Um dos pontos de maior curiosidade dos maçons modernos é quanto ao fato de terem que realizar passos e posturas estranhas para entrar na Loja Maçónica. De onde vem essa tradição e costume?
Para começarmos a explorar este tema intrigante, passamos a palavra para Albert. G. Mackey, o mesmo autor dos Landmarks, que na sua Enciclopédia de Maçonaria nos brinda assim: “A Marcha dificilmente pode ser considerada um modo de reconhecimento, embora Apuleo nos informe que havia uma marcha peculiar na iniciação dos mistérios Osíricos que foram considerados como um sinal. Na Maçonaria tornou-se de uso esotérico no ritual. Os passos podem ser rastreados até pelo menos nos meados do século XVIII, em cujos rituais são totalmente descritos. O costume de avançar de maneira e forma peculiar em direção a algum lugar sagrado ou mesmo a um personagem superior foi preservado nos costumes de todos os povos e países, especialmente entre os orientais, que recorrem até mesmo às prostrações do corpo ao se aproximar do trono de um soberano ou a uma parte sagrada de um local religioso.
Os passos na Maçonaria simbolizam o respeito e a veneração pelo Altar, de onde emana a Luz Maçónica. Em tempos antigos, e nos altos graus, um esquife ou caixão era colocado na frente do Altar, como um símbolo bem conhecido, e para passar por ele e alcançar o Altar, diversas posições do pés eram necessárias serem feitas e que constituíram o modo de avançar. Era uma forma de RESPEITO prestado à memória daquele ali representado, assim como ao Altar. Lenning fala-nos dos passos, que os maçons alemães chamam de die Schritte der Aufzunehmen-alden, os passos dos dignatários , e os Franceses, les pas Mysterieux (os passos Misteriosos) – e que cada grau tem um número de passos diferente, e são realizados de maneira diferente, e possuem um significado alegórico. Gadicke diz: “os três grandes passos conduzem simbolicamente deste vida à fonte de todo o conhecimento”.
Deve ser evidente para todo Mestre Maçom, sem maiores explicações, que os três passos misteriosos são dados do lugar da escuridão para o lugar da Luz, seja figurativamente ou realmente por sobre o esquife, o símbolo da morte, para ensinar simbolicamente que a passagem da escuridão e da ignorância desta vida é através da morte para a Luz e conhecimento da vida eterna. E este, deste os primeiros tempos, foi o verdadeiro simbolismo dos passos. “
Vemos que se formos percorrer tradições e costumes de diversos povos e os seus costumes sejam religiosos ou mesmo sociais, encontraremos posturas e passos de avanço que estão diretamente relacionados a algum tipo de REVERÊNCIA e RESPEITO ao objetivo ou local que se está adentrando por exemplo. Temos registro disso nas posturas respeitosas à frente de autoridades diversas, como reis e rainhas, juízes, religiosas, imagens de santos e assim por diante.
Daí já podemos deduzir que as marchas dos graus, se constituem num processo de avanço ou aproximação de um indivíduo a um local considerado sagrado e que requer respeito. E Mackey indica-nos como sendo este local de respeito no caso da Loja Maçónica, um Altar, e sabemos que tal Altar existe em todas as Lojas Maçónicas como sendo o lugar sagrado onde são colocadas os símbolos da Três Grandes Luzes, o Livro da Lei, o Esquadro e o Compasso, o Altar dos Juramentos ou dos Compromissos, e onde todo aquele que é recebido Maçom se ajoelha para realizar os seus juramentos. Este sem dúvida se constitui o local mais sagrado da Loja, e é em direção a ele que são realizados os passos ou as marchas dos graus.
Tal procedimento contêm o seu significado esotérico e simbólico devido ao facto de se iniciar o caminhar desde a região do Ocidente, a região da escuridão, da ignorância, em direção ao Oriente, ao Altar das Luzes da Maçonaria, em direção ao conhecimento e à esperança de uma vida eterna, como nos aludem as escrituras do Livro da Lei.
Frau Abrines no seu Diccionario Enciclopedico de la Masoneria, reporta-nos que a marcha ou os passos misteriosos são considerados como SINAIS PEDESTRES da Maçonaria. Conhecemos diversos outros tipos de sinais citados na literatura maçónica como guturais, peitoral, penais, de ordem, de aprovação, de abstenção, de agradecimento, de socorro entre outros.
É muito curioso notarmos que no Ritual do Simbolismo do Aprendiz Maçom do Rito Escocês Antigo e Aceito da GLESP (Grande Loja Maçónica do Estado de São Paulo) encontramos um verbete sobre a Marcha do Aprendiz que é iniciada a partir da porta do templo pelo eixo central imaginário da loja com passos completos e sucessivos.
A interpretação simbólica ai apresentada faz referência aos Signos do Zodíaco, em especial aos três primeiros signos a saber: Áries, Touro e Gémeos. Interessante notar que tal verbete nos induz a considerar que a caminhada do Maçom pelos graus possa estar relacionada aos Signos Zodiacais e suas influências astrológicas, pois ainda cita que tais signos sofrem a influência de três planetas do mundo sideral a saber: Marte, Vénus e Mercúrio, o que denota uma interpretação eminentemente astrológica.
Nessa linha de interpretação o Primeiro Passo da marcha está relacionado aos princípios astrológicos de Marte ou seja da LUTA, do ARDOR e da CORAGEM, como planeta regente do signo de Áries. Marte como sendo um deus mitológico da guerra como nos diz o ritual.
Já o Segundo Passo da marcha está relacionado ao signo de Touro e seu regente Vénus, símbolo da FORÇA, do TRABALHO, e da PERSEVERANÇA, uma vez que Vénus é uma deusa mitológica do amor e da fertilidade.
O Terceiro Passo da marcha já tem a influência zodiacal de Mercúrio, regente de Gémeos, símbolo da UNIÃO, da FRATERNIDADE.
Assim chega o Aprendiz vitorioso pois com esses passos ficou mais distante das regiões das trevas, da ignorância e das iniquidades da sociedade profana. Interessante ainda notar que antes de se colocar à porta do Templo, passou por uma Sala que também faz referência a Passos: a SALA DOS PASSOS PERDIDOS. Sim nesse local que antecede à porta do Templo, onde o Maçom deverá entrar com os seus passos misteriosos e como se conhece À ORDEM, esteve numa sala onde os passos estão perdidos, são passos no caos do mundo profano, sem um ordenamento ou harmonia e direcionamento racional e moral. A Sala dos Passos Perdidos portanto representa o mundo profano com as suas iniquidades e desarmonias que tanto conhecemos.
A entrada no recinto do Templo Maçónico feito com os passos misteriosos ou a marcha maçónica demonstra não somente o respeito ao local, mas também que se está adentrando a um local sagrado e que possui uma ordem de harmonia, como nos dizia Pitágoras, contém a Harmonia das Esferas, sim, pois como notamos o templo maçónico representa um micro universo.
Entendendo que assim como a sequência dos graus simbólicos se processam geram as analogias simbólico-numéricas que os acompanham, e portanto a marcha do Maçom segue adiante a partir da marcha do Aprendiz para Companheiro e posteriormente para Mestre.
A chave para tal processo simbólico-numérico é-nos apresentada na Escada em Caracol onde vemos a representação de três etapas de degraus, a primeira com três degraus, a segunda com cinco degraus e a terceira com sete degraus. E assim de forma análoga a marcha do aprendiz possui três passos, enquanto do companheiro cinco passos e do mestre sete passos finalizando com o oitavo final diante do Altar, respeitando-se a sequência simbólico-numérica dos graus representada magistralmente por essa escada.
Se existem nomes ou atributos relacionados a cada um dos passos do aprendiz, será que não podemos arriscar atribuir atributos simbólicos aos demais passos que completam a Marcha Misteriosa dos Maçons?
Finalizando este artigo damos uma interpretação particular e baseada em narrativas de Mestres Maçons eruditos como o nosso Irmão Feitosa, para todos os passos da marcha, como uma oração ou invocação interior no momento da realização da marcha a saber:
“Estando à Ordem na direção do Altar do Altíssimo, início a minha caminhada com Coragem, Perseverança e Afinco, para que as minhas palavras tenham sabedoria, força e beleza. Em seguida desvio o meu caminho na Busca do Conhecimento Superior, e retorno ao caminho agora mais iluminado e com a minha alma elevada e esclarecida, pois Vi a Estrela Flamejante, e assim preparado, sigo assim exaltado pois “Passei pela Vida”, em seguida “Venci a Morte”, e finalmente “Cheguei aos Céus” diante do Altar “Oh, Senhor meu Deus”.
Pesquisa por Alberto Feliciano
https://www.freemason.pt/a-marcha-misteriosa-do-macom-e-seus-misterios/