga a beleza no comum?

Acho até que isso já vem de berço. É que minha tia, a mãe dela, é desse mesmo jeitinho... Meu tio, o pai dela, que já caminha pelas luzes do luar, também...

Eu pousei naquele encanto da Beleza uma vez. Era uma reunião de trabalho que eu teria com meu amigo João, e com um tal de Zé, num boteco de Copacabana. Trabalho, boteco e domingo não rimam...

Não existe trabalho ruim... O ruim é ter que trabalhar, resmungava o seu Madruga.

Mas fazer o que, né? O João era um daqueles monstros sagrados que me tinha como aprendiz. Ele queria desbastar um pouco meu pedregulho interno, fazer minha poética interna se derramar no texto...

Era domingo que ele queria? Era boteco? Era Copacabana? Eu nem questionei... Eu só fui... Mesmo sem ter nem roupa, fui!

No caminho fomos passando pelo bonde, pelas árvores, pela passarada, e por vários botecos em que a gente carioca cantava, bebia e torcia. Domingo no boteco é só samba e futebol, gostava de dizer o João. 

É a poesia do povo! Um pingo de igualdade social naquele oceano de iniquidade! Como é belo o feio Rio! Como é feio o belo Rio!

Naquela mesma mesinha de latão, já na calçada, estava, como sempre, o João. Óculos, bigode, a careca típica da meia idade já avançando, uma camisa azul aberta, calção e chinelas meio vermelhos... Um copo americano de cerveja pela metade...

Na cambaleante cadeira do lado estava o Zé. Um português já idoso, também de óculos, mas sem bigode, de calça cinza, camisa branca, um impressionante pulôver preto que gritava de tanto sufocar naquele abafamento tropical... 

Os europeus nunca entenderão a civilização do Sol e da Beleza!

Aproximei-me, puxei uma cadeira de lado e, tentando me equilibrar, me sentei. A mesinha, de um latão mambembe, em cima daquele chão em que o mosaico português brigava com as raízes dos flamboyants, parecia dançar um jongo ancestral... 

João deu uma risada e falou:

“Se achegue no meu escritório! Vou pedir um copo para você também!”, com aquele sotaque, doce e arrastado como o chocolate de Itaparica.

Eu ainda sem acreditar, encarei bem o Zé... Como eu poderia estar ali? Um “nada”, ao lado de dois “tudo”. Sabe o João Batista, que repetia não servir nem para amarrar as sandálias de seu primo? Era bem assim que eu me sentia.

Mas, a vida quer da gente é coragem... Fui direto ao ponto:

“Vamos comer o que?”

“Sardinhas assadas e torradas com manteiga e alho”, foi direto ao ponto o Zé. 

O João parecia concordar, já que ficou calado enquanto olhava para mais uma de tantas sereias que passavam...

E o Zé continuou: “a gente tem de comer o que o povo come! A gente escreve como o povo fala. Se a literatura não dissolve as correias que prendem nossa gente, ela não serve para nada!”.

O João, batucando a mesa e admirando as ondas no copo de cerveja, quis dar seu pitaco também: “Isso é verdade pura! No ‘Viva o Povo Brasileiro’, o personagem principal, o mais importante, é o povo. Ele que tem costumes, tradições e trabalho. É ele que cultiva a língua na fala. É ele que escreve na labuta cotidiana. O Povo sabe!”

Eu queria ficar rouco de tanto ouvir! Só conseguimos escutar quando abrimos as alas para o silêncio e para a reflexão...

Zé interrompeu: “Acho que escrever é um ato de esforço e disciplina. Todo dia sento e escrevo, e as palavras vão me guiando por caminhos de luz e sombras que eu nunca imaginava poder pensar... Uma vez, eu tava escrevendo ‘Levantando do Chão’... Já tinha escrito umas 20 páginas quando percebi que para falar eu precisava ser entendido. Foi aí que fui buscar a língua da gente! A linguagem popular!”

“Mas a linguagem popular é tinhosa! Ela é traiçoeira e rápida igual uma caninana!”, falou por cima o João... “Uma vez eu tava tomando uma cachaça de rolha lá na praia, contente, sossegado. Chegou um consagrado e ligou o rádio bem alto. Eu até gostei da música, mas naquela hora eu queria escutar a melodia do vento... A falta de educação também é parte da língua do povo!”.

“Aliás, vamos de caninha?”, perguntou. Na verdade, ele já sabia da resposta... É que ele nem deu tempo e já foi chamando o garçom: “Meu consagrado! 3 da boa, por favor!”, e com a mão fez o gesto, tão verde-amarelo, da cachaça.

O Zé, com uma cara de poucos amigos, falou: “Falta de educação igual a sua, João, que já atropelou meu discurso! Há uns dias Pilar e eu nos banhávamos nos mares de Cabo Frio. Era muito gostoso. Um cardume colorido se acercava de nós, e, aos poucos, beliscava nossas pernas. Chegava a fazer cosquinha... Quando eu ia pegar um deles, o cardume fugia. Estavam ali, encostando em mim, mas eu não conseguia tocar!

A linguagem popular é igual esse cardume! Se a gente força demais, fica parecendo um bobo da corte escrevendo. Se a gente força de menos, continuamos presos nas masmorras da incompreensão.

Pegar o idioma popular é uma arte! É pra poucos!”

Nesse momento apareceu o garçom. Na bandeja, as sardinhas tostadas, uma porção de pães assados, mais uma cerveja e uma garrafa de pinga. Era a da casa, feita artesanalmente, lá em Paraty, pela família do dono.

“Essa é das boas!”, celebrou o João! “Qual seu nome, por gentileza, meu amigo?”

“Johnny. Mas você já me conhece. Eu te atendo sempre aqui, seu João.”

“Eu sei. É que eu queria te apresentar para os meus amigos, o paulistinha André e o portuga Zé.”

“Olá pessoal! Qualquer coisa, estamos às ordens!”

O Zé sorriu amarelado: “Vocês do lado de cá tem cada costume! Uma sonoridade lírica e linda ‘JOÃO’ que não se acha em lugar nenhum do mundo... E vocês insistem em emporcalhá-la com esse lixo estrangeiro... “Johnny, onde já se viu? Esse mundo se perde!”

João, rindo muito, completou: “Sonoridade ainda mais linda aqui no Brasil, em que as vogais parecem ter se espreguiçado e deitado numa esteira de vime... JOÃO! Só esse nome já dá música... João...”

“É... Olha como a língua popular é um camaleão! João é muito mais linda! É de um lirismo lusitano gigantesco... Mas o povo prefere o lixo inglês! Johnny! São os peixes daquele cardume... Tão à mão, tão intocáveis!”, suspirou Zé, como Don Quixote que adoraria vencer os gigantes mas sabe que eles não passam de moinhos de vento...

“Pindura aí, Johnny! Pago na próxima! Vou levar meus amigos ali para ver o Sol se deitar em Copacabana!”

Levantamos os três e fomos pela areia maravilhados pelas cores alaranjadas que iam desabando sobre o mar... “As artes nascem de quem consegue enxergar esse espetáculo! Tentem escutar o pôr do Sol... Será que Beethoven era brasileiro?” riu demais o Zé!

“Nossa próxima reunião será em Itapoã!”, gritou o João.

A gente riu demais...

Até hoje, quando me perguntam dessa reunião de trabalho, dou uma de Chicó, o amigo de João Grilo: “Não sei... Só sei que foi assim...”.

Será?




ACÁCIA. . . - José Mendes



Ah... como te vejo em diferentes formas...

altaneira...suave...bela.

Da janela do meu quarto, vejo-te Acácia.

Compartilho contigo teus estágios

em diferentes mutações das estações.

Perpassam em meus pensamentos

teus valores religiosos,

tua tradição e teus inúmeros símbolos.

Ao contemplar-te recordo do que representou

a arca da aliança, a coroa de espinhos.

Ainda, aquele que foi plantado

no túmulo de Hiram e

todo o pensamento judaico-cristão.

Símbolo solar de renascimentos e imortalidade.

Ao olhar-te percebo a tua fortaleza

ante as vicissitudes da vida.

Sinto tua sede quando todas as tuas folhas

tombam no inverno.

Compreendo que te despedes

para adubar as plantinhas

que nascem ao teu redor e deixar,

por algum período,

que o sol as revitalize com a tua energia.

Estou sempre a reverenciar-te e,

muitas vezes, com sentimentos de gratidão

e misericórdia; outras, com ternura, amor e esperança.

Procuro aprender contigo as lições da perseverança e da

obediência às leis naturais que vem transmitindo através dos tempos.

Aos poucos estou entendendo, com o teu exemplo, que é preciso saber

morrer para renascer... 

a cada estação, a cada emoção,

a cada encontro,

a cada decepção,

a cada sonho

e a cada adeus...


O LATIM NOSSO DE CADA DIA - Newton Agrella


As expressões idiomáticas, e elas são inúmeras na Língua Portuguesa, via de regra, originam-se de usos e costumes  que ganharam vida ao longo da História e sobretudo no tocante ao comportamento humano.

Uma dessas expressões que denota literalmente sua origem é do "bajulador".  

Aliás, cabe aí, breve explicação etimológica. 

"Bajulare" do Latim "bajulus" significa, o que leva a carga para outro, mensageiro.

Essa palavra está intimamente ligada à expressão popular "puxa-saco", cujos relatos orais dão conta que  parece ter surgido da época do Brasil Colônia, quando os oficiais do Exército, ao serem transferidos para outra cidade, chegavam levando os seus pertences num saco de pano. 

Ao chegarem ao seu destino, procurando um lugar para pousar, sempre aparecia alguém querendo pegar o saco para ajudá-los, de olho na gorjeta ou em qualquer outra vantagem.

Esse viés do comportamento humano, estende-se frequentemente e ganha raias do chamado "people pleaser", expressão amplamente utilizada na língua inglesa, que nada mais é, senão o puxa-saco desmedido, por alguns aqui no Brasil,  também chamado de "bajulador psíquico".

Essa expressão faz referência a alguém que adota determinadas atitudes e comportamentos com o claro e inequívoco intento de agradar e bajular o outro. 

Dizer sempre "sim", externar elogios gratuitos, bater palminhas, concordar com tudo, fazer favores a cada pouco, colocar-se sempre à disposição dos outros, fingir que concorda com a opinião alheia mesmo que isso fira seus valores mais recônditos, são exemplos tácitos desse tipo de pessoa.

Diferente do que possa parecer, o objetivo não é nada altruísta.

A bem da verdade, o “bajulador psíquico” quer sim  induzir o outro a satisfazer seus mais íntimos desejos psíquicos.

Esse tipo bem característico é facilmente encontrável nos mais diversos segmentos da sociedade humana, e independe de sexo, gênero, tamanho ou idade e até mesmo do nível sociocultural.

Cabe contudo lembrar, que ninguém consegue agradar a todos o tempo todo e uma hora ou outra a insatisfação e a frustração vão bater à porta do bajulador.

Talvez esse comportamento e essa predisposição estejam ligados à questão da autoestima e à busca de aceitação.

Seja qual for o grupo social a que se esteja atrelado, aprender a se valorizar e enxergar o mundo com mais personalidade, pode ser um caminho para a própria evolução.

É missão do Maçom, projetar, esculpir e buscar  aprimoramento de formas e conteúdo de seu templo interior, independentemente de agradar aos outros, mas sabendo conviver, e sendo natural, sincero e transparente em cada atitude que traduza o seu ritual de vida.

Respeitar-se a si mesmo é o primeiro passo.



janeiro 12, 2024

INICIAÇÃO MAÇONICA E PSICANÁLISE - Jean-Luc Maxence


Iniciação maçônica e psicanálise de inspiração junguiana pertencem a uma verdadeira teoria da libertação pessoal que visa a um complemento de realização da pessoa, uma espécie de superação da miséria interior.

Na realidade, não há qualquer necessidade de ter sido iniciado no Grande Oriente, na Grande Loja da França, na Grande Loja Nacional da França, na Maçonaria Mista ou em outro lugar, de acordo com esse ou aquele ritual tradicional, sob qualquer tipo de obediência, para saber como se desenrola o cenário in praxis. Com efeito, nosso século, mesmo guardando desesperadamente o gosto pelo segredo, de modo paradoxal, só gosta deste último quando ele é revelado ou vulgarizado diante de e para um grande número, inclusive e principalmente por jornalistas ávidos de sensacionalismo e de enigmas esotéricos.

O próprio glossário da Maçonaria tornou-se conhecido de todos, para não dizer vulgarizado. De fato, livros foram editados, na Europa e no resto do mundo, sobre as regras maçônicas que pontilham uma realização espiritual… Felizmente, e como René Guénon nos lembra com satisfação em sua obra, a iniciação não pode jamais, para além do conceito, ser expressa ou sintetizada por palavras precisas!

Em uma sociedade, com frequência, mais vinculada à superfície das aparências imediatas e imediatamente perceptíveis do que à profundeza do pensamento, muitas vezes, oculto por pudor ou por vontade deliberada, tornou-se evidente que todo segredo apenas pode dissimular o diabólico e que todo juramento discreto pronunciado por vários pode ser apenas a antecâmara dos complôs mais horríveis.

Claro, não se está mais na época das imposturas organizada, como aquela do jornalista escroque Léo Taxil, que fez com que muitos eclesiásticos católicos, a partir de 1892, acreditassem que o Demônio aparecia nas Lojas e dirigia as reuniões. Mas nosso início de século ainda gosta de condenar a Maçonaria Especulativa, vendo ali apenas pretextos para falcatruas políticas ou financeiras, e muitas vezes estendendo a suspeita aos recantos às vezes obscuros de algumas Oficinas maçônicas.

Na realidade, quando um postulante profano faz, de boa vontade, um pedido de iniciação, de entrada, portanto, na via espiritual da Maçonaria, o “caminho a seguir” é bastante simples e não tem nada de hermético. Primeiro, o interessado expressa sua candidatura por escrito. Depois, uma “pesquisa” é conduzida junto a ele, em geral por três pessoas já Mestres. Então, ele se apresenta a um encontro preciso, com os olhos vendados, no Templo no qual será oficialmente ouvido e interrogado. 

E a célebre “passagem sob a venda” que ainda hoje provoca fantasias entre tantos profanos e provavelmente encontra suas origens ancestrais em uma rica simbólica que talvez remonte aos mistérios de Elêusis, ou até bem antes. Quando o recipiendário poderá retirar sua venda que o torna provisoriamente cego, durante a iniciação propriamente dita, ele receberá então a luz. Essa luz lhe parecerá tão mais intensa porque dela esteve privado por muito tempo. Trata-se de uma luz com significações simbólicas polimorfas, segundo os Catecismos dos primeiros rituais. Assim, no R...E...A...A... (Rito Escocês Antigo e Aceito), a instrução esclarece:

-“A luz só ilumina o espírito humano quando nada se opõe à sua irradiação. Enquanto a ilusão e os preconceitos nos cegam, a obscuridade reina em nós e nos torna insensíveis ao esplendor da verdade”. No R...E...R... (Rito Escocês Retificado), é explicado que a luz “elementar” da qual o recipiendário está privado é o “símbolo demasiado evidente dos falsos brilhos que dividem o homem abandonado à sua própria direção”. Diz-se até mesmo: “Vós estais nas Trevas, mas não temais, vosso guia caminha na luz e não pode vos desviar”.

Dito de uma outra forma, a luz entregue ao novo iniciado é o levantar da cortina, ou a aurora, de um longo e complexo processo de lenta transformação individual que às vezes conduz a uma espécie de deslumbramento interior. Portanto, expresso de uma forma mais abrangente, a iniciação parece um processo destinado a realizar “psicologicamente” (propõe Serge Hutin), até mesmo “psicanaliticamente” (acrescenta Bruno Etienne), a passagem de um estado profano a um estado sagrado, de uma quase cegueira a uma clarividência verdadeira. E Jean Mourges, então, chegaria até mesmo a sustentar que a iniciação se revelava como uma verdadeira “metafísica vivida”.

O processo de individuação, de acordo com Jung, não seria também uma “metafísica vivida”? Da mesma maneira, no decorrer da iniciação maçônica, quando é solicitado ao neófito que deposite seus “metais” na entrada do Templo, isto é, que deixe fora do espaço sagrado, antes da reunião solene, seus objetos pessoais de valor (“nem ouro, nem prata, nem relógio, nem brincos, nem qualquer outra joia, nem metais”, esclarece um texto de 1801), isso não corresponderia ao que o psicanalista de inspiração junguiana pede ao seu “paciente-impaciente” analisado, ou seja, que deixe de lado sua máscara social, ou melhor dizendo, sua famosa “persona”!

O conceito de persona, para Jung, é capital e só pode ser compreendido se colocado em relação àquele do Si mesmo já evocado. Ao longo de seus trabalhos sobre a identidade, o inventor da psicologia das profundezas recomenda ao Eu de “se descolar” de sua própria persona. Ou, dito de uma outra forma, de sua máscara sociocultural, ele nomeia e define então a persona. Ele evoca suas origens latinas, uma vez que a palavra em questão designava a máscara da tragédia, que era ao mesmo tempo “porta-voz” (“per-sonare”) e identificação do personagem representado no palco pelo ator.

Ora, no decorrer de sua vida, Jung nunca deixou de “levantar a máscara”. Por isso, Ysé Tardan Masquelier pode logicamente escrever: “A persona tem muito a ver com o que Ma vie chama de ‘a personalidade número um’, essa construção de superfície que tem o mérito de permitir ao ser profundo de se expressar de uma forma precisa, de se comunicar com o outro tendo como base os diferente papéis que lhe são atribuídos”.

Não se trata de, evidentemente, compreender o conceito de persona, sob o pretexto de uma semelhança sonora, como sinónimo usual da palavra francesa personne (pessoa). Isso induziria, evidentemente, a um inoportuno contrassenso. Aliás, o próprio Jung afirma: “é necessário se dar conta de que, caso se vá até o fundo das coisas, a persona não tem nada de real: ela não se beneficia de qualquer realidade própria; ela é somente a formação de compromisso entre o indivíduo e a sociedade”. Em outros termos, a persona é o papel social, o lobo que apresentamos ao olhar do outro, em nosso meio profissional, muitas vezes também em nosso meio familiar, essa “máscara”, essa fantasia nem sempre consciente de ser uma imagem superficial de nossa “personagem mundana”.

A persona é contingente das influências exteriores, dos cenários, das conveniências, e, portanto, transitória, ou, pelo menos, flutuante. Ela é aquilo que constitui nossa aparente identidade, mas não é de forma alguma nossa personalidade verdadeira. Ela é aquilo que parece nossa globalidade. Ela é, em realidade, quando se vê sob o véu de Ísis, somente nosso falso reflexo. A persona é nosso escudo social que deve ser quebrado, nossa casca superficial, nossa carapaça que deve ser rompida custe o que custar caso se queira apreender nosso núcleo autêntico de integração psíquica. 

É exatamente isso que leva C. G. Jung a escrever: “Por estar sujeito a um nome, adquire um título, assume uma carga que ele representa e encarna; um é isto, o outro é aquilo. Claro, naturalmente, em um certo sentido, isso corresponde a alguma coisa; todavia, comparada à individualidade do sujeito, sua persona não é senão uma realidade secundária, um simples artifício, um compromisso em cuja constituição outros participam muitas vezes bem mais do que o próprio interessado. Sua persona é apenas uma aparência, e poderíamos dizer por meio de uma tirada espirituosa, uma realidade com duas dimensões”.

Sob esse ponto de vista, o paciente que vem ver C. G. Jung ou seus sucessores contemporâneos em seu consultório não tem de, necessariamente, destruir sua persona, deslocá-la ou negá-la, mas ter bastante consciência de sua presença, ter bastante consciência de suas influências, de sua importância por vezes perversa, para então “jogar a máscara e só iniciar uma psicoterapia ou uma análise estando de alguma forma “desmascarado”, disposto a renascer mais verdadeiro, mais nu, aceitando de antemão uma espécie de segundo nascimento de si mesmo. E disso que se trata estar em uma “viagem” em psicologia das profundezas. Nada menos, em todo caso.

Da mesma maneira, o iniciado que vem à porta do Templo pedir a Luz, que aceita sofrer a cegueira da venda e a iluminação repentina, muitas vezes ofuscante, de seu desarraigamento, assemelha-se inegavelmente ao sujeito que engaja, de modo voluntário, um processo psicanalítico. As duas posturas parecem, então, paralelas. O iniciado, como já foi visto, deposita seus “metais” no limiar do Templo antes de ali entrar em busca, principalmente, do Templo ideal que cada um abriga em si, em busca tenaz de toda força, sabedoria e beleza. 

O analisado que se deita no divã ou se acomoda em sua poltrona, diante de seu analista, também de alguma forma esvazia seus bolsos psíquicos. Ele abandona suas reações de respeito humano, seus pudores, suas falsas vergonhas e suas manobras de fuga. Ele deixa fluir a palavra libertadora, aquela do inconsciente que fala. Isso lhe permite “mergulhar” no oceano das lembranças e das imagens passadas. Ele reencontra sensações vindas de longe. Ele se aproxima de seu próprio centro (com ou sem maiúscula real!).

O analisado, como o iniciado, aceita morrer para renascer melhor. Ele empreende um trabalho de clarificação de si mesmo, de sustentação, com muita frequência, de humildade no início. Ele aceita a regra principal de um falso jogo, uma vez que engaja o conjunto de sua personalidade, ou seja, a regra de ouro que consiste em se entregar mesmo com a emergência muitas vezes misteriosa e assustadora do vasto e indefinido continente do inconsciente, sendo este individual ou coletivo.

De acordo com esses pontos de vista, iniciado e analisado adotam uma mesma postura, um mesmo combate. Eles desejam ganhar o lugar de sua própria verdade, de sua profundeza, de sua própria pedra filosofal. Eles correm o risco insensato da ressurreição, do renascimento. Estamos, então, em pleno mito universal e fundador. Claro, trata-se de morrer a si mesmo para melhor renascer a si mesmo, de passar de um estado ontológico aparentemente inferior (cegueira espiritual) a um conhecimento (gnose?). 

Trata-se de meditar na famosa “Câmara de Reflexão”, a fim de se preparar, a seguir, para a passagem da obscuridade para a luz, do profano ao Aprendiz, do Aprendiz ao Mestre, tomando a “ponte” do Companheiro… É a eterna travessia da morte, dos infernos, do obscuro, da Sombra capital para a aurora magnífica e pura da lucidez e da harmonia. No consultório do clínico (ele é o ouvido benévolo, o analisado “vasculha” a pré-história de sua psique. De certo modo, ele analisa seu próprio passado, quando deixar fluir sua palavra presente para se armar melhor com as ferramentas eficazes que lhe permitirão, no melhor dos casos de uma cura possível, apreender melhor o futuro e seus obstáculos.

O “conhece-te a ti mesmo” não envelheceu em nada e talvez por isso os deuses continuem desaparecendo da memória dos homens. Tanto na iniciação quanto na cura analítica do tipo junguiano, o que está em jogo é realmente da ordem da integração psíquica como objetivo das duas posturas propostas àqueles que buscam sua própria verdade. Nos dois casos, trata-se realmente de uma “libertação”. A última etapa do “processo de individuação”, tantas vezes já evocado, é a saúde psíquica e social e também física. E isso só é possível quando se arranca, muitas vezes com dor, a máscara de sua persona.

Como escrevia há muito tempo (em 1960) Alan W. Watts, seria uma loucura jogá-la na lixeira: “Quando examinamos de perto as regras de vida do Budismo e do Taoísmo, do Vedanta e do Yoga somos realmente obrigados a constatar que não se trata de forma alguma de filosofias ou de religiões, pelo menos não no sentido como as entendemos no Ocidente. Elas seriam muito mais comparáveis à nossa psicoterapia”. Da iniciação maçônica, aos nossos olhos, poderíamos fazer a mesma observação. Na realidade, a semelhança essencial entre o ensinamento das organizações tradicionais iniciáticas (métodos específicos de realização espiritual) e a psicologia das profundezas e suas psicoterapias reside em um objetivo comum: chegar gradualmente, à custa de um melhor conhecimento de si mesmo, a significativas mudanças de consciência que nos permitem sentir diferentemente nossa própria aventura existencial, apreender sob um novo ponto de vista nossos laços relacionais com a sociedade e com o meio natural.

Iniciação maçônica e psicanálise de inspiração junguiana pertencem a uma verdadeira teoria da libertação pessoal que visa a um complemento de realização da pessoa, uma espécie de superação da miséria interior. O iniciado aceita passar por uma série de provas, superar obstáculos, viver “viagens”, para que tudo “isso” revele mais do que as simples palavras da tribo que precisam ser ditas. O próprio teatro onde acontece misteriosamente a lenta empreitada dual (e que sonha com uma reconciliação dos contrários) é, sem dúvida, a Loja. 

E o Aprendiz, obrigatoriamente durante os primeiros tempos de sua presença “em reunião”, mantém o silêncio e o respeito. Ele rapidamente aprende, ao experimentá-lo, que o silêncio “fala” e que a atenção e a vigilância são mais fáceis. Em análise, seja na linha de Freud, Jung ou Lacan, o silêncio também tem sua importância capital. Por experiência, sabemos que é muitas vezes entre uma palavra e outra, na respiração entre duas frases, na pausa que incita à reflexão e à explosão da emoção e do ressentido, que essa indispensável “abertura” do paciente em relação aos seus conflitos, desejos, medos e bloqueios encontra seu lugar. Sim, a cura analítica tem realmente como objetivo “no fim da corrida” (ou da individuação?) superar o Ego por meio de uma transformação da consciência, não indo, porém, ao encontro das grandes tradições do Oriente, como a do Senhor Buda, que ensina que o Ego é detestável, o que seria o mesmo que dizer, como Krishnamurti: “a personalidade me desgosta!”. 

C. G. Jung, como psiquiatra, diz realmente que a persona deve ser superada, e não destruída, para alcançar o Si (isto é, o sucesso holístico do conjunto de um destino humano). Nem sempre ele está distante de uma certa tradição tibetana que diz que toda estrada de realização sempre terá de enfrentar o Ego, dominá-lo, castigá-lo, superá-lo, e até mesmo aniquilá-lo. Que ele o nomeie “Grande Arquiteto do Universo” ou não, o artesão maçom se abre inteiramente à intuição de uma realidade maior do que ele próprio, a uma vastidão, diria, no entanto, o agnóstico Luc Ferry, que ultrapassa o indivíduo.

 Tradução Idalina Lopes

ALGUMAS DICAS QUE VALE A PENA SEGUIR


Cientistas de uma universidade americana publicaram um compêndio com 20 conselhos saudáveis para melhorar a qualidade de vida de forma prática e habitual:

Um copo diário de suco de laranja para aumentar o ferro e repor a vitamina C.

Salpicar canela no café (mantém baixo o colesterol e estáveis os níveis de açúcar no sangue).

Trocar o pãozinho tradicional pelo pão integral que tem quase 4 vezes mais fibra, 3 vezes mais zinco e quase 2 vezes mais ferro que tem o pão branco.

Mastigar os vegetais por mais tempo. Isto aumenta a quantidade de químicos anticancerígenos liberados no corpo. Mastigar libera sinigrina. E quanto menos se cozinham os legumes, melhor efeito preventivo têm.

Adotar a regra dos 80%: servir-se menos 20% da comida que ia ingerir. Evita transtornos gastrintestinais, prolonga a vida e reduz o risco de diabetes e ataques de coração. O futuro está na laranja, que reduz em 30% o risco de câncer de pulmão.

Fazer refeições coloridas como o arco-íris. Comer uma variedade de vermelho, laranja, amarelo, verde, roxo e branco em frutas e verduras, cria uma melhor mistura de antioxidantes, vitaminas e minerais.

Comer pizza. Mas escolha as de massa fininha. O licopeno, um antioxidante dos tomates pode inibir e ainda reverter o crescimento dos tumores; e ademais é melhor absorvido pelo corpo quando os tomates estão em molhos para massas ou para pizza.

Limpar sua escova de dente e trocá-la regularmente. As escovas podem espalhar gripes e resfriados e outros germes. Assim é recomendado lavá-las com água quente pelo menos quatro vezes à semana (aproveite o banho no chuveiro), sobretudo após doenças quando devem ser mantidas separadas de outras escovas.

Realizar atividades que estimulem a mente e fortaleçam sua memória. Faça alguns testes ou quebra-cabeças, palavras cruzadas, sudoku, aprenda um idioma, alguma habilidade nova. Leia um livro e memorize parágrafos..

Usar fio dental e não mastigar chicletes. Acreditem ou não, uma pesquisa deu como resultado que as pessoas que mastigam chicletes têm mais possibilidade de sofrer de arteriosclerose, pois tem os vasos sanguíneos mais estreitos, o que pode preceder a um ataque do coração. Usar fio dental pode acrescentar seis anos a sua idade biológica porque remove as bactérias que atacam aos dentes e o corpo.

Rir. Uma boa gargalhada é um mini exercício físico: 100 a 200 gargalhadas equivalem a 10 minutos de corrida. Baixa o estresse e acorda células naturais de defesa e os anticorpos.

Não descascar com antecipação. Os vegetais ou frutas, sempre frescos, devem ser cortados e descascados na hora em que forem consumidos. Isso aumenta os níveis de nutrientes contra o câncer.

Ligar para seus parentes/pais de vez em quando. Um estudo da Faculdade de Medicina de Harvard concluiu que 91% das pessoas que não mantém um laço afetivo com seus entes queridos, particularmente com a mãe, desenvolvem alta pressão, alcoolismo ou doenças cardíacas em idade temporã.

Desfrutar de uma xícara de chá. O chá comum contém menos níveis de antioxidantes que o chá verde, e beber só uma xícara diária desta infusão diminui o risco de doenças coronárias. Cientistas israelenses também concluíram que beber chá aumenta a sobrevida depois de ataques ao coração.

Ter um animal de estimação. As pessoas que não têm animais domésticos sofrem mais de estresse e visitam o médico regularmente, dizem os cientistas da Cambridge University. Os mascotes fazem você sentir se otimista, relaxado e isso baixa a pressão do sangue. Os cães são bons amigos, mas até um peixinho dourados pode causar um bom resultado.

Colocar tomate ou verdura frescas no sanduíche. Uma porção de tomate por dia baixa o risco de doença coronária em 30%, segundo cientistas da Harvard Medical School.

Reorganizar a geladeira. As verduras em qualquer lugar de sua geladeira perdem substâncias nutritivas, porque a luz artificial do equipamento destrói os flavonóides que combatem o câncer que todo vegetal tem. Por isso é melhor usar á área reservada a ela, aquela caixa bem embaixo. Comer como um passarinho. A semente de girassol e as sementes de gergelim nas saladas e cereais são nutrientes e antioxidantes. E comer nozes entre as refeições reduz o risco de diabetes.

E por último, um bocadinho de pequenas dicas para alongar a vida:

Comer chocolate. Duas barras por semana estendem um ano a vida. O amargo é fonte de ferro, magnésio e potássio. (esse eu adorei!!! Tenho uns 20 anos a mais de vida!!)

Pensar positivamente. Pessoas otimistas podem viver até 12 anos mais que os pessimistas, que ademais pegam gripes e resfriados mais facilmente.

Ser sociável. Pessoas com fortes laços sociais ou redes de amigos têm vidas mais saudáveis que as pessoas solitárias ou que só têm contato com a família.

Conhecer a si mesmo. Aqueles que priorizam o 'ser' sobre o 'ter' têm 35% de probabilidade de viver mais tempo.

Não parece tão sacrificante, não é verdade? Uma vez incorporados os conselhos, facilmente tornam-se hábitos. É exatamente o que diz uma certa frase de Sêneca:


'Escolha a melhor forma de viver, o costume a tornará agradável.'

 

janeiro 11, 2024

O DOMO DE FERRO - Roberto Ribeiro Reis


Para toda ameaça de pensamento negativo, flertemos com a gratidão. Isso mesmo. O dom de agradecer, refletindo sobre tudo aquilo por que passamos e vencemos, é arma poderosíssima, capaz de solapar qualquer tipo de mal que ouse nos assolar.

A vida, a despeito de seus altos e baixos, continua sendo uma dádiva esplendorosa, que nos foi concedida pelo Soberano Arquiteto. Por mais que as pessoas tenham estado acérrimas, destilando todo amargor e o veneno da maledicência, jamais olvidemos que todas as agruras e tormentas da vida passam.

Naquilo que nos toca o escaninho d’alma, busquemos ser fortes e otimistas, utilizando, caso necessário, nosso domo de ferro espiritual. Somente e tão-somente assim poderemos interceptar e aniquilar toda malícia e sentimentos vis que insistem em nos derrubar, implacavelmente.

 Deslumbremo-nos com a imensidão da abóbada celeste, a qual consegue demonstrar, concomitantemente, o quão pequenos somos na Arquitetura Cósmica, mas que também somos privilegiados por podermos desfrutar de  um céu de oportunidades. É grandioso e espetacular saber que somos feitos da mesma matéria das estrelas, e que há um universo pujante e latente, vibrando voluptuosamente dentro de cada um de nós.

Quando assim pensamos e contemplamos a Grande Árvore da Vida, todos os problemas parecem diminutos e solucionáveis ou, pelo menos, a resiliência e o fortalecimento agigantam-se em nosso íntimo, tornando-nos seres mais fortes e confiantes. Exsurge uma força estranha, que nos levanta, reanimando-nos para as contendas do cotidiano.

Nosso Altar Sagrado é tomado por uma luz de inexplicável fulgor, semelhante ao que os  “sábios de abençoada memória” chamariam de “Shekhinah” ou, simplesmente, a presença de Deus. Uma conexão de profunda espiritualidade que nos permite –ainda que por alguns instantes- a interação com um sentimento verdadeiramente inefável.

A existência é sublimemente bela e harmoniosa. Nós, seres eminentemente falíveis e caídos, é que temos o mau costume de profaná-la. A imersão do homem pelo universo maçônico possibilita àquele uma caminhada mais orientada, pacífica, serena, em cuja estrada ele encontrará os mecanismos espirituais que o blindarão das vicissitudes da vida vulgar.

A Maçonaria, queridos Irmãos, é esse domo de ferro indestrutível, inabalável e inalcançável pela maledicência do homem cruento. O seu radar é de uma tecnologia superna, sutil e essencialmente extraterrena; logo, todo e qualquer bombardeio promovido pela raça humana é incapaz de lhe causar o mínimo de perturbação.

Ainda que seja alvo de grande parte da hu(má)nidade, nossa Sublime Ordem continua com sua senda irrevogável e com o dever inflexível de buscar retirar os homens das cavernas da ignorância e da escuridão, retribuindo a todos com inexcedível Luz e Sabedoria, a despeito de todo ódio e preconceito que os desditosos lhe endereçam.




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TRONCO DA SOLIDARIEDADE -



O “Tronco da Viúva” é também designado por “Tronco da Beneficência” ou “Tronco da Solidariedade”.

Ao Tronco da Viúva são lhe atribuídas várias origens, pelo que uma das mais assumidas pela Maçonaria tem origem bíblica. Hiram Abiff, mestre construtor do Templo de Salomão era filho de uma viúva. [...] 

O facto de se designar por “tronco”, deve-se ao facto dos trabalhadores afectos à construção do Templo de Salomão, os Aprendizes e Companheiros, receberem os seus salários ao final do dia, junto às colunas do Templo. Para além de que etimologicamente, “caixa de esmolas” na língua francesa também se designar por “tronc”.

Sendo que o termo “Tronco da Viúva”, simboliza também uma (caixa de) esmola para socorro e auxílio das esposas (e filhos menores) de Irmãos falecidos.

Em Loja é o Mestre Hospitaleiro que está encarregado de fazer circular o Tronco da Viúva. Tronco esse, que em dado momento litúrgico de uma sessão maçónica, circula pelos Irmãos para que possam efetuar o seu óbolo na medida em que tal lhes seja possível.

Cabe ao Mestre Hospitaleiro e ao Mestre Tesoureiro, cuidarem para que ele se encontre numa situação equilíbrio para que se possa prestar o auxílio necessário a quem dele reclamar. E como tal, o Tronco da Viúva não se quer nem muito cheio nem muito vazio. Se o mesmo se encontrar vazio, é porque as doações não serão significativas, correndo-se o risco, de se não se auxiliar quem dele necessitar numa situação imediata. Mas se ele se encontrar cheio, é porque quem necessitar de auxílio, não o estará a receber na devida forma.

Sendo que um dos deveres do Mestre Hospitaleiro é o de bem aconselhar o Venerável Mestre sobre os fins a darem às importâncias obtidas na circulação do Tronco da Viúva em Loja. A quem ou a quais, sejam Irmãos ou Instituições Sociais de que os necessitem.

Essa também é uma das funções sociais da Maçonaria. Ajudar outras instituições carenciadas que necessitem de auxílio; não procurando o Maçom o reconhecimento de tais atos, pois a soberba não deve existir nas suas ações. O Maçom assim faz, porque simplesmente acha de que o deve fazer, não porque procura méritos ou benefícios com isso. Sendo que, por não se procurar reconhecimentos ou assumir falsos méritos, é que a caridade maçónica sob a forma de tronco, é feita de forma reservada, nunca devendo um Maçom mostrar o que deposita no Tronco da Viúva.

Quem procurar reconhecimento, deve procurar outro sítio para fazer a sua solidariedade, a sua caridade.

O Tronco em si mesmo, é uma forma de Solidariedade, ele lembra ao Maçom, que a beneficência e a solidariedade devem estar presentes ao longo da sua vida, fazendo ambos parte dos deveres do Maçon. Além de que, na circulação do Tronco da Viúva em Loja se relembrar ao Maçom que ele deve ser generoso e caritativo.

Por isso, quando um Maçom faz o seu óbolo, ele deve dar um pouco de si também. Mas nunca com o pensamento de que um dia se necessitar, terá algo a que se “agarrar”. O Tronco da Viúva não serve de ”almofada” para os Maçons. Não devendo eles se aproveitarem da sua existência, para mais tarde o utilizarem sem razão aparente.

Quando um Maçom faz a sua entrega, a sua dádiva para o Tronco da Viúva, a única coisa que deve ter em mente, é o de partilhar um pouco de si mesmo e do que tem com os demais Irmãos.

Mas apesar de não ser uma obrigação principal da Maçonaria, pois a mesma não é uma INSS, cabe ao Maçom ter um espírito solidário com quem dele necessite. Por isso mesmo, a missão do Tronco da Viúva, é a de ajudar um Irmão que necessite de auxílio.

Mas para alguém puder ser ajudado, é também necessário que o Irmão em causa reconheça a sua necessidade de auxílio. Mas, nem sempre quem precisa de ajuda, o solicita. A vergonha ou inclusive o orgulho, são em grande parte dos casos, o “travão” pessoal à procura de auxílio. Quem precisa de ajuda, deve por para “trás das costas” tais sentimentos, pois agindo assim, corre o sério risco de perder toda a ajuda que necessitar. E hoje em dia, devido à forma acelerada de como vivemos as nossas vidas, nem sempre nos é possível perceber quem necessita da nossa ajuda.

Todos nós em certas alturas da Vida, passamos por momentos em que fraquejamos ou que a nossa força mental não nos consegue ajudar a suportar o dia-a-dia.

É principalmente nesses casos que o Maçom deve ajudar os seus Irmãos. Tentando se aperceber com a sua iluminação, quem necessita mais dele. Mas essa ajuda nem sempre deve ser (ou pode ser…) financeira mas antes moral ou espiritual, pois nem todas as carências de um Irmão são pecuniárias ou materiais. Muitas vezes apenas alguém necessita de uma palavra de inspiração, uma “palmada nas costas” ou um simples gesto de afeto e carinho. Tais gestos com certeza não podem ser depositados num saco, devem-no antes ser entregues (pessoalmente) ao Irmão necessitado. É amparando o seu irmão, que o Maçom lhe demonstra a sua solidariedade e vive o espírito de fraternidade que a Maçonaria lhe oferece.

Tal como afirmei anteriormente, a Maçonaria não é uma INSS*. Antes é uma Instituição que promove a Solidariedade, a Beneficência, a Fraternidade. E como tal, a sua principal missão é ser solidária com os seus membros/Irmãos. Sendo assim, não deve uma Loja virar as costas a um Irmão que esteja em apuros, devendo antes, correr em seu auxílio e o amparar na resolução dos seus problemas. E é para isso que fundamentalmente existe o Tronco da Viúva.

A única obrigação que ele tem, é a de ser bem utilizado!


Fonte: Brasilmacom.

janeiro 10, 2024

COLLEGIA FABRORUM E AS GUILDAS - Alfério Di Giaimo Neto



O Collegia Fabrorum era uma Associação romana na época (iniciada em 500a.C.) das grandes conquistas de cidades pelos romanos, até o ano aproximadamente 400 d.C. Os guerreiros destruíam as construções de todos os tipos, na subjugação dos povos e devido a selvageria das batalhas, e esse grupo de construtores, talhadores de pedras, artistas, carpinteiros, etc, iam atrás reconstruindo o que era de interesse para as tropas e aos comandantes de Roma.

Tinha um caráter religioso, politeísta, adorando e oferecendo seus trabalhos, aos seus deuses protetores e benfeitores. 

É possível que, com a aceitação do Cristianismo pelos romanos, essa associação tenha se tornado monoteísta (Cartilha do Aprendiz – José Castellani – Ed. A Trolha)

As Guildas eram Associações corporativistas, auto protetivas, que apareceram, na Idade Média, depois de 800 d.C. 

Eram grupos de operários, negociantes e outras classes. Existiram, com o passar do tempo, diversos tipos de “Guildas”: religiosas, de ofício, etc, entre outras. 

No caso das de oficio, se auto protegiam, e protegiam seus membros e, muito importante, protegiam seus conhecimentos técnicos, adquiridos pelos membros mais velhos e experientes, e os transmitiam, oralmente, em segredo, em locais afastados e adequados, longe de pessoas estranhas ao grupo formado. 

Como eram grandes, precisavam de sinais de reconhecimento, palavras de passe, etc. E, obviamente, de pessoas que coordenassem, que vigiassem tudo isso. 

Também é obvio, que para que a Guilda tivesse continuidade, precisavam de jovens, que seriam por um determinado tempo, aprendizes desses conhecimentos. 

Na festa de confraternização, comiam juntos, dividiam o mesmo pão entre eles ( do latim “cum panis”, gerando, talvez, a palavra “Companheiro”). Etc, etc, etc. 

O leitor Maçom , já entendeu aonde eu quero chegar.

A que mais se destacou e evolui grandemente, foi a Guilda dos Construtores em alvenaria, principalmente de igrejas e palácios. Como a Igreja Católica Apostólica Romana, na época, dominava tudo, e os padres, por dever de ofício, eram os únicos letrados, nada mais natural que os mestres (de maneira bem ampla) fossem eles. 

Como sacerdotes, eram venerados, e porque ensinavam, eram mestres. Há uma teoria, e é a minha também, que “Venerável Mestre” derivou disso aí explicado: Venerável por ser sacerdote e Mestre porque ensinava!

Posteriormente, essas confrarias perderam essa predominância da Igreja, apesar de não deixarem de serem altamente religiosas, e geraram os Ofícios Francos (ou Franco maçonaria) formados por artesões com privilégios ofertados pelo Feudo e pelo Clero.


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FALANDO E CONVENCENDO - UM MANUAL DE ORATÓRIA E PERSUASÃO

 


Queridos irmãos. Saiu a nova edição deste livro, que ensina as melhores técnicas de redação e apresentação de trabalhos e palestras. Vai incrementar muito a qualidade de seus trabalhos e de sua comunicação.

 Entre os muitos temas tratados estão:

1 - O que é comunicação

2 - O processo de comunicação e comunicação não verbal

3 - Preparando o discurso

4 - O discurso

5 - E quando dá "branco"

6 - Respondendo a perguntas

7 - O suporte audiovisual

8 - Dicas para escrever o roteiro

9 - Retórica, argumentação e persuasão

10 -Planilha de verificação para palestrantes

11 - Textos para praticar

12 - Exercícios de declamação

13 - A saúde de sua voz

14 - Exercícios para a voz


O valor do livro é de apenas 50,00 + postagem
e enviarei dedicado. 
Michael - whatsapp 61.9.8199.5133

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AFIANDO ESPADAS (A ORATÓRIA DOS MAÇONS) - Charles Evaldo Boller


Pela semelhança de formato, afiada em dois lados, a espada é fisicamente semelhante à língua. Os dois gumes da espada formam dois triângulos unidos pela base, assim como o corte transversal da língua. Expande-se o raciocínio para o pensamento afiado em dois lados, para o bem e para o mal. Assim como o afiar da espada, o que é da língua sem o aguçar da racionalidade que a dirige? Uma espada mal utilizada, mal dirigida pelo cérebro e pelos músculos, ao invés de defender dos inimigos, permite que o seu portador venha a ser morto no campo de batalha ou da honra. Os exercícios de esgrima do Maçom permanecem na mente, na articulação de novos e inusitados pensamentos e que se expressam formalmente pela ação da língua, uma espada de dois gumes afiada na oratória. Na Maçonaria isto obtém-se com debates de temas diversificados e interessantes. Afiam-se a língua, o pensamento, à semelhança de uma espada de dois gumes, para derrubar os pensamentos de déspotas e fanáticos.

Porque afiar o pensamento em dois sentidos? A dualidade é exercitada mais pela filosofia oriental, que vê em cada boa ação a semente para o mal e em cada ação má a semente para o bem. Algo difícil de entender na racionalidade ocidental. Na Maçonaria vemos claramente a manifestação do número dois, da dúvida, do balançar entre duas verdades. Afiar o pensamento para o mal tem por objetivo aprender a discernir o mal e não a praticá-lo. É treinar como se afastar do mal. A esgrima entre o bem e o mal é obtida pela constante prática, em Loja, do exercício de animados debates. A arte real é servida na Maçonaria como VITRIOL já na câmara de reflexões – mesmo que a presença da câmara de reflexões não seja utilizada em todos os ritos e obediências -, ocasião em que o Maçom é provocado, a partir de então, a permanentemente aparar as rugosidades da pedra bruta. É a visita ao interior de si mesmo, o interior da pedra filosofal de Zoroastro. É o constante exercício do pensamento, reduto e único lugar no Universo onde cada ser vivo é absolutamente livre. O próprio Grande Arquiteto do Universo nos proveu com uma capacidade que nem ele controla, nem deseja controlar. Se Ele controlasse o pensamento da criatura, Ele estaria corrompendo a perfeição da sua criação. É disto que se deduz ser no pensamento o local onde a criatura é absolutamente livre. Nem mesmo o Criador nela influi. Qualquer modificação só ocorre com o exercício da vontade da criatura. “Conhece-te a ti mesmo”, dizia Sócrates – este conhecer é o “Visita Interiorem Terrae Rectificandoque Invenies Occultum Lapidem”. Esta é a razão sublime de afiar o pensamento no ambiente onde apenas a própria criatura tem poder de modificar a si mesma em resultado da ação do livre-arbítrio, ação que ocorre dentro da pedra, dentro de si mesmo, por vontade própria.

A estrela de seis pontas definida pela circulação ritualística das bolsas implica destacar a capacidade de iluminar, fonte de luz. Só ilumina aquele que emite luz. Os dois triângulos entrelaçados e formando uma estrela de seis pontas, que representa a caminhada do Maçom naquela dança ritualística, aponta para o desenvolvimento da capacidade de raciocinar, afiar o pensamento para emitir a luz do conhecimento e derramar o seu efeito salutar sobre si mesmo, as outras criaturas e meio ambiente. Estrela é indicador de capacidade espiritual associada à capacidade racional. O homem só é equilibrado quando destina forças equitativas às suas capacidades racional, emocional e espiritual. É a estrela de Salomão, de seis pontas, que representa a sabedoria, por isso o trono de Salomão ser simbolicamente a fonte de onde irradia sabedoria, conhecimento, luz. Os dois triângulos invertidos, da circulação das bolsas, podem ser interpretados como se matéria e energia se misturassem na caminhada ritualística. E se luz é conhecimento, sabedoria, estas capacidades no homem são desenvolvidas em debates, na comunicação verbal. Observe-se a dualidade que os dois triângulos transmitem: o triângulo de ponta para cima representa o bem, o positivo; o outro, o seu inverso, com ponta para baixo, representa o mal. Representam também outras dualidades. Por ora, os triângulos assim dispostos, representam simbolicamente uma estrela, e esta, por sua vez, representa luz; a luz que cada Maçom foi pedir na entrada do templo.

O Maçom autoconstrói-se durante os debates em Loja. Sozinho é difícil. Apenas monges que praticam meditação obtém luz sem convivência e comunicação. Quantos maçons, envolvidos na busca diária do pão de cada dia, têm tempo, ou hábito de se concentrarem em recolhimento ou se submeterem ao costumeiro exame interior? Presas do sistema em que vivem quais autómatos, perambulam pelo mundo sem se darem conta que existem. Planeia-se o futuro longe do presente, a única realidade que realmente interessa. Estão ocupados nas suas lides nas fábricas e escritórios e comportam-se quais robôs manipuladores e sujeitos a poucos momentos de felicidade, enquanto a sua essência se mantém na mediocridade. Em Loja, onde são criadas as condições ideais, o Maçom se constrói pela constante provocação que a convivência lhe propicia. Nestas oportunidades, quando um irmão provoca os outros com novos pensamentos, todos afiam as suas espadas pela ação da comunicação. Despertam potenciais nunca antes percebidos pelo indivíduo. Isto não tem nada de mágico ou varinha de condão! É resultado de formação e condicionamento de milhões de anos de evolução natural.

Tirando o mágico de lado, a luz é um dos mais profundos segredos do esoterismo, só obtido quando se aprende a emitir luz, quando a pessoa se transforma numa estrela de luz em função da sua sabedoria. O Maçom é um construtor social que emite luz quando deixa fluir a intensidade da força do seu intelecto conduzindo a espada com maestria. Luz é conhecimento, o mesmo que espírito, ordenação do caos. O que parece caos ao não iniciado é apenas o resultado da incapacidade de visualizar a Luz do Criador do Universo na sua plenitude. Alguns percebem esta irradiação e alcançam o significado da luz que vem do Criador dos Mundos. Mas sem conhecimento enxerga-se apenas desorganização e confusão. Sem mistificação, o homem sábio que examina a sua natureza em profundidade, que afia constantemente a sua espada, sabe que possui a mesma natureza da Luz. Sabe que lá no mais recôndito do seu ser, ele nada mais é que energia, uns amontoados ordenados de campos magnéticos, eléctricos e gravitacionais, materializados pela velocidade com que tais fenómenos acontecem. A ilusão que confunde a percepção com a solidez da matéria demonstra que cada um é, em essência, da mesma natureza da luz. A matéria é energia, fenómeno oscilatório. Com esta visão, consciente da sua não existência, o Maçom que possui uma espada bem afiada aproveita da energia ao seu redor quando vive o presente e se dá conta daqui e agora. Entende que o receber da Luz não inicia e termina na iniciação. Ao afiar a sua espada o Maçom nada mais faz além do dever de adquirir o conhecimento transfigurador; a mudança radical do carácter, transformação espiritual que exalta e glorifica o Grande Arquiteto do Universo.


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janeiro 09, 2024

O DIA DO FICO: 09/01/1822 - Almir Sant’Anna Cruz















As Cortes Gerais, Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa, em seu claro intuito de reduzir a importância do Brasil no Reino Unido, acabaram dando um verdadeiro “tiro no pé” ao exigirem que D. Pedro retornasse para Portugal, como já o fizeram com D. João VI.

O Dia do Fico, foi o dia em que poderíamos chamar da união da “fome com a vontade de comer”. 

Por um lado, D. Pedro sentia-se incomodado com o fato de que sua regência, na verdade, estava limitada à província do Rio de Janeiro, capital do Reino do Brasil, pois as demais províncias continuavam sob as ordens de Portugal. Por outro lado os brasileiros desejavam que o Príncipe Regente, de fato, governasse todas as províncias, mantendo uma união política que favorecesse a independência do Reino do Brasil do Reino de Portugal. Então os Maçons trabalharam intensamente para que o Príncipe Regente descumprisse as ordens das Cortes e permanecesse no Brasil.

Em 9 de janeiro de 1822, que entrou para a História como o Dia do Fico, o Presidente do Senado da Câmara do Rio de Janeiro, o Maçom José Clemente Pereira, entregou ao Príncipe Regente uma relação com cerca de 8 mil assinaturas pedindo-lhe que ficasse e fez o seguinte discurso, enérgico e de certa forma ameaçador:

(...)Vamos tentar agora imaginar o que se passou na cabeça do Príncipe Regente ao receber um abaixo assinado com 8 mil assinaturas e ouvir do Presidente da  Câmara do Senado do Rio de Janeiro esse discurso.

Provavelmente deve ter se desconcentrado em alguns trechos do longo discurso, lembrando que em Portugal passara apenas seus 9 primeiros anos de tenra infância; que por lá o ridicularizavam chamando-o de “rapazinho” e “brasileirinho”; que por aqui sua regência estava limitada à província do Rio de Janeiro, pois as demais estavam submetidas às Cortes portuguesas; que o Reverbero Constitucional Fluminense insistia na independência do Brasil; que o Desembargador Intendente Geral de Polícia já o informara sobre o fato das forças policiais não terem como combater os conspiradores Maçons sob a liderança de Gonçalves Ledo; e, sobretudo, o conselho de seu pai antes de embarcar para Portugal.

O resultado foi sua célebre decisão de descumprir as ordens que recebera, pronunciando sua histórica resposta aos anseios dos brasileiros: Como é para o bem de todos, e felicidade geral da Nação, estou pronto: diga ao povo que fico. Agora só tenho a recomendar-vos união e tranquilidade.

Com este gesto de desobediência às Cortes Gerais, Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa, a separação do Brasil de Portugal estava informalmente realizada.

A decisão de D. Pedro evidentemente contrariou os grupos que apoiavam a política portuguesa, sobretudo os comerciantes portugueses que tinham seus negócios no Rio de Janeiro.

A reação à decisão de D. Pedro foi quase que imediata: três dias depois, em 12 de janeiro, cerca de 2 mil homens das tropas portuguesas, sob o comando do Governador das Armas da Corte e Província do Rio de Janeiro, tenente-general Jorge de Avilez Zuzarte de Souza Tavares, acantonados de prontidão e em atitude hostil em frente ao Palácio Real, amotinaram-se e concentraram-se no morro do Castelo, tendo sido cercados por 10 mil brasileiros armados, sob o comando do Maçom Marechal Joaquim de Oliveira Álvares (que se tornou, mais tarde, o primeiro Grão Mestre Adjunto do Grande Oriente do Brasil).

Com suas tropas isoladas e cercadas, o comandante português demite-se e, com receio de um ataque das tropas brasileiras, recuou para o outro lado da baía de Guanabara, para a região da Praia Grande em Niterói, onde se fortificou e de onde finalmente foi expulso com suas tropas do Brasil. A divisão portuguesa embarcou em fevereiro rumo a Lisboa.

Excertos do livro *A História que a História não conta: A Maçonaria na Independência do Brasil*Interessados no livro contatar o autor, Irm.’. Almir, no WhatsApp (21) 99568-1350

O SIMBOLISMO DA CADEIA DE UNIÃO - Luis Conceição G∴ O∴L∴ - Lisboa - Portugal


Há, em Magia, palavras de pronunciação perigosa; há também ritos maçónicos aos quais será melhor não nos associarmos quando não temos plena consciência do seu poder oculto. O tema da "Cadeia de União" é um desses que, apesar da sua aparente simplicidade, encarna uma das figuras mais complexas do Ritual, no sentido em que implica "entrelaçamentos secretos" que ultrapassam largamente a simples ideia de União no sentido simbólico. Do mesmo modo que, no plano físico, ao pretender estudar a qualidade de uma corrente metálica, o engenheiro terá que se preocupar com o número dos seus anéis, o seu encadeamento, o metal que os compõe, a sua secção e curvatura, para se entrar no sentido profundo da nossa "Cadeia de União", é necessária uma apropriação dos seus componentes, para os integrar numa síntese simbólica irrefutável.

Os principais elementos de que nos ocuparemos serão, assim:

· O círculo que forma a Cadeia, obrigatoriamente fechado.

· A polaridade, posta em evidência pelo cruzamento dos braços.

· O terceiro seria a mão, de que não me ocuparei aqui, e que detém um papel ativo na formação DA Cadeia.

Mas antes de mais convém rememorar o facto de que o rito DA "Cadeia de União" é a dinamização, a tomada de ação do princípio sugerido pela corda que serpenteia nos 3 lados da Loja, ligando a coluna J à coluna B, sem contudo as unir. Torna-se, assim, indispensável compreender, à partida, a mensagem muda dessa corda de nós abertos, nas suas relações com o conceito arcaico de "laço", de serpente protetora, do nó cerrado que se torna lasso e enfim das suas borlas terminais: teremos assim sondado em profundidade o valor e a força de um "rito constrangedor, que envolve o indivíduo e a coletividade".

Desta forma, se a simbólica da corda se assemelha ao da serpente que, fechada sobre si própria, com a cauda na boca, transmite a Luz e encarna o Sol; de corpo esticado e cabeça pendente, toma o papel do ceptro mágico egípcio, arquétipo da iniciação libertadora - patente na simbólica da serpente do Eden. Os nós lassos indicam um sentido evolutivo: a divindade ligante é vencida pelo Conhecimento; a coação dogmática não consegue já fechar a sua rede.

Mas o iniciado, promovido ao posto de herói, se for bom entendedor da Arte, aceitará e submeter-se-à voluntariamente às regras tradicionais da Ordem a que, de livre vontade, pediu adesão. Ele possui a liberdade do Maçom livre, numa Loja livre, mas conhece o relativismo da Liberdade. Sentirá honra em fazer respeitar os princípios adoptados pela maioria, e também em os fazer cumprir, junto dos seus pares. O laço do Amor é a imagem da Solidariedade.

Esta imagem é espantosamente explicitada pelo nó Isíaco, análogo à "lemniscata" do primeiro arcano do Tarot, signo expressivo do movimento contínuo, dos "circulus vitae", da interação constante das radiações, do movimento perpétuo, tanto da matéria como das galáxias. A Matemática adotou-o como signo do infinito. Na boa tradição do Rito Escocês, simbolizando em parte a separação do neófito relativamente à sua Mãe, em cujo útero se encontrou, previamente, em reflexão, e de onde saiu com uma corda ao pescoço - vestígios do seu cordão umbilical agora quebrado - o neófito é colocado no centro da Cadeia de União, que forma um círculo à sua Volta - verdadeira Cadeia de defesa - porque de cada vez que, na magia e nas artes, se encontra uma corda em torno de qualquer coisa, há uma intenção de defesa da coisa circunscrita e de a separar de todas as influencias exteriores (e não deriva a palavra Templo do verbo grego "separar").

É a razão pela qual o rito da "Cadeia de União" consiste na formação de um anel completo, enquanto que a sua homóloga - a corda denteada que contorna parcialmente o Templo - não constitui um círculo fechado, quedando-se, de um lado, na coluna B, e do outro, na coluna J.

De facto, as colunas não precisam de estar ligadas por uma corda para fechar o círculo. O círculo é o Universo, o Infinito, como a Loja se estende a todas as direções, do Nascente ao Poente, do Norte ao Sul, do Zénite ao Nadir. No seu trabalho sobre o Deus ligante e a simbólica dos nós, Mircea Eliade diz-nos que "o cosmos é em si mesmo concebido como um tecido, como uma enorme rede". É também significante a utilização de nós, cordéis e anéis nos rituais nupciais.

De entre OS símbolos mais expressivos que se nos oferecem à meditação, figura o "Ouroboros", a serpente que, ao morder a cauda, forma um círculo.

Ora a serpente leva-nos imediatamente a pensar na da Génese, Shaton, que tentou Eva, sugerindo-lhe que comesse o fruto proibido. O primeiro casal vivia no Jardim do Éden, alimentando-se de frutos que cresciam espontaneamente. Neste casal não havia desejo. Foi portanto a serpente que o despertou, e com ele o Amor. A serpente foi o primeiro Iniciador e não o vil tentador astuto e desonesto que a exegese religiosa nos apresenta, maldito pelo Criador.

Deveria assim ser glorificada pela Humanidade. A tentação de Eva não se deve à sua maior fragilidade, mas sobretudo à sua grande sensibilidade e receptividade, à sua imaginação intuitiva. Adão, cujo nome significa "terra ou barro vermelho", era um sujeito mais racional, mais "pesado", mais tímido, talvez. É porque a nossa "mãe" - Eva - escutou a serpente, que a Humanidade entrou na via do Conhecimento, encetou o seu processo de emancipação, de evolução. Nos templos gregos via-se frequentemente a figuração do Ouroboros. Simbolizava a vida em geral, no que ela tem de indestrutível e de eterno, pelo seu eterno recomeço. Nas procissões dos Mistérios de Eleusis, as cesteiras ligavam romãs (símbolo da solidariedade e da fraternidade), espigas de trigo (mito gregário da regeneração) e uma serpente, imagem da vida regenerada. (sobre o mito da serpente, aconselha-se a leitura do conto esotérico "A Serpente Verde", do nosso Ir∴ Goethe).

No Templo, como referido, a corda denteada contorna apenas em três lados o painel de Loja. Esta deve, de facto, manter-se em contacto com o mundo exterior: não se abrem 3 janelas da câmara de Comp∴ - Mas no quarto lado, o do Ocidente, nenhum ser, nenhum espírito se pode introduzir, porque a energia contida entre as duas colunas de polaridade contrária forma uma barreira intransponível para os não iniciados. Estes encontrariam aí, de qualquer modo, sob os seus passos, o pavimento mosaico, em que inadvertidamente tropeçariam. Na "Cadeia de União" é um magnetismo dinâmico que se vai desenvolver, pelo facto de se constituir de seres vivos. Nas sessões brancas (adopção, reconhecimento conjugal, etc.), a cadeia forma-se segundo uma roda infantil, de mãos dadas, em que toda a ideia metafísica e esotérica é excluída: trata-se apenas de um testemunho de amizade e de união. Mas na cadeia ritual, em que os braços cruzados ligam a mão direita com a mão esquerda, desenvolve-se uma força magnética. Em 1932 (e∴. v∴), Jacqueline Chantereine e o Dr. Camille Savoire, detectaram no interior e em torno do organismo humano, movimentos turbilhónicos e ondulatórios. Estes últimos são produzidos, para além de causas patológicas, por energias radiantes provenientes de tudo o que nos envolve: ação cósmica, por um lado, essencialmente proveniente da energia solar, à qual se junta a da Lua e dos restantes astros. A resultante destas ações energéticas traduz-se sob a forma de um turbilhão que penetra pelo lobo anterior da hipófise, para terminar no dedo grande do pé direito.

Uma outra fonte, não menos importante, é a força energética, dita "telúrica", que se manifesta sob a forma de uma corrente inversa da precedente, e portanto ascendente, penetrando pelo dedo pequeno do pé esquerdo, para se escapar pelo topo do crânio, contornando a precedente para formar uma figura semelhante ao "Caduceu" (o Caduceu é uma vara de louro de oliveira, com duas serpentes enroladas em sentido inverso, que era atributo de Mercúrio, e símbolo da polaridade e da paz). Estas duas serpentes entrelaçadas, transformam-se nos "laços de Amor" da corda denteada. Daqui a analogia com a Cadeia de União, em que o braço direito, positivo, passa por cima do esquerdo, negativo, para contactar com a mão esquerda do vizinho, formando uma cadeia de "pilhas em tensão", em que se reúne o eléctrodo positivo de cada um dos elementos ao eléctrodo negativo do seguinte, por forma a que a força electro motriz resultante seja "n" vezes superior à de um só elemento. Isto não é uma imagem, é uma realidade, que desenvolverá ao máximo a agregação das forças psíquicas da Loja, dirigidas para um mesmo objetivo.

Individualmente somos fracos, isolados e falíveis. Quando o Ven∴M∴, antes do encerramento dos trabalhos, evoca a união de todos os Maçons, quando as nossas mãos (nuas, sem luvas, para que a corrente circule) se juntam numa verdadeira Cadeia de União, parece que um sopro mágico se introduz no Templo. Logo que a Cadeia se forma, o movimento ascendente e descendente dos braços, três vezes repetido, lembra simbolicamente o ondular da serpente cósmica, de que a Cadeia é uma imagem energética. A quebra da Cadeia deverá ser lenta e suave, para que a força de cada um se estabilize no seu circuito fechado. A Cadeia de União é, assim, a simbólica solar posta em ação, na sua expressão mítica. Precedida por uma pequena invocação, proferida pelo Ven∴M∴, no sentido das preocupações e aspirações gerais e particulares da Loja, da Obediência e da Humanidade, a Cadeia de União é o corolário obrigatório das sessões de trabalho em Loja.